Desde que Donald Trump anunciou aos EUA, e ao mundo, que tinha sido infetado pela COVID-19, seguiu-se um período de dúvida e incerteza que ainda dura. No fundo, faltava uma resposta concreta à pergunta: "Afinal, qual o estado clínico do presidente dos EUA?". As dúvidas foram adensando-se à medida que, no dia seguinte à confirmação de infeção, Trump deixou passar 16 horas desde o último tweet até voltar a escrever na rede social predileta já hospitalizado.

Depois disso, publicou dois vídeos. No primeiro, disse estar a sentir-se melhor; no segundo, admitiu ter aprendido "muitas coisas novas" sobre a doença para, momentos depois, quebrar o isolamento e pôr-se no carro, juntamente com vários agentes dos Serviços Secretos, para acenar ao seus eleitores.

Desde quinta-feira, 1 de outubro, até à data da publicação deste artigo passaram cinco dias e durante este período a Casa Branca insistiu na tese de que o presidente dos EUA se encontrava "estável e de saúde", mesmo que fontes próximas e conhecedoras da situação desmentissem a afirmação.

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Atualmente, sabe-se, não oficialmente, claro, que os níveis de oxigénio no sangue de Donald Trump sofreram uma quebra por duas vezes seguidas e que esta semana será crucial para perceber, exatamente, como está a evoluir.

Mas só este detalhe é suficiente para concluir que os pulmões de Trump foram arduamente afetados, tratando-se de um sintoma registado em pacientes mais atacados pelo novo coronavírus.

A quebra dos níveis de oxigénio como forte indício de agravamento

Mais: a equipa médica responsável pelo acompanhamento do caso, revelou à imprensa que o presidente estava tomar um esteroide agressivo conhecido por causar a morte de vários pacientes infetados pela COVID-19. O uso do esteroide, por isso, está limitado apenas àqueles que apresentarem um quadro clínico muito reservado, escreve o jornal americano "The New York Times".

Mas porque, até agora, a Casa Branca não tem sido transparente quanto à evolução do estado de Trump, não se sabe exatamente o contexto que terá levado à administração do esteroide. Será que foi por que, de facto, o estado de saúde de Donald Trump se deteriorou de forma repentina ou por precaução? Esta, como várias outras perguntas, continuam sem resposta.

"O esteróide que lhe estão a dar é o mais difícil de desmistificar", começa por dizer Thomas McGinn, o médico responsável do hospital Nortwell Health, considerado o maior prestador de cuidados de saúde em Nova Iorque, ao mesmo jornal.

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A explicação, diz, tem que ver com o facto de esta droga só ser usada em pacientes cujo estado de saúde deteriore rapidamente. "De repente, estão a atirar com tudo para cima e isso faz levantar a questão: Será que ele está mais doente do que sabemos ou estão os médicos que o acompanham a ser demasiado agressivos porque ele é o presidente dos EUA?", questiona.

O síndrome de V.I.P

Porém, há especialistas que não negam a possibilidade de ser o próprio presidente a decidir o rumo do seu tratamento. Quem o diz é Celine Gounder, professora de Medicina e especialista em Doenças Infecciosas na Escola de Medicina de Grossman, nos EUA, à mesma publicação, que diz haver um nome para identificar essa abordagem: o síndrome de V.I.P.

"Achas que estás a ajudar, mas na verdade não estás porque estamos a lidar com um doença sobre a qual temos poucos dados", o que faz com que não seja possível dizer, com toda a certeza, de que um determinado método experimental é 100% correto.

Mas atendendo aos sintomas registados e comunicados pela equipa médica de Trump à imprensa, a especialista diz que o mais certo é tratar-se de um agravamento considerável da doença. Para traçar este cenário, Gounder centra-se na informação de que os níveis de oxigénio no sangue sofreram duas quebras num curto período de tempo.

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O facto de Donald Trump ter sido obrigado a um reforço de oxigénio e estar agora a tomar o esteroide agressivo contrasta com o prognóstico positivo que tem vindo a ser pintado pela sua equipa de comunicação, adianta o "The New York Times". "Seria muito útil sabermos, exatamente, de quando oxigénio é que o presidente precisou e durante quanto tempo", diz Rajesh Gandhi, especialista em doenças infecciosas do hospital de Massachusetts. Essa informação, no entanto, nunca foi revelada.

Quanto ao que poderá acontecer a partir daqui, os especialistas não têm dúvidas de que há uma grande probabilidade de Donald Trump ter alta médica ainda esta segunda-feira, 5 de outubro, uma atitude que não compreendem.

"Se é começado um tratamento através da administração de esteroides porque os níveis de oxigénio estão a baixar, isso significa que é importante estar-se vigilante e ter alguém a monitorizar. Se havia a preocupação de não haver equipamento especializado na Casa Branca para fazer essa monitorização, quando os níveis de oxigénio ainda estavam elevados, então é importante estar-se vigilante agora", defende Sam Parnia, médico e professor de Medicina na Universidade de Nova Iorque, que há contactou com vários doentes infetados por COVID-19.