"Última chamada para o voo que vai direto para uma realidade completamente diferente". Podia ter sido assim a chamada da Emirates para embarcar no avião com direção ao Dubai, nos Emirados Árabes Unidos (EAU), porque não foge ao que nos esperava. No entanto, com alguns constrangimentos. Tínhamos um roteiro traçado, com passagem nos principais pontos da cidade, mas um acontecimento trágico fez com que alguns museus estivessem fechados: a morte do Sheikh Khalifa bin Zayed Al-Nahyan, presidente dos Emirados Árabes Unidos (EAU), aos 73 anos.
A morte do presidente levou o governo a declarar "luto oficial e bandeiras a meia haste" por 40 dias, conforme avançado pela agência de notícias oficial WAM, segundo o “Expresso”. Apesar do luto e de um programa ligeiramente alterado, desde o primeiro minuto em que colocámos os pés no Dubai, nada na visita ficou aquém do esperado. A começar pelo calor.
O emirado é conhecido pelos luxos, mas também pelas altas temperaturas que no verão podem atingir mais de 50ºC. Na noite em que chegámos estavam uns nada simpáticos 30ºC, o que, mal se abriram as portas do aeroporto, foi como um “bem vindos ao luxo de ter o corpo quase sempre transpirado” — e dizemos "quase" porque valha-nos o ar condicionado toda a parte para aliviar.
Mas vá, é chegada a altura de falar nos verdadeiros luxos. Após sentir este calor, logo nos esquecemos dele ao ver um Tesla Model X (mais especificamente daqueles cujas portas traseiras abrem para cima tipo asa de falcão), que mostrava já um pouco do nível de vida no Dubai.
Giro. Diríamos até impressionante. Contudo, o verdadeiro entusiasmo chegou quando fomos para junto do transfer para o hotel: uma carrinha Volkswagen pão de forma fofinha que mostra a dualidade do Dubai entre o luxo (representado no Tesla) e o normal (simbolizado na carrinha que faz a sua função, transportar) num país caro onde nem todos ganham uma fortuna e o salário mínimo não chega a 800€.
No percurso até ao hotel, já perto da uma hora da madrugada local, uma parte da cidade já dormia, mas outra estava bem acordada: as luzes do grandes arranha céus, incluindo um que parecia inspirado no jogo tetris e que era apenas um exemplo das formas infinitas que aqui os edifícios tomam.
No Dubai há um lugar onde o dia tem mais uma hora
Podíamos ter ficado num qualquer hotel mais conhecido, como o Jumeirah Emirates Towers Hotel do português José Silva, mas ficámos no 25hours Hotel One Central, do grupo 25hours Hotels, que abriu em soft opening a 15 de dezembro de 2021.
Pode não ter tanto luxo como os demais, mas é moderno — estando alinhado com o museu do Futuro, que faz parte da vista de alguns quartos, e também com o futuro do planeta, desde logo pelas amenities em dispensadores refill ou outros feitos com materiais biodegradáveis — e pensado para os nómadas digitais que estão espalhados por toda a unidade ou dentro dos quartos equipados com secretárias e coluna bluetooth para dar música ambiente durante o trabalho.
Nas pausas, nómadas digitais ou turistas podem desfrutar do conceito lifestyle do hotel, que ora oferece uma taça de açaí (cerca de 13€), ora permite um mergulho na piscina localizada no rooftop, com vista para a cidade, para o Museu do Futuro e para os arranha-céus. No nosso caso, que andámos a explorar o Dubai, não fomos a tempo do açaí, mas caiu igualmente bem o jantar no Tandoor Tina, o conceito indiano do hotel que dá um pouco de picante à estadia (e algum álcool).
O 25hours Hotel One Central no Dubai é o primeiro do grupo fora da Europa, mas já está a pensar numa expansão quer no interior, quer para o exterior. Dentro da própria unidade vai surgir em breve um novo conceito no 6.º piso que promete animar ainda mais as noites no Dubai e, lá fora, a marca chegará a Sydney, na Austrália, conforme revelou-nos Patrick Mattick, soul manager do 25hours Hotel One Central.
Contudo, o que se vê dentro deste hotel — como uma espécie de ambiente galáctico e luzes néon a dizer "olá, estanho" — será completamente diferente do próximo que está a ser projetado, tal como são todas as outras unidades. Cada uma é diferente da outra, sendo que a única característica comum é que o grupo oferece a 25.º hora para poder desfrutar da vasta oferta, que não é possível experimentar em apenas 24 horas.
No caso do hotel do Dubai, tem piscina, ginásio com aulas no exterior, a primeira sauna mista do Dubai, o Tandoor Tina, assim como o Ernst Bavarian Biergarten & Wirsthaus (cozinha tradicional alemã desde os pretzels às cervejas), e o Monkey Bar, espaço com música todas as noites e onde é possível beber álcool confortavelmente. Isto porque os muçulmanos não consomem estas bebidas e os melhores locaispara beber um bom copo de vinho — sem o qual os portugueses não passam — são em espaços internacionais, como este hotel.
Uma noite para duas pessoas no 25hours Hotel One Central custa desde 141€ em maio.
Portugueses não passam sem vinho. Nem sem café
Após acordar no 25hours Hotel One Central e aconchegarmo-nos com uma tentativa de ovos Benedict feita por nós (com um ovo cinco minutos demasiado gelatinoso, que foi péssima escolha quando o de 8 minutos teria sido ideal ou quando poderíamos ter pedido uns perfeitos da cozinha), fomos diretos para os souks (mercados) do Dubai a bordo da nossa pão de forma e acompanhados de Andrew, guia egípcio atualmente a trabalhar no Dubai.
Começámos por bairro histórico Al Fahidi, onde provámos pela primeira vez café árabe. Não dá a energia de um expresso e nem é esse o objetivo. Este é um café mesmo para degustar, porque além de feito com água e café, leva açafrão e cardamomo. O resultado é um café mais aromático, quase a saber a chá, servido em pequenos copos (cuja razão explicaremos adiante).
Depois deste mercado, apanhámos um barco no Dubai Creek para Deira e fomos visitar o mercado no bairro de Al Ras. Fez-nos lembrar os mercados de Marrocos, com todas as cores, cheiros de especiarias e preços a serem regateados em voz alta, mas mais organizado do que no país africano.
É fácil perdemo-nos aqui entre perfumes, cujos frascos parecem imitar a sala de poções do filme "Shrek" ou tâmaras recheadas com chocolate branco (não sabemos quem inventou, mas foi uma grande ideia).
Mais adiante, no mercado do ouro, um dos maiores do mundo, com 200 lojas, saltam à vista os dourados, em especial do recordista do Guinness World Records, logo à entrada. Chama-se Najmat Taiba e é maior anel de ouro do mundo, com quase 64 quilos e vários outros números que o fazem brilhar: 21 quilates, cinco quilos de diamantes e outras pedras preciosas e 615 cristais Swarovski.
Tão valioso como este anel é o Dubai can em pleno mercado do ouro. O que é isto? Ora, uma iniciativa sustentável que consiste num ponto de refil de água no qual os locais e turistas podem encher gratuitamente as garrafas usadas e assim evitar usar mais plástico (e, diga-se de passagem, poupar algum dinheiro já que cada garrafa de água no Dubai custa perto de 2€).
O Dubai mudou e Sheima é a prova disso
Quando conhecemos Shaima, 26 anos, no Centro para o Entendimento Cultural Sheikh Mohammed (SMCCU), no bairro histórico Al Fahidi, um verso poderoso de uma canção bem conhecida da cantora Beyoncé ecoava na nossa cabeça: "Who run the world? Girls". Ou, no caso, Shaima.
Foi a nossa guia na experiência emirati (que dá a conhecer a gastronomia árabe tradicional dos Emiratos Árabes Unidos), durante a qual nos deixou à vontade para fazer todas as questões sobre a cultura do país, depois de anunciar que o SMCCU é um espaço de mente aberta, onde não há tabus. E Shaima, mestre em engenharia, mostrou que não há mesmo. A jovem teve oportunidades diferentes das que têm muitas mulheres no Dubai, no entanto, é um reflexo de como tudo evoluiu.
Formou-se numa profissão mais associada a homens e optou por trabalhar no SMCCU, ainda que não precisasse porque na cultura muçulmana os homens têm o dever de sustentar a família. E o que é facto é que com este emprego a recém casada e realizada profissionalmente não tem como objetivo alterar isso. É o marido que detém essa função e quando questionada sobre o que faz com o dinheiro que ganha no centro responde entre risos: "Faço o que eu quero". E eis que volta a soar na nossa mente "Who run the world? Girls".
Além do que pensam atualmente as pessoas no Dubai, Shaima mostrou-nos de que se alimenta o corpo nos Emirados Árabes Unidos.
Resumidamente, de coisas deliciosas que completam um prato cheio pousado sobre o colo depois de nos sentarmos em cima de umas confortáveis almofadas perto da comida colocada no chão. Detalhadamente, de opções de carne, como o lamb margooga, uma combinação de frango e vegetais guisados, com pão arábico embebido no molho condimentado, ou sem ela, como o biryani vegetariano, com legumes escondidos no meio de arroz basmati, com um toque açafrão.
Para sobremesa, uma espécie de Dunkin’ Donuts, brincou Shaima, chamados luqaimat. Por outras palavras, são bolinhos que fazem lembrar farturas e, como doce nunca é demais na gastronomia árabe, ainda é possível adicionar xarope de tâmaras.
Numa casa tradicional emirati só tem direito a ficar para uma refeição quem passar ao ritual inicial: o café árabe. É servido sempre antes dos pratos e se o copo for servido numa medida curta, é bem vindo quem o beber e basta levantá-lo de novo para indicar que se quer mais. Já se for servido cheio, "é sinal de que não gostam de vocês e querem que se vão embora", explicou-nos Shaima.
É uma tática subtil a considerar no Ocidente.
A experiência, denominada almoço cultural, custa cerca de 34€ e funciona de segunda-feira a quinta-feira, às 13 horas.
*A MAGG está a viajar a convite do Turismo do Dubai.