Pois é, meus lindos. Esqueçam tudo o que vos disse até aqui sobre desconforto existencial, porque isso agora são só pieguices. Quando em janeiro cruzei a barreira dos 30, mal sabia eu que um par de meses depois iria estar a viver num filme de ficção científica, onde um vírus louco andaria à solta no mundo, a perseguir e a confinar o planeta em casa. Sinto-me a viver entre o "Dawn of the Dead" e a série "Years and Years" e, secretamente, tenho a esperança de que por aí exista uma Emily Blunt, de "Um Lugar Silencioso", que aleatoriamente, vai descobrir que o bicho consegue ser derrotado com uma solução absolutamente estúpida e aleatória, tipo uma frequência de som marada. Sei lá.
As nossas vidas mudaram. Entre a fulminante vontade de termos o maior stock de papel higiénico do mundo em casa (pode ser mais um sintoma do vírus, qui ça), de não termos vida social, de batermos palminhas às 22 horas, temos medo de estar próximos de outros seres da nossa espécie, incluindo os nossos pais. Por outro lado, no outro dia, vi um homem a andar todo nu na rua e achei que era absolutamente normal. Foi a isto que chegámos.
Mas também ganhámos novos hábitos. E nem tudo é mau. Numa acrobacia brutal para largar as redes sociais, e não ser comida pelo bombardeamento de notícias e de posts deprimentes, há dois momentos em que faço questão de estar online. 1) Às 19h30 para acompanhar os treinos em direto do Paulo Teixeira — curioso como foi preciso viver em estado de calamidade para começar a mexer este rabo. 2) E, por volta das 22h, mais coisa, menos coisas, porque reside aí o ponto alto do meu dia — e de, pelo menos, mais 16 mil portugueses.
Estava eu a ouvir o concerto do Samuel Úria, quando alguém escreveu "Bruno Nogueira está a fazer live." Senti-me num Alive sem filas: fomos todos em debandada para o palco da comédia e entrámos no espaço que, em três dias, veio a tornar-se no novo spot mais badalado de Portugal.
Nestes longos e despretensiosos diretos, encontrei a salvação para a minha quarentena: Bruno Nogueira, sendo ele próprio, sentadinho em casa, de cálice de vinho na mão (quem não?), entretendo-se a si e a nós, durante horas. Mas raramente está sozinho. O cartaz está, aliás, recheadinho de potencial — e não deixa entrar filtros e egos de celebridade. Ali, estamos mesmo todos no mesmo barco.
O primeiro convidado da noite, um habitué neste "Nogueira em Quarentena", é Nuno Markl. O tema premente deste diálogo costuma estar relacionado com uma das mais básicas necessidades da espécie humana: a masturbação — ou "punheta". Não vos vou dar muitos pormenores sobre esta temática, sob o risco de ser acusada de traição. É que o que acontece no live, fica no live, maninhos.
Mas posso adiantar-vos que Markl faz o pior falsete do mundo, que o novo hit de Quim Barreiros será escrito por Nogueira e terá como título: "Como é que o bicho mexe". Ana Malhoa também podia criar o "Estou Toda Covidada", ocorreu-me.
Mas não é só desta dupla que se fazem os lives da salvação. A noite segue com mais convidados especiais: Manzarra, um dos meus preferidos, é o alienado mais engraçado de sempre, que até à data não sabia o que queria dizer "açambarcar" — também ficámos a saber que faz planos para ir dormir numa caravana a 500 metros da sua casa em Ferrel, mas isso já são outros quinhentos; Gonçalo Waddington, também ele um habitué de copo de vinho, ou Salvador Martinha que em tempos de COVID-19 se sente uma "teta" de chapéu de palha.
Acreditem. Estes lives são o Lux em tempos de COVID e em breve estarão nas sugestões da Time Out, que agora é Time In, e só existe online. A malta vai para ver e para ser vista, não fosse a caixa de comentários o sítio onde encontramos os nossos amigos, os amigos dos nossos amigos, provavelmente já todos bêbados. Tal como na discoteca de Santa Apolónia, também por lá encontramos celebridades portuguesas: passeam-se por lá Nuno Lopes, Ana Brito e Cunha, Jéssica Athayde, Joana Azevedo, Bordalo II e, provavelmente, muitos outros que não se fazem notar nos comentários.
Num esforço titânico para ver o copo meio cheio em tempos de profunda crise, é bonito ver como em pleno tornado, cada um contribui com o pode. Os humoristas conversam connosco, os cantores dão concertos nas redes sociais, os ginásios e personal trainers disponibilizam planos de exercício para que não se ceda ao sedentarismo absoluto. Vemos equipas de psicólogos a trabalharem online, porque o medo e confinamento mexem com o nosso estado mental. Deparamo-nos com múltiplos projetos que vêm a casa entregar comida e outros bens, com o objetivo de salvaguardar a saúde da população (sobretudo a de risco), impedindo a propagação deste vírus.
Os médicos e enfermeiros são os guerreiros na primeira linha da batalha, mas temos também a malta dos supermercados, dos transportes públicos, das farmácias e de todos os serviços que têm de continuar a funcionar.
É, em tempos de calamidade, resta-nos a união. E isso é comovente.
A todos, um obrigada gigante.
E ao Bruno Nogueira, por favor liga ao Herman.