Um casal “jovem e trabalhador”. É assim que ao "El Mundo" e, com muito afeto, os vizinhos, descrevem José Rocío e Victoria María García, os pais de Yulen, a criança de 2 anos que, há mais de 40 horas, caiu num poço na serra de Totalán, em Málaga, junto à necrópole da Tumba Del Moro. “Isto é demais para eles”, acrescentam, numa alusão à tragédia de 2017, que levou a vida ao primeiro filho, de 3 anos. O incidente de 2019 ocorreu no domingo, 13 de janeiro, e desde então que várias equipas têm estado concentradas no difícil resgate do menino, que envolve mais de 100 pessoas.

Natural de Málaga, a mãe é trabalhadora numa empresa de hambúrgueres. De acordo com a sua página de Facebook, estudou nas Escolas Profissionais da Sagrada Família, “um centro educativo de ideologia católica”, constituído por 28 centros distribuídos pelas oito províncias da Andaluzia.

A escola que Vicky (alcunha pela qual é conhecida) frequentou localiza-se no bairro de El Palo, no distrito Este de Málaga, na zona de Playa Virginia, o mesmo onde vive com o marido José, natural da mesma cidade, comerciante, atualmente desempregado, segundo o “El Mundo”. A casa onde habitam fica numa zona de moradias — são as chamadas vivendas protegidas —, onde são "bem conhecidos" entre a comunidade, avança o "El Pais". De acordo com o "Observador", a imprensa espanhola já os apelidou “família amaldiçoada”, depois de, a 23 de abril de 2017, o filho Óliver, que teria na altura 3 anos, ter sido vítima de um enfarte fulminante, que lhe terá tirado a vida 20 dias depois.

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Os vizinhos, que têm estado a apoiar e a acompanhar o caso de perto, dizem que a primeira tragédia mudou a vida deste casal, que até então vivia dias calmos e tranquilos, dedicados à família. A 21 de maio do mesmo ano, Vicky fez uma publicação na sua página de Facebook, com uma imagem de Nossa Senhora com o menino ao colo, que dá conta do seu sofrimento. Na legenda, pode ler-se: “E ela dança na porta da minha casa, abençoando cada um dos meus cantinhos, ao ritmo da banda ... mas hoje El Palo chorou, chorou sem parar, com raiva e dor, com um aperto descontrolado, todos unidos com o mesmo sentimento ..... todos sofrendo a perda do nosso pequeno Óliver. Não é justo ter que passar por isto, tente libertar-nos de situações como esta. Toda a minha vida, pelo menos na minha, vou lembrar-me de ti.

A imagem e mensagem publicadas no Facebook de Vicky.

No mesmo dia, e agora com uma imagem do marido com Óliver ao colo, escreveu: “Amo-te, onde quer que estejas.” A 5 de junho de 2017, voltou a homenagear o filho, com uma fotografia do próprio. Na legenda lê-se: “Óliver amo-te onde quer que estejas. És tudo para mim. Preciso dos teus beijos, dos teus abraços, da tua companhia, do teu carinho. O que eu digo é pouco. Quero fechar os olhos e ver o teu sorriso. Sinto a tua falta meu menino. Amo-te.”

De acordo com o relato dos vizinhos ao jornal espanhol “El Confidential”, passear ao ar livre sempre foi um hábito valorizado por esta família. “Eles costumavam aproveitar a curta distância entre El Palo e Totalán (cerca de 20 minutos de carro) para irem para o campo. Lá, os filhos corriam livremente e sentiam-se confortáveis, respirando o ar puro."

O gosto manteve-se, mesmo após a morte do primeiro filho, tanto que o contexto em que a queda do menino de 2 anos no poço se deu foi precisamente esse: Vicky, José e Yulen encontravam-se com outros familiares a desfrutarem de um dia no campo, no Cerro de la Corona, em Totalán. Só que aconteceu o inesperado: "Ninguém poderia adivinhar que o domingo iria transformar-se num pesadelo após a queda do pequeno", comentou a mesma fonte.

O “El Mundo” corrobora a ideia que traduz esta filosofia de vida. “O seu sítio para brincar era a rua pedestre”, pode ler-se, numa alusão a Yulen. O rapaz, que era um dos mais novos do bairro, é descrito como um miúdo muito ativo, que estava sempre a brincar com as outras crianças. É apaixonado por bolas de futebol e pelo seu triciclo verde, sempre estacionado à porta de casa, onde ainda permanece, junto de todos os familiares que marcam presença para apoiar Vicky e José.

O casal vive na rua Padre Coloma, uma das que, segundo reporta o “Diario Sur”, se tornaram “mudas” devido à tragédia. Este jornal conta que o bairro “conserva uma filosofia de vida tranquila”, tanto que um dos membros da Associação de Vizinhos do Bairro relata que funciona como se fosse uma pequena comunidade. Este sentimento de união reflete-se na angústia e no cansaço que se sente no ar, desde que as buscas começaram na Serra de Totalán, reporta o mesmo jornal.

A vizinhança tem demonstrado o apoio e afeto ao jovem casal, que deverá ter idades compreendidas na casa dos 30 anos. “A irmandade da Nossa Senhora do Rosário, padroeira do bairro, emitiu uma declaração de solidariedade: ‘Oramos a Nossa Senhora do Rosário, esperançosos num bom desfecho para o pequeno vizinho de El Palo desaparecido em Totalán. Ela é a luz do sustento para aqueles que se esforçam para encontrá-lo e levá-lo à família'”. O “Diario Sur” também escreve que as visitas com mantimentos à zona das operações de resgate têm sido constantes.

O casal com os dois filhos, antes da morte de Óliver.

A ligação a Reme, a avó materna, é grande. No Facebook, e no dia da tragédia, esta mulher, que vive junto à serra onde Yulen desapareceu, escreveu para Óliver, o falecido irmão. “Hoje só te peço que o teu irmão saia de lá. Ele precisa de ti.”

Entretanto, esta terça-feira, 15 de janeiro, José, o pai de Yulen, falou no “El Programa de Ana Rosa”, da Telecinco: “Sabem o que é estar há 30 horas à espera que tirem o teu filho de um poço? Acreditam que esta (segunda-feira de) manhã, às 11h00 (hora local), sabia-se que vinha um camião de Cádiz para tirar a terra e estão à espera que chegue o camião para preparar as coisas?”.

O pai critica os esforços que têm estado a ser feitos nas operações de resgate e fala diretamente aos jornalistas: “Não escrevam que está a vir o presidente da câmara nem ninguém, escrevam o que estão a fazer aqui, que não estão a fazer nada de nada, que há 30 horas que um menino está dentro de um poço. Estamos a morrer!

Yulen está desaparecido desde domingo, 13 de janeiro. Já passaram mais de 40 horas. Os pais garantem que ouviram o choro do menino, mas a equipa de resgate não escutou sinais da criança, apesar de já estar uma câmara robotizada com luz própria no buraco.