"O ego é a coisa mais lixada neste meio. Se não o esvaziamos, trama a vida de muita gente". Se chegar ao fim desta entrevista, encontrará esta frase. É a súmula da aprendizagem de Cláudio Ramos, há duas décadas a entrar em casa dos portugueses através do pequeno ecrã.

Aos 47 anos, o apresentador confessa-se satisfeito com as várias mudanças que, no último ano e meio, aconteceram na sua vida. A saída da SIC para a TVI, em fevereiro de 2020, a concretização do sonho de apresentar um reality show e outro, maior ainda, tomar a dianteira de um programa de daytime.

Sete meses volvidos após a estreia de "Dois às 10", Cláudio Ramos fala sobre a parceria com Maria Botelho Moniz, elogia a concorrência da SIC e da RTP1 e responde à pergunta de um milhão de euros.

Qual é o balanço destes sete meses de “Dois às 10” ?
Bom, positivo. É a primeira vez que estou à frente de um programa, assim, no todo. Além de o apresentar, envolvo-me muito no que se faz. Isso era uma coisa que eu queria fazer há muito tempo. Eu já fazia um bocadinho disto quando estive na Júlia [“Queridas Manhãs”, SIC] e agora tenho a oportunidade de o fazer quase num todo, com a coordenação. Isso agrada-me bastante. 

Maria Botelho Moniz e Cláudio Ramos no
Maria Botelho Moniz e Cláudio Ramos no Maria Botelho Moniz e Cláudio Ramos no "Dois às 10" créditos: Instagram

Estando a Maria de forma igualmente envolvida, foi fácil casarem a ideia e as expectativas que tinham para o programa?
Acho que sim. Nós já nos conhecíamos e somos amigos de casa. Eu já sabia que a Maria queria fazer daytime há muito tempo, e eu também. E falávamos. Nunca imaginámos que o fôssemos fazer juntos, ou pelo menos assim tão depressa. Nestes últimos dois anos, em que eu estava na Cristina ["O Programa da Cristina"] e ela estava no  "Passadeira Vermelha" comigo, falávamos que podia acontecer, um dia, ela fazer daytime. Mas era uma coisa que, pela idade, demoraria um pouco mais. Eu chegaria primeiro e ela depois.

Quando nos é apresentada a proposta depois nós, com a coordenadora, desenhámos todo o conteúdo. A Maria dá as ideias dela, eu dou as minhas. Há umas dela que eu gosto, há outras minhas que ela não gosta e andamos ali. Ela tem menos 10 anos do que eu, tem um olhar muito mais fresco e acho que se nota muito, o que é bom. Como tenho mais 10 anos de daytime, tenho as coisas formatadas de outra maneira. Ela vem, mostra-me de outra maneira e chegamos ali a um consenso com a nossa coordenadora. E foi fácil o casamento, não só por isso. Temos gostos e ideias diferentes mas sabemos que queremos muito aquilo daquela maneira. Sendo o foco o mesmo, mesmo que um ou outro tenha que ceder, o resultado é muito fixe.

De que forma é que tem crescido com a Maria e ela consigo?
Eu gosto muito de duplas. Conhecemos muitos apresentadores cujo sonho é estarem sozinhos e não se adaptam a duplas. Eu sou ao contrário. Eu prefiro muito mais trabalhar em dupla porque me permite fazer uma coisa que eu adoro: improvisar.

"Eu tenho mais química hoje com a Maria do que tinha há um ano e estou convencido que, de hoje a um ano, terei mais"

A Maria, no método de trabalho, é o oposto de mim. Basta olhar para o iPad dela para perceber. Parece uma menina da escola. Sublinha com cores, faz perguntas com cores, vai hiper mega preparada. Eu, talvez por ter 10 anos de avanço, preparo-me de outra forma. Então é muito bom fazer dupla com a Maria porque ela me dá margem para que eu tenha um Cláudio que eu não quero que desapareça. Eu não quero que este Cláudio espontâneo, divertido, desapareça porque… não vai desaparecer agora nem com 50 anos. Eu acho que é uma mais valia, que eu mostrei muito n’"O Programa da Cristina", exagerado até, mas eu não queria que desaparecesse. Se eu estiver sozinho num programa, é muito difícil contracenar comigo próprio. É ótimo perceber que uma pessoa entende o meu sentido de humor. A Maria tem muito sentido de humor. Às vezes as pessoas não o entendem logo, mas é maravilhoso. É o suporte, é o amparo, ela agarra uma corda e eu agarro outra. 

Cristina Ferreira e Cláudio Ramos
Cristina Ferreira e Cláudio Ramos

A química constrói-se, seja em que dupla for?
Sim, claro. Acho que há químicas que se constroem e há químicas que se constroem de forma imediata. Num programa como o nosso, que representa muito para a estação, onde estás muito exposto no que dizes e no que fazes, a nossa mais valia é que éramos amigos antes. Eu entendo agora a dificuldade do Manel [Luís Goucha] ou da Maria [Cerqueira Gomes] em criarem a química que, depois o Manel veio a assumir, foi difícil de fazer.

Maria Cerqueira Gomes e Manuel Luís Goucha vão continuar a conduzir o programa

Ele estava num programa dele, a Maria chega, por muito boa vontade que tivessem um e outro, já estava um registo construído. E a prova está que cada um tem o seu caminho, dão-se lindamente e agora fizeram o “Em Família” e têm química. No meu caso e da Maria estamos de início no projeto.

Esta semana [li] "Cláudio e Maria não têm química". Ri-me imenso. mandei-lhe logo um áudio a dizer ‘pode faltar-nos tudo mas química não nos falta’. Nós rimo-nos muito, choramos muito, falamos muito do programa. Eu tenho mais química hoje com a Maria do que tinha há um ano e estou convencido que, de hoje a um ano, terei mais. Porque vamos conhecendo coisas um do outro, vamos percebendo os jeitos um do outro, e acho que isso ajuda bastante. Acontece também criar uma química imediata com pessoas que não conhecemos de lado nenhum. Aconteceu-me com a Cristina Ferreira, com a Ana Marques. Na Cristina era uma coisa diferente. Eu ia, entrava, fazia o que tinha a fazer e ia-me embora. Tinha responsabilidade zero sobre o programa, era todo nas costas da Cristina. Aqui estamos os dois divididos, em pé de igualdade. 

"Não sou santo, não nasci agora nem me vou bater a dizer 'ai meu deus, sou um mega crucificado'"

Estava à espera que o escrutínio sobre si, a Maria e sobre o programa fosse numa base diária, das comparações, das audiências, de tudo o resto?
Não, não estava. O que falo muitas vezes com o meu terapeuta é: vem na fatura, como se costuma dizer. Quando sobes à Primeira Liga — eu subi e sei perfeitamente que o Benfica, o FC Porto e o Sporting têm um escrutínio maior do que têm os outros que estão abaixo. Na televisão funciona da mesma maneira. Quando se sobe à Primeira Liga tem-se mais responsabilidade, tem-se mais regalias mas tem-se, obviamente, mais pessoas a apontarem o dedo e a exigir que façamos bem.

É uma obrigação nossa, temos que fazer bem. Mesmo que façamos bem, dermos tudo, não vamos nunca agradar a toda as pessoas, nomeadamente a quem opina e a quem escreve. Não concordo, às vezes, com algumas coisas que se escrevem porque são retiradas de contexto. Títulos sensacionalistas, que sabemos que têm de existir e isso até dou de barato porque sabemos o mundo onde estamos. Se eu puder vender uma matéria de uma forma não vou vendê-la da forma mais soft. Não estamos a brincar. É comunicação e tem de ser objetiva para as pessoas. Desde que seja verdade. É chato, às vezes? É. Lido bem? Lido. Só há um mês é que comecei a ler as coisas do "Big Brother" que fiz com a Teresa [Big Brother - Duplo Impacto"].

teresa e claudio
teresa e claudio Cláudio Ramos e Teresa Guilherme em dose dupla este fim de semana na TVI créditos: Instagram/TVI

Não leu nada durante o “Big Brother - Duplo Impacto”?
Não. As coisas que li eram do "BB2020". A Beatriz, a minha agente, mandou-me as coisas. Eu leio tudo, guardo tudo. As coisas estão ali numas caixinhas e eu comecei a abri-las para aí há um mês. A esta distância, consigo relativizar imenso. Se eu for reagir hoje a uma coisa que escreveram ontem sobre mim que são mentira, vou reagir de forma "wow". Se ler daqui a um ano…

Mas lê online, que tem muito mais peso.
Tenho alertas no telemóvel mas quando começam a chatear, desativo. Alguns sites já os tenho bloqueados, não me interessam ver. Mas já o fiz no tempo do "BB2020". A Verónica, que trabalha comigo, disse ‘vamos bloquear isto porque não nos ajuda’. Porque, quer se queira, quer não, o online, as redes sociais, tudo isso, se se vive muito, acaba por condicionar. E num formato como o "Big Brother" era um exagero. Às vezes ia já condicionado e eu não queria isso. Se eu começo a perceber que o que vai chegando são coisas feias ou é mais do mesmo, desativo.

Existem coisas injustas mas eu próprio fui muito injusto com muitas pessoas quando fiz o papel contrário. E eu tenho de perceber que as coisas funcionam desta maneira. Não sou santo, não nasci agora nem me vou bater a dizer "ai meu deus, sou um mega crucificado". Mentira. Tenho uma profissão de sonho, tenho um bom ordenado, faço aquilo que eu quero, cheguei aqui. Não é por os jornalistas ou cronistas não concordarem com o que eu faço ou avaliarem de uma forma que eu acho que não é a correta que me vou deixar ir abaixo.

À distância de um ano, consegue ter uma perspetiva do quão importante foi o “BB2020” para a TVI, para o momento que o País atravessava e também para aquela fase da sua carreira?
Consigo e se não conseguisse todos os dias me lembravam. Todos os dias recebo cartas de pessoas… uma senhora de 60 e alguns anos do Linhó dizia que via os diários durante a semana e, ao fim de semana com o neto, e faziam apostas sobre a cor do meu fato. Depois foi ali que a senhora começou a ouvir falar de algumas coisas e que se foram desenvolvendo. Isto, para mim, é altamente gratificante. Eu tenho a noção de duas coisas: eu não sou o Cláudio que era antes de fazer o "BB2020".

Em que aspetos?
Em tudo. Eu fazia sempre daytime, não tinha o peso da responsabilidade de trabalhar para uma massa gigante. Eu não conhecia bem o público da noite, nunca tinha feito. E tens ainda mais responsabilidade porque não és só apresentador. Tens obrigatoriamente de tomar uma posição. Eu nunca quis ser só um papagaio e tive de tomar algumas posições. Neste "Big Brother", que foi o meu primeiro, foi muito desafiante. Pelas condições em que foi feito, pelo casting, que era brutal. Não sei se algum dia se vai repetir. As causas que todos, de forma voluntária e involuntária, levaram para dentro da casa e a discussão que trouxe. Também estávamos todos com a pele muito fina porque estávamos em confinamento e o "BB2020" acabou por ser um escape.

"Percebi que o 'BB2020' foi muito importante e que, como aquele, não sei se existirá outro"

Não que eu não tivesse a noção da responsabilidade do apresentador mas, ali, para um milhão de pessoas, é muito importante dizeres "atenção, não se brinca com o corpo de ninguém porque as pessoas podem ser mais gordas ou mais magras. Não é isso que conta". De manhã, faço isso mas, ao mesmo tempo, faço uma graça sobre outra coisa qualquer. O peso da responsabilidade do apresentador é ali. E ninguém me ensinou isso, eu aprendi em Espanha com um grande apresentador, que é meu amigo, o Jorge Javier [Vázquez], o maior apresentador de realities em Espanha. Tive reuniões com ele, aconselhei-me com ele sobre se aceitaria ou não. Ele foi muito claro: "só vale a pena fazeres este programa se perceberes que vais ser atacado de um lado e de outro. Mas não podes ter medo e tens de ter a tua opinião. Só te vão levar a sério se tu tiveres a tua opinião".

Tive um apoio muito grande da Pipoca [Mais Doce]. Foi muito importante tê-la ali porque a Pipoca, às vezes, trazia para cima da mesa coisas que eu não poderia levar. Eu percebi que o "BB2020" foi muito importante e que, como aquele, não sei se existirá outro. Vem aí outro, não sei como será, não faço a mínima ideia. Mas uma coisa é certa. Aquele marcou, e muito, e percebeu-se que reality não é só aquilo que as pessoas tinham na cabeça. Pode ser também isto. Teve sucesso, funcionou e a estação gostou e eu amei. E correu tudo bem.

"Eu não me senti abandonado pela minha direção. O Nuno Santos não me abandonou, a Cristina Ferreira não me abandonou"

No último ano, a TVI tem diminuído a distância em relação à SIC. Considera que o “BB2020” foi um ponto de viragem nessa aproximação?
Não tenho muito presente os números antes do “BB2020” mas eu falava muito com o Nuno [Santos, à época diretor de programas da TVI], que foi a pessoa que me foi buscar, e lembro-me na altura de falarmos da nossa conquista quando ganhámos o domingo. Quebrámos um ciclo o que, para mim, foi muito importante. A TVI já não ganhava o dia há muito tempo.

Eu nunca achei que ia ser contratado para a TVI e que, de repente, ia ganhar e a estação ia ganhar. Quando o Nuno me convidou, eu disse-lhe: "eu não posso prometer audiências. Eu posso prometer entrega". E ele disse-me "eu posso prometer o formato que eu sei que tu consegues fazer e uma equipa que te vai ajudar". E assim foi. Superou… se não fosse por mais nada, por aquele "Big Brother" já tinha valido a pena.

Falemos da concorrência. Como é que tem visto a dupla da SIC, João Baião e Diana Chaves?
Ver ver, nunca vejo. Quando saí de "O Programa da Cristina" precisei de fazer um período de luto. Saí do programa, nunca mais o vi enquanto a Cristina lá esteve. Sou muito amigo da Diana Chaves, gosto muito do Baião. Eu sou concorrente deles agora mas somos amigos. Eu quero ganhar, claro que sim. Mas eu não quero o mal deles. O que nós estamos a conseguir agora, que o daytime não tinha há muito tempo, é que as linhas dos gráficos [de audiências] se cruzam entre elas.

O daytime é, cada vez mais, uma questão de conteúdos e é também obviamente uma questão de hábito de antena. Enquanto programa, é muito bom abrir o gráfico e perceber que é muito competitivo, apesar de podermos perder. A RTP, que está um bocadinho mais abaixo, não faz um trabalho menos bom. É so uma questão de dinâmica de antena. O Jorge [Gabriel] e a Sónia [Araújo] estão há 20 ali e fazem o trabalho deles. Não são piores nem melhores do que nós. Estamos todos mais ou menos na mesma onda de tentar fazer bem para o espectador. 

Um ano de Casa Feliz - looks Diana Chaves
Um ano de Casa Feliz - looks Diana Chaves Diana Chaves e João Baião créditos: Instagram

Quero falar sobre o período que separa o fim do "BB2020", em agosto, e o anúncio oficial da sua ida, juntamente com Maria Botelho Moniz, para as manhãs, que aconteceu em novembro. Houve uma perceção pública negativa no sentido em que pareceu que tinha sido "abandonado" ou "traído" por Cristina Ferreira. Ficou, de alguma forma, desiludido com a especulação em torno desse tema?
Fiquei desiludido quando, faz agora um ano, apareceu em todas as capas "Cláudio Ramos traído". Existe a nossa vida pública e existe a nossa vida privada. Eu sabia exatamente o que estava a acontecer. Eu tive uma reunião com a Cristina antes de ir de férias com a Leonor, onde ela me disse que eu não ia fazer o "Big Brother - a Revolução". Mas onde ficou claríssimo o que é que eu ia fazer a seguir. Só que eu não podia dizer. E eu não ia trair a confiança dela.

Eu cheguei a mandar uma mensagem à Cristina, no Algarve, a dizer-lhe assim: "queres que eu diga alguma coisa publicamente sobre o que está a acontecer?". Porque não é justo. Numa capa onde surgia a palavra “traição”, a minha filha perguntou-me: "mas isto é verdade?". A Leonor, que tinha 16 anos na altura, já começa a perceber algumas coisas. E eu pensei: "se a minha filha pergunta, o da Cristina também vai perguntar". E não sendo verdade, é importante esclarecer as coisas. Eu não me senti abandonado pela minha direção. O Nuno Santos não me abandonou, a Cristina Ferreira não me abandonou. Chamaram-me ao gabinete, explicaram-me tudo como era e eu, que sou um soldado ao serviço da estação, pensei: "eles sabem o que estão a fazer. Eu sei que as pessoas não sonham que eu vou realizar o meu objetivo, que são as manhãs". Por isso eu estive sempre um pouco calmo.

Foi difícil gerir tudo o que se escrevia. As pessoas também, e às vezes a imprensa, têm memória muito curta. E, às vezes, é injusto.

Cláudio Ramos sobre afastamento do "Big Brother". "Não chorei, nem houve discussão"
Cláudio Ramos sobre afastamento do "Big Brother". "Não chorei, nem houve discussão"
Ver artigo

Achei que, naquela altura, foram muito injustos com o que escreveram em relação à Cristina. Porque eu e ela, e a direção, nós sabíamos o que vinha aí. Não sabia em que moldes, também não queria saber muita coisa. Quando acabei o "BB2020" estava tão cansado, tão cansado, e não era só de fazer o programa. Era de tudo. A pressão é muita. Quando a Cristina disse que eu não ia fazer o "Big Brother - A Revolução", pensei "aiiii, posso ir descansar!". Na altura não devo ter pensado assim, devo ter pensado "porquê?". A Cristina não me disse que era a Teresa mas disse-me "A TVI tem memória". E eu percebi logo: "ou é a Teresa ou é o Manel". O programa não é meu! Eu fiz um, foi uma sorte ter feito dois. O programa não é meu, como não é da Teresa como as manhãs não são de ninguém. Achei um bocadinho injusto mas, lá está, vem com a fatura.

Chegou à TVI sete meses antes do regresso de Cristina Ferreira. Acha que se criou um clima de má vontade em relação a tudo o que acontece na estação? E porque é que acha que isso aconteceu?
Acho que há má vontade em títulos que vejo no online. Percebo isso mas não consigo encontrar a razão. O meu terapeuta diz "não vale a pena preocupar-se em encontrar a razão daquele problema, é mais fácil arranjar a solução". E, se as pessoas olham daquela maneira, é porque querem ver daquela maneira. Só o tempo vai mostrar que estamos a fazer um trabalho e que somos uma equipa. A Cristina está ao leme da direção de programas, obviamente. Ela sabia — estou convencido — que não iria nem ser fácil nem passar por isto sem críticas, elogios e uma data de coisas. Mas se ela quisesse estar confortável eu também acho que ela tinha ficado nas manhãs da SIC onde ainda hoje seria rainha e senhora. E eu estaria a fazer as manhãs da TVI, a perder que nem um pato. As coisas funcionam desta maneira. Ela sabia o que ia acontecer. Má vontade, acho que sim, que existe. 

Por causa da Cristina?
Eu acho que sim. Não consigo encontrar uma razão, não consigo perceber mas basta olhar e perceber que há uma má vontade. É como se não se fizesse nada certo. A coisa até pode ser boa mas as pessoas vão olhar sempre para o menos bom. Não estou a dizer que se acerta sempre…

Está polarizado no sentido em que agora se fala e se escreve sobre coisas que, há um ano e meio, ninguém pegava.
Agora é moda. É porque fala alto, é porque abre a porta, é porque vai ao Dubai, porque mete este, porque tira aquele… Por exemplo, nós fizemos o "A TVI Troca-lhe as Voltas". Eu achei uma ideia muito gira. Em qualquer lugar do mundo, seria aplaudido. Em Espanha, onde já tinha sido feito, foi o máximo. Como fizemos aqui e foi ideia da direção de programas, já… meu Deus do céu! É a Cristina que quer ficar com as manhãs, é a que faz de nós aquilo que ela quer… eu não percebo, juro que não percebo. É como se nós fossemos todos uns tontinhos e não soubéssemos o que andamos aqui a fazer. Só que não podemos contar tudo. 

Apresentar o próximo "Big Brother" ? "Gostar, gostava, mas também não ficava triste se não o fizesse"

A pergunta de um milhão de euros. Vai apresentar o próximo "Big Brother" ?
Não faço a mínima ideia. Até ao dia de hoje [28 de julho] não sei nada. Ainda ninguém chegou ao pé de mim e disse “Cláudio, vamos falar de 'Big Brother'?". Ninguém me disse nada. Lembro-me porque vejo a promoção mas não estou nem pensando que vai haver um "Big Brother". Não lhe vou dizer que não vou ser eu ou não, mas ninguém tem de me pedir autorização. 

Gostava de voltar a apresentar?
Depende. O "Big Brother" é um formato puxado, que eu gosto. Gostar, gostava, mas também não ficava triste se não o fizesse. Eu fiz o segundo e não imaginava que o fosse fazer. 

Estando deste lado, e conhecendo cada vez mais jovens adultos que têm aspirações a chegarem à televisão, a serem apresentadores, a perceção que eu tenho é que o Cláudio é a referência para muitos deles, que se identificam consigo. Tem essa perceção?
Tenho porque recebo sempre essas manifestações. Eu fico sempre contente porque eu acho que eles primeiro não me conhecem. Depois vão procurar a minha história. Quem o faz percebe que não fui exatamente aquela pessoa que tirou Comunicação Social, um curso de apresentação, que foi escolhida por alguém que me achou muita graça, fui fazer um casting e fui ficando.

Eu não sou essa pessoa. Eu sou a outra pessoa. Eu sou aquilo a que lá fora chamam o sonho americano. Eu vim à procura, eu fiz-me a mim próprio. Eu fui esgravatando as minhas oportunidades, foram-me aparecendo pessoas. Eu digo sempre à minha filha: "Leonor, não é o curso superior que te vai dar. Tens de ter vontade de". Ela quer ser historiadora e escritora. Eu digo sempre "a faculdade ajuda, os estudos ajudam, mas tens de querer, porque não te cai do céu, ninguém te vai buscar a casa". O que acho que acontece com os miúdos é que eles podem ver "se ele fez, eu também faço". Eles têm é de ter noção de que, para fazer isto, eu tinha de abdicar de uma data de coisas. Muitas coisas, que eu só vou recuperar quando, aos 50, abrandar o meu ritmo de trabalho. Vou recuperar amigos, coisas que perdi, vou voltar à horta. Coisas que eu não pude fazer neste tempo porque estive muito focado em chegar aqui. Eu acho que eles têm de ter essa noção de sacrifício.

"Eu gosto de cultivar um lado que as pessoas não conhecem, e cultivo o estar sozinho porque acho que me faz falta."

Foi um caminho solitário?
Foi. Muito solitário. Porque as pessoas não entendem. Porque os teus amigos, quando dizes que conseguiste isto e isto, para eles é peanuts, porque muito não são desta área, então não têm noção do que é ou uma entrevista, ou um casting ou ser chamado para uma figuração. Não valorizam. E depois, a partir do momento em que entras, é para eles um dado adquirido e tu chegas à conclusão que este meio é muito bonito mas os amigos são muito difíceis de fazer e é muito complicado tu conversares com as pessoas. Por um lado ainda bem, que é para não trazeres mais para dentro de casa do que as coisas que tens. Mas um caminho feito assim é um caminho solitário.

Sente-se acompanhado agora, no sentido em que, apesar de ter feito esse caminho sozinho, tem uma boa rede de apoio à sua volta?
Eu serei sempre uma pessoa sozinha porque eu tenho esta enorme necessidade de perceber que subo a escada de casa e é como se fosse o Super Homem. Transformo-me noutra pessoa. Numa pessoa que quer que os amigos estejam cá em casa, falem de outra coisa, que venham e façam outra coisa qualquer, ver séries que não tenham nada a ver com isto. Gosto de ir ao cinema sozinho.

Eu gosto de cultivar um lado que as pessoas não conhecem, e eu cultivo o estar sozinho porque acho que me faz falta. Embora eu saiba que tenho a minha filha, a minha família, os amigos no Alentejo, os amigos da televisão, em quem posso confiar, mas eu cultivo para mim uma certa solidão que eu acho que nos faz falta para quando chegarmos ao fim do dia, esvaziarmos o ego.

Nós somos um balão. Sais de casa e és o Cláudio Ramos. O senhor deixa-te passar à frente, abre-te a cancela da TVI. Chegas ao bar, não pagas, vais para a televisão. Três horas o foco em cima, palmas, elogios na internet, a imprensa… se tu não chegas a casa e esvazias o balão, não te dás conta e, ao fim de duas ou três semanas, achas-te o rei. Não és o rei de nada. Podes sair do ar de um dia para o outro e acabou-se. Vais a Badajoz e ninguém sabe quem tu és. Eu preciso desse exercício para não sofrer com coisas que, depois, me possam vir a acontecer mais à frente. Se, de repente, eu ficar sem programas, ou se eu ganhar menos, como já me aconteceu, eu penso ‘ok, aquilo era apenas um privilégio de um trabalho que eu fazia”.

O ego é a coisa mais lixada neste meio. Se não o esvaziamos, trama a vida de muita gente.