Tenho de admitir. Esta segunda-feira às 18 horas senti que tinha de volta o folgo que em tempos marcava os meus finais de tarde. A diferença é que na altura, com 11 anos, corria das tardes de brincadeira na rua para me instalar no sofá dos meus avós e não perder um minuto dos novos episódios e agora o folgo é apenas de entusiasmo, porque para deixar o teletrabalho de lado e ligar a televisão não preciso de esforço extra.

Já sintonizada na TVI, pensei que ia ter um primeiro sentimento de nostalgia ou deja vu de uma fã que não perdeu nenhuma temporada. Nada. A verdade é que já se passaram 17 anos desde que a série começou — ou 11 desde a 7ª temporada “Morangos com Açúcar — Vive o Teu Verão” escolhida para estes tempos de quarentena (claramente por alguém que não nutre um especial sentimento pela série) — e algumas coisas já não estão na memória. Contudo, bastaram alguns segundos para recordar uma das temporadas que acompanhou, mas não marcou, a minha infância e adolescência.

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Já mal me lembrava de Lourenço Ortigão, ou Rui Oliveira, no papel da 7ª temporada, com um cabelo de beto e metade dos abdominais. Ainda que a memória tenha voltado, a paixoneta ficou lá atrás. Sim, porque qual era a rapariga que não tinha pelo Lourenço Ortigão uma paixão dupla: a do papel que fazia nos “Morangos com Açúcar” e a que nos fazia remeter para Troy Bolton (Zac Efron) em “High School Musical”?

Numa idade em que o filtro de influências ainda não está totalmente apurado, lembro-me bem de querer ser tal como Margarida Bacelar (Sara Matos, que parece que quase não mudou) e cantar tal como ela a música "Heartbeat" e ter a mesma paixão com Rui, claro.

Apesar de já não querer ser a Margarida Bacelar, uma coisa não mudou: pensar o quão exagerados eram os dramas e a forma de representar dos personagens principais, mas também do restante elenco.

Eis que a meio desta retransmissão de "Morangos com Açúcar" no sofá que acompanha a minha quarentena ouço uma espécie de piropo feito por Sérgio (Filipe Albuquerque) a Simara (Sara Santos): "Um sorriso tão lindo merecia qualquer coisa”. Acredito que na altura me tenha passado ao lado ou tenha pensado “ok, adiante”, mas hoje deu-me arrepios de cringe que foi esse momento.

Passando para momentos menos estranhos, mas que dão igualmente vontade de rir, ouvir de novo uma músicas sensação da temporada — a “Mony Mony” interpretada por Mariana (Lia Carvalho) e o Léo (Ricardo de Sá) — fez-me recordar os concertos que dava pós-episódios “Morangos com Açúcar”. Porém: também isso me deixa desconfortável, porque nem eu nem as personagens tínhamos bem noção do que fazíamos.

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Tudo continua igual nos episódios, menos a forma como os vejo. Não sinto o verão a chegar, muito menos porque sabe-se lá se este ano é sequer possível colocar um pé na água salgada sem ter medo de partilhar a praia com mais pessoas e sei que já não quero ser artista porque expressar-me por palavras (escritas) aproxima-se mais dos meus "Morangos sem açúcar — Vive a Tua Quarentena".

Por isso, apesar de a série que começou em 2003 e acabou em 2012 ter marcado a minha infância e adolescência, prefiro que fique aí mesmo (razão pela qual nunca fui tentada a rever os episódios no canal Biggs) e não estrague as boas memórias que tenho de duas horas diárias no verão depois de vir da praia ou no inverno, na temporada escolar, sempre acompanhada de umas torradas com manteiga (porque já não era tempo de morangos).

O mesmo se aplica às personagens que passado 11 anos já não consigo ver da mesma forma (pelo menos as que não desapareceram do mapa). Olho para o Lourenço Ortigão e fico à espera de uma receita com medalhões de salmão da Pescanova, só consigo imaginar Sara Matos em modo Elsa Santinho a cantar “Ui ui na Sacristia” na novela Terra Brava da SIC e quanto a Rui Andrade já só o associo à voz imponente sempre que o vejo num dos musicais dirigidos por Filipe La Feria.