Elizabeth Saraiva tem 50 anos, foi descrita em tribunal como uma mulher bem falante, bonita, sedutora e confiante. Foi com estes atributos que, ao longo de 11 anos, entre 2000 e 2011, levou a cabo os seus esquemas para conseguir burlar nove homens, muitos com os quais mantinha uma relação amorosa. Em 2016 foi condenada a 12 anos e 4 meses de prisão, não tendo até hoje cumprido um dia desta pena.

Entre as suas vítimas contam-se seis empresários, dois agentes bancários e um agente da Polícia Marítima, os quais usou para acumular mais de um milhão de euros.  A burlona do amor, como ficou conhecida, vivia por esta altura, numa casa de família, na Quinta do Bonfim, tendo, depois da acusação, viajado para Albufeira, com obrigação de apresentações periódicas na GNR de Vilamoura, às quais já faltou algumas vezes.

Durante os anos em que cometia as burlas, agia sempre de forma semelhante, usando dois esquemas (que podiam coexistir): apresentando-se como uma mulher de negócios, pedia emprestadas quantias avultadas de dinheiro para investir em construções, dando como garantia a quantia milionária que iria receber da África do Sul, de heranças ou de patentes de invenções do seu pai, que entretanto também foi constituído arguido no processo por conivência e com quem a mulher manteve até 2006 um negócio de produção e distribuição de flores, plantas, sementes para exportação e importação, que, entretanto, acabou por correu mal, deixando os dois no desemprego.

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Elizabeth Saraiva também fingia ser dona de terrenos que, supostamente, iria vender a preços convidativos, abaixo do mercado. Resultado: recebia os pagamentos adiantados, para depois desaparecer com o dinheiro. Foi o caso de um dos queixosos, Carlos, um diretor comercial, diz o "Diário de Notícias": Elizabeth foi-lhe apresentada por via de um agente bancário como dona de vários imóveis, incluindo nas quintas dos Picheleiros e do Mocho, na zona de Setúbal, aqueles que lhe propôs a compra. Carlos pagou meio milhão de euros.

A mulher garantiu-lhe que lhe devolveria o dinheiro investido assim que recebesse os 15 milhões do governo da África do Sul, referentes a supostas patentes de invenções de Angelino Saraiva, seu pai, que Elizabeth dizia ser autor de rodas de camiões, desentupidores de esgotos e comedouros para aves. O homem entretanto também foi constituído arguido por ter, alegadamente, ajudado a filha a cometer alguns destes crimes. Carlos nunca viu o seu terreno.

No concerto de AC/DC, em 2009, a mulher encontrou outro alvo: um empresário de construção civil de Palmela, com quem manteve uma relação amorosa durante mais de um ano. Convenceu-o a dar-lhe 140 mil euros, valor que seria utilizado para a construção de uma urbanização na Quinta do Mocho e uma casa em Tróia, mesmo existindo impedimentos da câmara, que a mulher dizia que conseguia contornar por manter relações influentes com pessoas da autarquia. Novamente, Elizabeth conseguiu persuadi-lo falando-lhe em dinheiros que deveria receber da África do Sul, desta vez relacionados com propriedades e maquinaria. O pai confirmou a sua história. Só que um dia Elizabeth deixou de dormir em sua casa e deixou de atender o telefone. Desapareceu.

Além disso, havia um quiosque que a ajudava a executar as suas burlas: conseguiu a confiança dos donos, que lhe trocavam num banco os cheques que as vítimas lhe davam. O objetivo era evitar a instituição financeira e questões que pudessem levantar suspeitas.

Depois de a Polícia Judiciária ter começado a investigá-la, acabou por ser acusada pelo Ministério Público, indicada por nove burlas, quinze falsificações e dois furtos. Depois de ouvidas 26 testemunhas, em abril de 2016, o tribunal de Setúbal acabou por condená-la a uma pena de 12 anos e quatro meses de prisão, pena que Elizabeth ainda não cumpriu.

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Depois da condenação, recorreu da sentença no Tribunal da Relação de  Évora, evitando prisão imediata. Prolongou assim o seu tempo em liberdade, já que o caso ficou aqui parado durante dois anos. Só em 2019 é que o tribunal confirmou a pena de 12 anos e quatro meses de prisão.

Elizabeth Saraiva não se resignou. No mesmo ano, recorreu ao Supremo Tribunal de Justiça e conseguiu que lhe reduzissem a pena para dez anos. Com a prisão à vista, ainda não é desta. O caso segue agora para o último sítio possível: para o Tribunal Constitucional, medida que serve "para ganhar tempo", diz o "Correio da Manhã". O objetivo é que o crime prescreva.

Elizabeth Saraiva nunca indemnizou nenhuma das vítimas, nunca se mostrou arrependida ou admitiu o crime. Pelo contrário: dizia que era uma vítima.