Num jogo alucinante, a seleção nacional de futsal virou o resultado contra a Rússia e acabou por se sagrar vencedora da final do Europeu de 2022, revalidando o título de 2018. E no rescaldo desta grande vitória, um cartaz de um adepto português chamou a atenção das objetivas fotográficas. "Bagaço >[maior do que] Vodka", foi esta a mensagem que já correu as redes sociais desde este domingo, 6 de fevereiro, numa clara alusão às bebidas típicas dos dois países.
No campo, a seleção do bagaço foi claramente superior à equipa da vodka, mas o que torna esta bebida portuguesa tão especial, sendo que o elevado teor alcoólico — a maioria dos bagaços rondam os 40% de álcool, mas existem propostas a chegar aos 50% — a faz por vezes difícil de ingerir de um trago para muitas pessoas?
Em primeiro lugar, importa definir o que é o bagaço. "O bagaço é gíria para aguardente bagaceira que, por sua vez, é diferente de aguardente vínica", explica-nos Marc Pinto, sommelier do Fifty Seconds Martin Berasategui (o deslumbrante restaurante no topo da Torre Vasco da Gama, em Lisboa, que a MAGG já visitou aqui). "O que as torna diferentes é a base a partir da qual estas duas aguardentes são feitas: a vínica é feita com vinho, a bagaceira — ou bagaço — é feita com o bagaço que sobra depois da fermentação do vinho e da prensagem das uvas. É com estas sobras que se faz o que conhecemos, na linguagem coloquial, como bagaço."
Marc Pinto reforça que a aguardente vínica é vista como um produto superior, mas considera que isso apenas acontece devido às diferentes exigências no que diz respeito às duas bebidas. "A vínica é vista como mais requintada porque, a nível técnico, é-se mais exigente com esta aguardente. Se, em Portugal, fossemos igualmente exigentes com a bagaceira, acredito que também conseguíamos fazer um produto de maior qualidade."
É que, e tal como o sommelier explica, para o fabrico das aguardentes bagaceiras usa-se "o bagaço que sobra, não há uma preocupação nem o escrutínio com o aroma, por exemplo, que existe com a aguardente vínica".
E que tal transformar uma caipirinha brasileira num cocktail à portuguesa?
Apesar de o bagaço ser uma bebida muito associada à digestão — "costuma-se dizer, na gíria, que ajuda a digerir a comida", recorda Marc Pinto —, a verdade é que não é muito fácil beber um cálice deste líquido extremamente alcoólico por si só.
A solução? Porque não apostar nos cocktails? "A aguardente bagaceira podia funcionar perfeitamente como uma substituta da cachaça numa caipirinha, não ficaria nada atrás. Da mesma forma, também podia resultar numa margarita ou num Tequila Sunrise, no lugar da tequila. Nos três casos, teria de se alterar ligeiramente as receitas para obter sabores mais equilibrados. Mas se o bagaço for bom, é super aromático, por isso é bem possível que resultasse nestes cocktails", refere o sommelier.
Apesar de Marc Pinto admitir que nunca tentou uma harmonização com uma aguardente bagaceira nacional, refere que já tentou unir uma bebida semelhante, proveniente de Itália, com determinado tipo de sobremesas. "O bagaço, devido ao seu alto componente alcoólico, pode ajudar na harmonização com ingredientes mais intensos, como o chocolate, por exemplo."