A terceira temporada de "Pesadelo na Cozinha" chegou ao fim, mas ainda não foi este domingo que nos despedimos do fim de semana sem ver Ljubomir Stanisic na televisão. No segundo e último episódio especial dedicado a recordar os restaurantes que passaram pelo programa da TVI, o chef do 100 Maneiras voltou a abrir o livro de memórias.

E que memórias. Houve maus momentos, claro — e que incluíram vómitos, noites de diarreia e a recusa de Ljubomir em ajudar um dos restaurantes —, mas também outros que o marcaram pela positiva — como a empatia que criou com Irene, ajudante de cozinha do restaurante A Faia. Quando celebrou 70 anos, o chef não só lhe ofereceu um ramo de flores, como um almoço no seu restaurante.

Este momento faz parte da terceira temporada, mas Ljubomir relembrou este domingo a evolução desde que deu início ao "Pesadelo na Cozinha", há quatro anos: "No primeiro programa foi como se fossem todos os primeiros. Em todos os [restaurantes] que entrámos as pessoas estavam despidas, nuas. Não havia limpeza nenhuma", refere o chef, lembrando que na altura chegou até a encontrar uma chanfana com nove anos dentro de um congelador.

O chef notou uma grande diferença entre a primeira e segunda temporada. E por uma razão muito simples: "Todos já tinham visto a primeira temporada", explica o chef, acrescentando ainda que o facto de já o conhecerem pela televisão fez com que o associassem a uma pessoa bruta e asneirenta.

"Os donos dos restaurantes ficaram cheios de medo e perceberam que ‘este gajo não é para brincadeiras’. E aí já havia mais regras e começavam a limpar. Falavam comigo de cabeça para baixo", relembra. Já quanto à terceira temporada, Ljubomir foi com outro espírito.

Um sentimento mais solidário dominou o chef bósnio, diz, algo que se fez notar nos inúmeros abraços que deu ao longo da última temporada. Não só admite que aprendeu mais com as pessoas nesta temporada, como se tornou mais humilde, esquecendo as câmaras. 

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"Sentir a energia da equipa com quem trabalho trouxe-me muita confiança. Encontrei um método diferente de estar ali", relembra. No fim do balanço sobre as três temporadas, Ljubomir revela que se sente feliz pelo facto de ter conseguido com que 70% dos restaurantes resultassem, sendo que desses pelo menos 40% são um sucesso.

O que encontrou de mais nojento

Antes de chegar às percentagens positivas, o chef teve de passar (e comer) coisas que nunca imaginou. Uma delas foi um choco que não só cheirava mal, como tinha uma textura duvidosa que descreveu como "nhanha". E não esquecer também o dia em que lhe foi servido camarão podre. 

No Mirante da Rocha em Carnaxide, recordou também, não encontrou um único produto fresco com exceção da salsa. Congelados também estavam os caracóis que encontrou no restaurante Caipirinha, na Figueira da Foz.

E se por um lado Ljubomir é forte na confecção de pratos, também o é na descrição dos mesmos: "O arroz de pato da Apple House. Não vamos falar disso. Não era arroz nem pato. Era um transgénico de Chernobyl", recorda o chef, acrescentando ainda que comeu muito durante os programas: "As pessoas não tem noção daquilo que eu comi".

As desistências

Ljubomir não é de desistir, mas em alguns casos chegou a sair da porta — acabando sempre por voltar a entrar. Os passos até à rua serviam apenas como alerta para que os proprietários dos estabelecimentos sentissem que estavam a perder a ajuda do chef e começassem a reagir, conforme conta no programa.

Em alguns casos funcionou, acabando até por divertir-se e criar laços com os funcionários. Mas houve um caso onde não foi bem assim. O desentendimento com o proprietário fez com que o chef pedisse à produção para não ajudar o estabelecimento, por se sentir enganado depois de chegar ao restaurante e ter uma lista completa de materiais que eram necessários comprar.

Aconteceu também que num outro restaurante, onde a sua ajuda não foi bem aceite, o chef recebeu mais tarde um email a pedir novamente ajuda — e reconhecendo que Ljubomir tinha razão sobre as críticas que fez na altura do programa. "Espera aí, meu caro José. Mas tinhas a cabeça no cu? São estas situações que são surreais", comenta indignado o chef.

"Não coloquei os óculos para ler direito e quando acabei de assinar estava lá 'Pesadelo na Cozinha' e eu: 'Ai'"
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Os sucessos

Stop TIR, em Vilar Formoso, faz parte da segunda temporada e parece que foi mesmo um sucesso. Pedro, o proprietário, está diferente, algo que não só o próprio reconhece, como a funcionária, Irina: "O Pedro está diferente. Ficou mais tranquilo. Já não faz compras à toa. Já não há congelados para ninguém", revela.

Já Pedro conta que tentou apostar em novos pratos na ementa e até criar um prato de carne da sua própria autoria. "Deu para aprender algumas coisas. Há uma grande diferença, o pessoal está mais organizado. A melhor coisa para mim foi entusiasmar-me e continuar a lutar. Tento ser mais perfeccionista", revela.

Já no Dona Porto, no Porto, Conceição relembra a passagem do chef como um "pesadelo tirado de cima". Isto porque o negócio estava de tal forma debilitado, que a ajuda de Ljubomir foi fundamental. "O desânimo com que eu andava também desapareceu. Precisava realmente do empurrão que ele me deu psicologicamente", diz a proprietária.

Depois da passagem do chef pelo programa, ficou a remodelação do espaço e a admiração por Ljubomir: "Eu defendo-o muito perante as pessoas que dizem que ele é um porco, que é isto e aquilo". Conceição termina com uma mensagem para o chef, dizendo que ele deve continuar com o trabalho que tem feito, e com um agradecimento. O chef não ficou indiferente: "Tão querida. Tão linda ela. Tenho o quadro que ela me ofereceu na minha sala. Todos os dias olho para não me esquecer desta pessoa".

No restaurante 2002 as coisas não começaram da melhor forma com o filho do proprietário, que geria o negócio na altura em que Ljubomir visitou o restaurante, mas Carlos voltou a pegar no negócio em junho de 2019 e tudo voltou a funcionar.

Na altura, o chef do 100 Maneiras chegou mesmo a dizer a Carlos que o filho era um "badalhoco" e que estava a "cagar-se para o negócio". Depois da passagem de Ljubomir, as ajudantes de cozinha ficaram com saudades do chef, deixando nesta fase final da terceira temporada uma mensagem: "Tenho saudades do chef. Ainda hoje temos pessoas que vêm cá e dizem: 'Eu vi-vos na televisão' e dão-nos os parabéns e tudo. Ele é um senhor, que além de ser um grande chef, sabe dar-nos bons conselhos".

Perante o elogio, Ljubomir termina como começou a temporada, de forma emotiva: "Isto deixou-me muito feliz. É bom sentir esta recompensa humana".

Até à quarta temporada, chef.