Harvey Weinstein, magnata e ex-produtor de cinema em Hollywood, foi condenado por dois dos cinco crimes de que era acusado — ato sexual criminal em primeiro grau envolvendo Miriam Haley, e de violação em terceiro grau, envolvendo outra mulher. A decisão foi tomada na segunda-feira, 23 de fevereiro, depois de o júri ter estado perto de 30 horas a deliberar. O produtor enfrenta uma pena que pode ir dos cinco aos 25 anos de prisão, tendo livrado-se da possibilidade de cumprir perpétua ao ser sido ilibado do crime de comportamento sexual predatório, a acusação mais grave que enfrentava.
Tendo sido fundamental para o crescimento do movimento #MeToo, a polémica em torno de Weinstein começa a 5 de outubro de 2017, quando o “The New York Times” publica uma investigação em que são denunciados os comportamentos de assédio e agressão sexual do então produtor, decorridos ao longo de três décadas. As atrizes Rose McGowan e Ahsley Judd foram as vítimas e denunciantes mais conhecidas. Mas seguiram-se muitas outras: Gyneth Paltrow, Angelina Jolie, Rosanna Arquette, Lucia Evans, Annabella Sciorra ou a italiana Asia Argento foram nomes que fizeram parte de uma lista com centenas de relatos de diferentes mulheres.
Sexo oral forçado, invasão de propriedade e violação estão entre as situações descritas pelas mulheres. Muitas não puderam fazer denúncia porque os casos já haviam prescrito. Outras histórias caíram por terra por acordos que o produtor fez com as mulheres, trocando silêncio por dinheiro.
Ainda assim, a 25 de maio de 2018, o magnata é acusado formalmente pelo Estado americano de Nova Iorque pelo crime de assédio em primeiro e terceiro grau, em situações relacionadas com duas mulheres. No início do julgamento, a 6 de janeiro, o homem — que sempre afirmou ser inocente, alegando que todos aqueles atos haviam sido consentidos — era acusado por cinco crimes sexuais, cometidos entre 2006 e 2013.
Annabella Sciorra, Miriam Haley, Jessica Mann, Dawn Dunning e Lauren Young foram as seis mulheres que testemunharam frente ao juiz, no julgamento decorreu em Manhattan. Desde o dia um, diz a revista “Vulture”, o julgamento foi marcado por uma série de declarações chocantes, assim como reviravoltas surpreendentes. Vejamos algumas.
Gigi Hadid podia ter sido membro do júri
A supermodelo Gigi Hadid apareceu no tribunal a 13 de janeiro, como potencial membro do júri no julgamento do ex-produtor, num grupo de 120 pessoas. No momento em que o juiz James Burke pergunta se alguém, entre aquelas pessoas, conhecia pessoas presentes na sala de tribunal, Hadid foi uma das que levantou o braço. “Eu conheço o réu”, disse a supermodelo. Quando o juiz lhe pergunta se ela conseguiria ser imparcial durante o processo, ela afirma que sim.
Ainda assim, acabou por ser dispensada dias depois. É que, de seguida, foram mencionadas as testemunhas — entre as quais Salma Hayek, Charlize Theron e Rosie Perez — e Hadid, novamente, ergueu o braço para revelar que conhecia Hayek.
Uma testemunha alegou que Weinstein ofereceu trabalho em troca de um ménage à trois
A antiga atriz Dawn Dunning testemunhou contra o produtor e acusou-o de ter tocado nos seus genitais sem consentimento durante uma reunião de negócios. A mesma mulher alegou que o homem terá oferecido trabalho em troca de um ménage à trois, cerca de um mês depois do primeiro episódio.
“Ela pediu que me encontrasse com ele num hotel”, relatou, referindo-se à assistente de Harvey Weinstein. Quando chegou ao local, a mesma assistente sugeriu que subissem para ir ao encontro do produtor. “[Weinstein] abriu a porta e estava de roupão de hotel vestido e aberto”, contou a ex-atriz. “Ele foi direto ao assunto e disse: ‘Aqui estão os papéis para os meus próximos três filmes. Eu assino hoje se fizeres um ménage à trois comigo e com a minha assistente.”
A ex-atriz relatou que se riu, porque achava que o homem não estava a falar a sério. Ele terá respondido: "Nunca vais vingar neste negócio. É assim que a indústria funciona.” Dunning disse ainda que, nesta tentativa de ménage à trois, o produtor referiu os nomes de Salma Hayek e Charlize Theron.
Uma das vítimas disse que Weinstein não tem testículos
Jessica Mann acusou o homem de vários ataques sexuais — incluindo sexo oral forçado, do qual não acusado — e descreveu pormenorizadamente a anatomia do homem. “A primeira vez que o vi totalmente nu achei que era deformado e intersexo [pessoas que nascem com anatomia sexual e reprodutiva que não se encaixa na definição típica do sexo masculino ou feminino]”, disse.
“Ele tem uma cicatriz extrema, talvez tenha sido vítima de queimadura [...] Parece que não tem testículos e parece que tem uma vagina”. Mann recordou ainda um episódio em que o magnata urinou em cima dela e falou de uma descoberta que fez após o alegado primeiro ataque sexual, quando se fechou na casa de banho para se recompor. “Vi uma agulha no lixo e passei-me. Agarrei nela e olhei para ela. Lembro-me mais ou menos do nome, porque quis ir logo pesquisar ao Google. Não sei qual é o termo médico correto, mas lembro-me que implicava qualquer coisa relacionada com pénis morto.”
Os jurados viram uma fotografia de Weinstein nu — e ficaram chocados
Foi a 4 de fevereiro que os procuradores do processo mostraram cinco imagens do produtor às cinco mulheres e sete homens do júri. Numa ele estava nu. Segundo a procuradora Joan Illuzzi, apesar de não ser prática comum humilhar o réu, era essencial mostrar as fotografias ao painel de jurados. Estas não foram adicionadas às provas, portanto não foram tornadas públicas. Mas o conteúdo foi registado pelos elementos que retratam em desenho o julgamento — que apanharam um membro do júri a arregalar os olhos e duas mulheres com um ar desconfortável.
Uma das vítimas terá desenhado o pénis de Weinstein à polícia
Laura Young terá sido mais uma das vítimas do produtor e foi uma das testemunhas em tribunal. Weinstein terá apalpado o seu peito, depois de a prender na casa de banho de um hotel em Beverly Hills, enquanto se masturbava.
Recordou que, após uma agressão sexual do homem, desenhou-o à polícia. Corroborou a descrição de Mann: descreveu o seu pénis tendo um “aspeto nojento”, dizendo que parecia que tinha sofrido um corte, que nada se assemelhava ao que é fruto da circunscrição.
Weinstein é acusado em Los Angeles pela agressão a Laura Young, bem como pela violação de outra mulher.
Um amigo de Weinstein disse que o produtor era viciado em sexo
Era uma das testemunhas que iria ajudar no caso, mas acabou por acontecer o contrário. Ao ser chamado a testemunhar a favor de Weinstein, o produtor Paul Feldsher acabou por afirmar que Harvey era “viciado em sexo”. Foi Joan Illuzzi que dirigiu o interrogatório e confrontou-o com mensagens trocadas entre os dois amigos.
“Você diz: ‘Provavelmente há um monte de verdades nas alegações de que te comportaste como um mulherengo”, disse a procuradora. "'O teu apetite pelas coisas que desejas — um guião, um filme e, sim, uma miúda — são, no mínimo, vorazes'.”
Quando interrogado sobre o significado daquela mensagem, Feldsher disse: “Era do meu conhecimento de que, há muito tempo, o Harvey tinha um problema de adição com sexo e que namorava muitas mulheres.”
O especialista em memória de Weinstein teve problemas para explicar o cérebro humano
Mais uma testemunha para a defesa do produtor que correu mal. Elizabeth Loftus, psicóloga cognitiva, especialista em memória — a mesmo que trabalhou nos casos de O.J. Simpson, Michael Jackson ou Ted Bundy — teve problemas em explicar o funcionamento do cérebro humano.
À advogada de defesa de Weinstein disse que “informações pós-evento”, assim como informações mediáticas, eram capazes de corromper as memórias das pessoas, tentando mostrar que os relatos das vítimas corriam o risco de não serem fieis à realidade. Mas quando questionada pela acusação, que lhe solicitou que discutisse um diagrama do cérebro, a mulher respondeu que aquele tema não se enquadrava na sua “área de especialização”: “Não sou especialista em regiões do cérebro."