Se a Santa Muerte não fosse apenas uma obra do artista Utopia e realmente nos revelasse o que vai na bola de cristal representada num espelho, que ao mesmo tempo permite retificar o look para jantar fora no El Santo, na zona do Príncipe Real, em Lisboa, esta seria a previsão do futuro: uma noite animada, bem guarnecida e regada, assim como apimentada.
Tudo isto define o novo El Santo, a nova atração de Lisboa para os portugueses e turistas, dado que esta é uma zona onde muitos deles passam para comer algo antes das saídas à noite no Bairro Alto. Mas atenção: não pense que lá pelo restaurante estar próximo da festa, que é dado a comidas para mastigar rapidamente, ao mesmo tempo que desaparecem margaritas do copo.
Refeição santa é aquela que se prova com calma, tal como fizemos no El Santo, irmão do Ni Michi, no LX Factory. A diferença entre os dois? O ambiente, dado que no novo sente-se mais a preparação para uma noite animada, principalmente numa sexta-feira, dia em que visitámos o restaurante, e a oferta de cocktails, entre eles um picante, a fazer match com a comida.
Ir a um restaurante de comida mexicana e não gostar de picante não é uma missão impossível, até porque opções sem fazer saltar a língua não faltam no El Santo, mas a experiência fica aquém. Como somos destemidos (e um quanto masoquistas), quando nos apresentaram os cocktails de assinatura não hesitámos na escolha assim que ouvimos a palavra picante na descrição do cocktail bomba de humo, com Mezcal Meteoro, Ancho Reyes e Cerveja Malquerida (10€).
É assim, como o nome indica, uma bomba de sabores, uma bomba de cores e uma pitada de picante — é que aqui temos de ser sinceros: se fosse mais um bocadinho, não nos importávamos nada.
Para a mesa, desta vez e como poucas vezes acontece quando vamos a um mexicano, não vieram as nossas amadas margaritas, mas valeu a pena deixá-las de lado uma noite para provar uma outra versão de margarita: a gingerita, com gengibre e alecrim (9€). Estes ingredientes tornam-na mais suave e aromática, fazendo com que se beba tão bem que é preciso ter cuidado com o ritmo (para guardar alguma bebida para acompanhar as entradas, é claro).
Mais pão para a mesa, por favor
Sabem os nossos camarões à guilho? Bem, no El Santo, obviamente, não existem, mas há uma versão à moda do México. São os camarões el santo, com molho de chilli ancho e tequila reposado (13,50€), que vêm acompanhados de tortilhas. Este é prato para atacar a qualquer hora do dia e merecem uma visita ao El Santo só mesmo para o provar este prato de tão delicioso que é o molho. Sim, o molho.
Os camarões estavam maravilhosos, mas o molho aveludado e ligeiramente doce é a cereja na base destes camarões, que vêm com apenas três pedaços de tortilha para uma mesa de bocas portuguesas habituadas a ensopar pão em tudo o que é molho.
Pensámos em pedir mais, é preciso confessar, mas uma mesa farta esperava-nos, pelo que pousámos os talheres à espera do próximo.
Fugimos de seguida para o Peru, que serviu de inspiração ao ceviche aguachile de sinaloa (14€), com peixe branco e molho picante aromatizado com lima e ananás — ora aqui está de volta o ponto forte de um restaurante mexicano — e um milho peruano chamado choclo, de maior dimensão e mais crocante do que o amarelo que todos conhecemos.
Íamos ficar por aqui, mas estávamos a sentir falta de um básico mexicano. Uns nachos, uns tacos, umas quesadillas... Ora bem, foram estas mesmo que decidimos atacar e não nos arrependemos. Pedimos as vegetarianas, com tomate, maionese de abacate e, *alerta, amantes de queijo*, creme de queijo derretido (8,50€).
Depois disto, quantas Avé Marias são?
Se há coisa que os mexicanos não precisam é de boas facas
Finalmente, os principais, e não é por acaso que têm este nome. Principal remete-nos para algo de maior importância, pelo que o El Santo não descura esse valor na secção dos pratos fortes, preparados pela chef Rebeca Pinheiro.
Pedimos três, dois de carne e um de peixe, e há um adjetivo que é comum a todos: macio. Quer a carne das bochechas de porco preto confitadas lentamente (eis o segredo) em adobo de achiote e laranja (16,90€), quer o lombo de novilho selado e servido com molho mexicano com 53 especiarias (24€), ou ainda o polvo confitado em sumo de laranja, pimentos e lima (21€), são extremamente tenros.
Principalmente as bochechas de novilho, acompanhadas de arroz mexicano, quase dispensam uma faca para cortar e o mesmo se pode dizer do polvo cujos tentáculos se apanham tão facilmente quanto o puré de batata doce roxa (muito usada no México) que o acompanha.
Depois de três entradas, três pratos e cocktails, precisámos de uns minutos para apreciar as músicas latinas, assim como a arte e decoração do restaurante — que inclui o painel Santa Muerte (figura sagrada venerada no México) do artista Utopia, as favelas mexicanas e o espelho da casa de banho em forma redonda, com uma coroa de flores em cima para que nos vejamos como a Frida Kahlo, trabalho da decoradora Camila Marques — e ganhar espaço para a sobremesa.
Não repetimos o número três, veio apenas uma e mais leve para balançar a grande oferta do El Santo. Escolhemos a tartelete de lima cremosa (5,50€), bastante fresca, mas ficámos de olho na tartelete de caramelo salgado sobre a qual ouvimos largos elogios (5,50€).
Fica para a próxima, quando o Santo se alinhar com a vontade de comer mexicano.