Estávamos habituados associar a TAP a viagens com promoções inéditas e novas rotas a nascer todos os anos. Agora, nada é a somar na companhia aérea, que apresenta perdas de 100 milhões de euros por mês. O futuro da TAP continua incerto, mas já foi apresentado um plano de restruturação à Comissão Europeia, em Bruxelas, esta quinta-feira, 11 de dezembro.
Se não for aprovado, pode haver uma liquidação da companhia aérea nacional — o que significa a venda dos ativos da empresa —, cenário que o Governo quer evitar.
O que é certo é que a TAP tem um longo desafio para enfrentar, sem fim à vista. "Temos muitos anos de dificuldades pela frente", admitiu o presidente do conselho de administração da TAP, Miguel Frasquilho, numa entrevista à TVI24.
Apesar de o plano de reestruturação da TAP já ter sido enviado a Bruxelas e apresentado no parlamento na sexta-feira, 12, esta terça-feira, 15, o documento será debatido em parlamento, algo que já era vontade do ministro das Infra-estruturas, Pedro Nuno Santos, antes de o plano seguir para a Comissão Europeia.
Mas como é que a TAP chegou a este ponto de queda vertiginoso? Será tudo fruto da pandemia?
1. A TAP pré e pós-pandemia
A TAP encerrou o ano de 2019 com uma faturação de 3.400 milhões de euros. Já em 2020, prevê-se uma quebra de 70% na faturação da companhia aérea, o que representa apenas mil milhões de euros, uma perda de 2.300 milhões de euros.
Contudo, mesmo antes da pandemia, a TAP somou dois anos consecutivos de prejuízos. Só em 2019 foram mais de 100 milhões de euros. Já depois da pandemia, a companhia aérea tem vindo a cair a pique, perdendo 100 milhões de euros por mês.
E afinal, de quem é a TAP? Ora, antes da pandemia, 50% do capital era do Estado, mas, entretanto, para viabilizar a empresa, o Estado já detém 72,5% do capital, após comprar a posição de David Neeleman e da Azul. E onde ficam os restantes 27,5%? Uma parte, 22,5%, está nas mãos do português Humberto Pedroso e 5% pertence aos trabalhadores.
2. As incongruências
Depois de o governo apresentar o plano de restruturação, o Sindicato dos Pilotos de Aviação Civil (SPAC) reagiu a alguns dos dados apresentados pelo ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos. Um deles diz que a TAP tem mais 19% de pilotos por aeronave do que “praticamente todos os concorrentes”, bem como mais 28% de tripulantes.
Já o SPAC aponta que estes dados não estão corretos e tem como provar. "Há uma grande campanha de desinformação relativamente aos pilotos e atacando a dignidade dos pilotos. Chegámos ao ponto em que começou a ser atacada a dignidade humana e laboral dos pilotos”, afirmou Alfredo Mendonça, em conferência de imprensa na sede do SPAC, em Lisboa. Em que é que ficamos? Na incerteza.
3. O que acontecia se a TAP desaparecesse?
Essencialmente, perder a TAP representaria uma perda para economia nacional, de acordo com a análise do ministro da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira. "A TAP contribui muito para a economia nacional e para o emprego qualificado em toda a cadeia de valor”, disse o ministro, fazendo ainda uma comparação: “Deixar desaparecer a TAP era como deixar desaparecer a Autoeuropa ou pior”.
Só no ano passado, a companhia aérea nacional faturou 3.400 milhões de euros (ao passo que a Autoeuropa arrecadou 3.700 milhões de euros), fez compras a 1.700 empresas portuguesas e é “uma das maiores exportadoras nacionais”, disse.
Por isso, e para que a companhia aérea não caia na liquidação — uma das hipóteses em cima da mesa caso o plano de restruturação não seja aceite em Bruxelas —, o plano é, segundo o presidente do Conselho de Administração da companhia aérea, Miguel Frasquilho, a única solução para garantir "a sobrevivência da TAP e salvar sete mil postos de trabalho".
4. A possível solução nas mãos de Bruxelas
A proposta apresentada pelo governo à Comissão Europeia está agora em análise e prevê vários cortes na empresa. Desde logo, sugere um despedimento máximo de 2 mil trabalhadores, entre os quais estão 500 pilotos, 750 tripulantes de cabine e 750 trabalhadores de terra. Contudo, segundo o ministro das Infraestruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos, há uma forma de minimizar este número, através de "um conjunto de medidas voluntárias" relativas a 'part-time', mútuo acordo, reformas antecipadas e licenças sem vencimento, diz o ministro.
Além de despedimentos, a proposta inclui cortes salariais. "Até 900 euros não se aplicam cortes e, a partir daí, é aplicada uma taxa de 25% à parte acima dos 900 euros. Isto é, um trabalhador que ganhe mil euros tem um corte de 25% sobre 100 euros, a que corresponde uma redução de 2,5%. Depois progressivamente à medida que o nível salarial vai aumentando, o corte salarial vai-se aproximando dos 25%", explicou Pedro Nuno Santos.
Assim, os salários que em 2019 representavam custos de 750 milhões de euros para a TAP, em 2021 prevê-se que passem para 400 milhões de euros. Se haveria alternativa aos cortes salariais? Bem, a sugestão do ministro seria a de uma injeção de "pelo menos mais 1,4 mil milhões de euros em dinheiro público".
O plano de restruturação prevê ainda a suspensão dos acordos de empresa, medida fundamental segundo Pedro Nuno Santos, mas excecional aos olhos do jornalista Pedro Santos Guerreiro, que analisou a situação da TAP na TVI.
"Nenhuma empresa pode fazer aquilo que a TAP vai fazer, se o plano for aprovado, que é recorrer a uma lei de 1977, que não é usada há quase 30 anos e permite fazer o que a lei geral não permite. Que é cortar salários base, rasgar os acordos de empresa todos. E através desta lei, não só se consegue cortar salários base, fazer despedimentos coletivos, muito acima da cota que a lei geral prevê para as empresas", disse Pedro Santos Guerreiro.
Mas a situação da TAP exige estas medidas e muitas mais. A proposta fala ainda de um apoio financeiro entre 3.414 milhões de euros e 3.725 milhões de euros até 2024, uma vez que no ano seguinte, estima o ministro das Infraestruturas e Habitação, a TAP já estará em condições para começar a devolver os apoios.
Por último, a restruturação sugere ainda uma redução da frota, de 108 para 88 aviões. Ainda assim, Pedro Nuno Santos diz que "a prazo" o objetivo é "manter as rotas" existentes.
Perante todas estas medidas, o presidente do conselho de administração da TAP, Miguel Frasquilho, reconhece: "Sabemos que a retoma e a recuperação serão muito lentas. Temos muitos anos de dificuldades pela frente", disse numa entrevista à TVI24.