Não sei se foi da vista para a ponte de Dom Luís I, se do fim de tarde ameno no Cais da Ribeira, se do vinho, mas ficámos com uma crush gastronómica pelo chef Rafel Gomes. Fomos visitar o Terra Nova meio a medo, porque desconfiamos sempre de restaurantes situados em zonas tipicamente turísticas, mas ficámos mesmo surpreendidos pela inteligente combinação de produtos tipicamente portugueses com técnicas e produtos da gastronomia italiana.
Parece uma combinação improvável, não é? Mas funciona. Vão por nós.
Num fim de tarde quente, está-se bem é na esplanada e foi aí que nos sentámos. A companhia era boa mas, mesmo que não fosse, teríamos sempre as boas vistas do Douro a correr em direção à Foz, a luz de fim de tarde reflectida no casario (calma, aspirante a Rui Veloso), turistas e locais a passearem calmamente, aproveitando o início de noite de sexta-feira, deixando para trás uma semana de trabalho ou aproveitando uma merecida escapadinha.
Enquanto estávamos embrenhados nestes pensamentos, Mimi, a simpática e diligente chefe de sala serve-nos um Valle da Fonte Reserva Branco 2019 que nos vai acompanhar no início da refeição. Traz-nos o couvert (2,50€ por pessoa), composto por azeitonas, que foram marinadas no restaurante, pão artesanal com azeitonas, muito fresco, fofo e perfeito para mergulhar no azeite ou para barrar com a manteiga também feita in loco, com sal e ervas.
O mote do Terra Nova pareceu-nos, assim à primeira vista, um pouco presunçoso: Fine Codfish & Oysters. Que é como quem diz, em bom português, bacalhau armado ao pingarelho e ostras. Depois, em conversa com Vasco Amaro, sócio-gerente do Terra Nova e também do Taberna Rio (que fica ali pertinho e já prometemos visitar), descobrimos que o bacalhau usado no restaurante é da Islândia e percebemos a ideia. Noruega é para meninos, gente. Vão por nós que é à confiança.
Não era grande fã de ostras, mas a minha opinião reverteu-se quando vieram para a mesa as ostras ao natural (7,50€) e as com yuzu, pera nashi e lúcia lima (9€). Das primeiras, apenas a destacar o que tem de ser destacado quando o molusco é fresco e foi bem tratado por quem o abriu: a frescura, o sabor intenso a água do mar, a textura tersa e ligeiramente viscosa. Das segundas, a acidez do yuzu (fruto da família dos citrinos, originário da China), a cortar na perfeição a riqueza untuosa das ostras.
Mimi volta com uma nova garrafa de vinho, um Encosta da Capela - Alvarinho Reserva Branco 2019, que vai servir de par aos pratos principais. E eis que vem para a mesa um dos melhores pratos de bacalhau que já provei nos últimos tempos (excetuando, claro, o bacalhau à espanhola que a minha mãe faz, esse é sagrado).
O nome, bacalhau corado, com gnocchi artesanais de batata, cebolada de tomate, berbigão e lingueirão, pesto de rúcula (22€), soa a salganhada, mas é tudo menos isso. Os pedaços de bacalhau, suculentos, ligeiramente gelatinosos, corados na perfeição, vêm mergulhados num molho atomatado, ácido q.b. (para quem gosta de molhos apurados, este é quase perfeito), onde se encontram também rechonchudos berbigões.
Eu cá não sou de intrigas, mas para quê comer amêijoa quando se pode comer berbigão? Os restaurantes portugueses esnobam este bivalve delicioso e, a meu ver, está errado. O fiel amigo podia ser a estrela principal deste prato, mas tem de dividir o protagonismo com os gnocchi de batata, caseiros, que, depois de cozidos, foram corados e ganharam uma crosta estaladiça, perfeitos para mergulhar no molho de tomate sem se desfazerem.
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Continuámos em modo seres oriundos do mar com a pasta nero caseira de caranguejo, com crème fraîche e cebolinho (23€). A massa, fresca e feita na cozinha do Terra Nova, tem uma textura e sabor que em nada se comparam com as embaladas. É mais fina, quase que se derrete na boca e mistura-se na perfeição com a doçura da carne do caranguejo. Os tomatinhos salteados ajudam a cortar a densidade do prato e o caranguejo de casca mole, que vem frito e estaladiço, dá aquele contraste perfeito de texturas.
"Eu nem sou muito de sobremesas" é o que dizem normalmente as pessoas que, ou acabam sempre por pedir sobremesa ou fazem aquela coisa irritante que é não pedir sobremesa e depois andar a dar colheradas ou garfadas nos pratos alheios. Eu sou uma dessas pessoas. Eu nem queria mas, após insistência de Mimi, veio para a mesa um tiramisù (7€). Estava bom, não demasiado doce, mas talvez com demasiado mascarpone. Eu dispensava também a bola de gelado, cuja temperatura adormece as papilas gustativas e impede de saborear na totalidade os ingredientes deste tradicional doce italiano.
A promessa de voltar está feita e já estamos a sonhar com aqueles gnocchi fofos, comidos ao por do sol da Invicta.