As más condições de trabalho. A polémica das raspadinhas. As disparidades salariais entre homens e mulheres. O calendário sensual das assistentes de bordo. Nos últimos anos, foram muitos os escândalos e controvérsias que envolveram a Ryanair.

Esta sexta-feira, 19 de outubro, surgiu mais uma: um passageiro agrediu verbalmente uma mulher de raça negra. Apesar de o avião ainda estar na pista, os tripulantes não expulsaram o homem. Pelo contrário, acabou por ser a vítima a mudar de lugar.

Criada pelos empresários irlandeses Christy Ryan, Tony Ryan e Liam Lonergan em 1985, a Ryanair estava a perder dinheiro quando foi reformulada em 1991. Foi nesse ano que Michael O'Leary, o atual CEO da companhia aérea, foi contratado, e que a companhia se tornou numa low cost. Atualmente é uma das maiores companhias aéreas da Europa neste setor, mas a sua história é feita de polémicas. Muitas.

Recordamos as maiores.

Uma mulher foi verbalmente agredida — mas foi ela quem acabou por mudar de lugar

"Sua preta, feia, desgraçada". Na sexta-feira, 19 de outubro, um passageiro da Ryanair agrediu verbalmente uma mulher de raça negra que estava sentada ao seu lado. O momento foi filmado por outro passageiro — no vídeo vemos o homem a insistir para que a mulher de 77 anos ande mais depressa. Quando a filha explica que a mãe não consegue andar mais rápido, ele responde que "não quer saber". Após uma série de insultos, chega mesmo a dizer: "Se não vais para outro lugar, eu empurro-te até outro lugar".

O voo, com partida de Barcelona e destino a Londres, ainda estava na pista quando o incidente ocorreu — por isso mesmo, a companhia aérea está a ser alvo de críticas por não ter expulsado o passageiro. Acabou por ser a mulher a mudar de lugar.

A fotografia dos tripulantes a dormir no chão

A imagem dos tripulantes a dormir no chão
A imagem dos tripulantes a dormir no chão

Na sequência da tempestade Leslie, a 13 de outubro um voo com destino ao Porto teve de ser desviado para Málaga, Espanha. Alegadamente sem acesso a comida, bebidas ou um lugar para se sentarem, os tripulantes da companhia aérea foram fotografados a dormir no chão. A imagem tornou-se viral.

Sobre o assunto, o Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) disse: "É lamentável e inadmissível que, em pleno século XXI, possamos assistir a este tipo de situações, onde ainda constatamos que a Ryanair opera sem qualquer tipo de respeito pelos seus funcionários e pelos seus passageiros que também foram deixados à sua sorte no referido aeroporto, num setor, fortemente regulado por autoridades nacionais e europeias".

A 17 de outubro, a Ryanair divulgou as imagens de uma câmara de vigilância do aeroporto de Málaga. De acordo com a companhia aérea, o "vídeo prova que a imagem original foi encenada e nenhuma tripulação dormiu no chão". Em comunicado, a low cost irlandesa exigiu um pedido de desculpas do SNPVAC.

"A Ryanair insta o tripulante da Easyjet e dirigente do SNPVAC, farsante Fernando Gandra, a desculpar-se por declarar que os tripulantes da Ryanair dormiram na sala de tripulantes de Málaga na semana passada".

As ameaças a quem faz greve

Têm sido quase sucessivas as greves dos trabalhadores da Ryanair. Em julho, cerca de 600 voos foram cancelados devido a uma greve de tripulantes de cabine nas bases em Portugal, Espanha e Bélgica. Os sindicatos reclamavam a aplicação das leis laborais dos seus países, reconhecimento dos representantes sindicais e ainda as mesmas condições de trabalho para quem for contratado pelas agências Workforce e Crewlink.

A resposta da Ryanair levantou polémica. Classificando esta greve como "desnecessária", a companhia aérea enviou um email aos tripulantes incentivando-os a ir trabalhar e avisando-os de que quem fizer greve perderá o bónus mensal.

As mulheres ganham (muito) menos do que os homens

Em abril, um estudo concluiu que a Ryanair tem a pior disparidade salarial entre homens e mulheres de toda a indústria de aviação. A diferença entre sexos é de uns impressionantes 71,8%, de acordo com a análise da remuneração dos 1.182 funcionários da companhia aérea no Reino Unido. A Ryanair respondeu na altura argumentando que este número era explicado pelo reduzido número de pilotos do sexo feminino — no caso da companhia aérea, eram apenas oito no total de 554 pilotos.

Em segundo lugar nesta lista ficou a Jet2.com, com uma diferença de 49,7%. A easyJet ficou nos 45%. A melhor companhia aérea foi a British Airways, com uma disparidade salarial de 10%.

O calendário sensual das assistentes de bordo

Foi em 2008 que a Ryanair decidiu lançar um calendário bem sensual com as suas assistentes de bordo mais sexy. A companhia aérea explicou na altura que a ideia foi sugerida pelo staff e que o valor das vendas reverteria para caridade. A iniciativa foi classificada de sexista e, anos mais tarde, continuou envolvida em polémica. Em 2011 a entidade que regula a publicidade no Reino Unido, a Advertising Standards Authority, classificou as imagens de "degradantes". Nesse mesmo ano, uma petição contra o calendário reuniu mais de dez mil assinaturas.

A Ryanair defendeu-se: "Não há nada degradante sobre o facto de o nosso staff se voluntariar para juntar dinheiro para instituições de caridade, como a UK Teenage Cancer Trust", disse Robin Kiely, porta-voz da companhia aérea, ao DailyMail. De acordo com o mesmo, os calendários estariam a angariar mais de 100 mil euros ao ano para instituições de caridade. Em 2015, porém, não houve calendário. No ano seguinte voltou a aparecer, mas numa versão bem mais discreta — com homens e mulheres, todos vestidos.

"Na classe executiva, tudo será gratuito. Até as camas e sexo oral"

A frase foi dita pelo CEO da Ryanair, Michael O'Leary. Mas há outras. Aos 57 anos, o empresário irlandês é frequentemente descrito pela imprensa como arrogante e contraditório. Também tem tendência para fazer declarações polémicas, ataques pessoais e ser pouco contido na utilização de palavrões. Reunimos algumas das suas frases mais controversas.

As 15 maiores polémicas da Ryanair
As 15 maiores polémicas da Ryanair

— "A melhor coisa que pode fazer com os ambientalistas é matá-los";
— "Na classe executiva será tudo gratuito. Até as camas e sexo oral";
— "Se as vendas das bebidas estão a cair, nós fazemos com que os pilotos projetem um pouco mais de turbulência. Isso geralmente aumenta as vendas";
— Sobre os passageiros que se esquecem de imprimir os cartões de embarque: "Achamos que eles deveriam pagar 60€ por serem estúpidos";
— "Os franceses nunca produziram um grande filósofo. Grande vinho talvez, mas não grandes filósofos";
— "Se nós levamos ricos nos nossos aviões? Sim, eu voei num esta manhã e estou muito rico";
— "Porque não disponibilizar filmes pornográficos? Ou cobrar aos passageiros mais gordos ou até por usar a casa de banho?";
— "Estou disponível para aceitar qualquer moeda, até cabras gregas";
— Para um funcionário da Ryanair que entrou numa sessão de perguntas no Twitter: "Volte para o trabalho, seu preguiçoso, ou está despedido";
— "Não vai receber um reembolso, portanto vá-se foder. Não queremos ouvir as suas histórias tristes. Qual é a parte do 'não reembolsável' que não entende?".

LiveATC.net. Esta app deixa-o ouvir as conversas dos controladores aéreos
LiveATC.net. Esta app deixa-o ouvir as conversas dos controladores aéreos
Ver artigo

Em 2013, Michael O'Leary também protagonizou um momento no mínimo muito caricato quando assumiu o controlo da página de Twitter da Ryanair. "Boa fotografia. Phwoaaarr!”, lê-se no comentário deixado a uma mulher. A companhia foi acusada de sexismo.

A Ryanair queria cobrar taxas extra aos passageiros com excesso de peso

Em 2009, a companhia aérea pediu aos seus passageiros que sugerissem ideias onde a Ryanair pudesse ganhar mais dinheiro, de modo a ter bilhetes ainda mais baratos. De acordo com a empresa irlandesa, 30 mil pessoas apoiaram a ideia de cobrar uma taxa especial aos passageiros com excesso de peso.

A Ryanair começou a estudar o assunto, e lançou uma nova votação sobre a melhor forma de taxar os obesos. Deu quatro opções: cobrar mais aos homens que pesassem mais de 130 quilos e às mulheres com mais de 100; sobretaxar o bilhete dos homens com mais 114 centímetros de cintura e a das mulheres com mais de 101; penalizar quem passasse os 40 no cálculo do Índice de Massa Corpórea (IMC), que a partir dos 30 já define uma pessoa como obesa; e, por fim, obrigar os passageiros cuja cintura encostasse nos apoios dos braços a comprar dois bilhetes.

A medida foi discutida durante vários anos. Em 2015, desistiram finalmente do assunto. Mas não porque fosse uma má ideia: o problema era que a taxa iria ser impossível de implementar sem comprometer a pontualidade da companhia.

E também queria cobrar quem utilizasse a casa de banho

Em 2009, Michael O’Leary disse à BBC: "Algo que já considerámos antes e que voltamos a considerar agora é a possibilidade de colocar uma ranhura para inserir moedas na porta das casas de banho". Sobre a possibilidade de isso ser um inconveniente, o CEO respondeu que não consegue conceber "alguém na história que tivesse viajado pela Ryanair com menos de uma libra no bolso".

Os polémicos cancelamentos do ano passado

Mais de dois mil voos cancelados e 400 mil passageiros afetados. Foi assim em setembro e outubro do ano passado, quando a Ryanair anunciou que ia cancelar entre 40 a 50 voos por dia. No início, a companhia aérea justificou a situação com a necessidade de melhorar a pontualidade da companhia, dizendo que o cancelamento de 2% do programa de voos durante seis semanas seria suficiente para restaurar a pontualidade nos 90%. Depois, admitiu que houve uma falha na distribuição das férias, resultado do ultimado feito pela Autoridade de Aviação da Irlanda.

É que existe um limite máximo de horas de voo — 900 por ano e 100 por mês. A Ryanair fazia essa contabilização a partir de abril de cada ano, enquanto todas as outras companhias começavam em janeiro. Obrigada desde o ano passado a fazer o mesmo, isso forçou a low cost irlandesa a recalcular as férias dos pilotos, incitando alguns a fazê-lo de imediato. Resultado? Voos cancelados por falta de pilotos.

As condições de trabalho dos pilotos e assistentes de bordo

Ainda sobre o que aconteceu no ano passado, na altura a imprensa internacional falou na possibilidade de haver falta de pilotos porque estes estariam a abandonar a empresa. As más condições de trabalho dos pilotos e assistentes de bordo não são uma novidade e, escreveu-se na altura, só num ano a rival Norwegian Airlines teria ficado com 140 pilotos da Ryanair. Porque pagavam melhor, claro.

Os truques e manhas das agências que vendem bilhetes de avião online
Os truques e manhas das agências que vendem bilhetes de avião online
Ver artigo

Com os assistentes de bordo a situação não é melhor. O curso tem de ser pago pelo trabalhadores, que também têm de levar a sua própria comida para o voo e vender oito raspadinhas por dia para não correrem o risco de serem despromovidos. As descrições de quem por lá passou são geralmente muito pouco simpáticas, conforme se pode ver em vários sites de reviews como o Indeed ou Glassdoor. Metade dos trabalhadores tem vínculo precário.

A história das raspadinhas e o prémio máximo que nunca ninguém ganhou

Os assistentes de bordo tentam vendê-las a todo o custo, e para a Ryanair isso é ótimo — em cinco anos, as raspadinhas renderam dois milhões de euros. O jackpot prometido é de um milhão de euros, só que nunca ninguém o ganhou. É que sair vencedor deste sorteio não lhe dá acesso imediato ao tão cobiçado prémio — a seguir ainda tem de escolher um envelope no meio de 125, e só há um milhão de euros num deles, claro. Em 2016 uma pessoa ganhou 50 mil euros. Também já foram atribuídos prémios mais pequenos, como cinco mil euros ou um carro.

A controvérsia das malas dentro do avião

Desde janeiro que já não é possível levar duas malas dentro da cabine dos aviões — pelo menos sem pagar mais por isso. A mala mais pequena pode ir guardada em cima do banco, a grande tem de ir para o porão, sem custos adicionais. A introdução da medida foi mal recebida pelos passageiros, que acusaram a companhia de estar a tentar fazer mais dinheiro. A Ryanair respondeu, explicando que estava farta de “ser vítima da sua simpatia”.

“Nós somos muito generosos com o nosso limite de bagagem: uma mala com um máximo de dez quilos e uma segunda de mão. Se toda a gente respeitasse isto não haveria problema nenhum. São as pessoas que vêm com o lavatório da cozinha atrás que nos podem vir a fazer mudar a política", disse Neil Sorahan, responsável financeiro da Ryanair, ao jornal “The Guardian”, no final de julho.

E foi exatamente isso que aconteceu. Para levar duas malas dentro da cabine é preciso agora comprar o embarque prioritário, que custa 5€ no momento da reserva ou 6€ se for adicionado mais tarde.

Será que a Ryanair separa casais e grupos de propósito? Um estudo diz que sim

No ano passado, uma investigação realizada pela Universidade de Oxford concluiu que a atribuição de lugares na Ryanair é tudo menos aleatória. O estudo foi pedido pela BBC, uma vez que muitos clientes estavam a usar as redes sociais para acusar a companhia aérea de estar a separar grupos e casais de propósito. A conclusão foi que sim, de facto era isso que estava a acontecer.

Para realizar esta investigação, foram comprados bilhetes para quatro grupos de quatro pessoas cada. Todos eles acabaram nos bancos do meio. De acordo com a universidade, a probabilidade de isto acontecer era de 1 em 540.000.000.

Viajar com pouco combustível

A Irish Air Line Pilots' Association criticou a Ryanair por alegadamente encorajar os pilotos a voarem com o mínimo de combustível possível, com o objetivo de reduzir custos. A queixa foi apresentada em 2012, mas a Ryanair emitiu um desmentido.

Cobrar pela utilização de cadeira de rodas

Em 2004, um tribunal decidiu contra a Ryanair na sua resolução  de cobrar 20€ pela utilização de uma cadeira de rodas a um passageiro com paralisia cerebral. A companhia respondeu que, em resultado disso, teria de aumentar os preços dos bilhetes em cerca de 0,70€ a todos os portadores de cadeira de rodas. Neste momento não existe a informação de qualquer tipo de custo extra no site da low cost.