Assim que Portugal deu início ao processo de vacinação contra a COVID-19, surgiram imediatamente várias dúvidas quanto à à sua administração. Embora a vacina seja a ferramenta crucial para controlar a pandemia, a verdade é que a rapidez com que a mesma foi criada fez levantar o sobrolho a muita gente, que temem os possíveis efeitos secundários.
E há duas populações em especial que não demoraram a questionar os seus médicos sobre se deviam ou não levar a vacina: grávidas e mulheres a amamentar. É seguro? Desaconselhado? "Inicialmente, não havia razões para acreditar que existissem motivos de preocupação em relação às mulheres a amamentar, mas o laboratório que fabrica a vacina que estamos a administrar atualmente em Portugal [Pfizer] não recomenda a toma quer a estas mães, quer a grávidas", explica à MAGG Fernando Cirurgião, médico obstetra e diretor do serviço de Obstetrícia do Hospital São Francisco Xavier.
"A verdade é que, eticamente, não se fazem ensaios clínicos em grávidas, nem em crianças, por isso ainda vai demorar bastante tempo para que se possam tirar conclusões sobre os benefícios e riscos da toma da vacina.Temos de ter milhões de pessoas vacinadas e esperar por um período de tempo adequado para os laboratórios conseguirem retirar conclusões adequadas sobre quaisquer limitações", salienta o especialista.
Mulheres a amamentar em grupos de risco podem ser vacinadas
Enquanto ainda não existe informação nenhuma sobre a vacinação em grávidas, a não ser a recomendação geral da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do CDC (Centers for Disease Control and Prevention) para não vacinar, Fernando Cirurgião acredita que é preciso diferenciar esta população das mulheres a amamentar.
"Atualmente, como profissionais de saúde, temos de nos reger por aquilo que está na bula. E dado que as duas populações não estão recomendadas pelo laboratório, a vacina não é recomendada. Mas se acredito que vai demorar muito para ser possível recomendar a toma a gestantes — aliás, até existe a indicação de que todas as mulheres devem esperar dois meses a seguir à segunda toma para engravidar—, a limitação da vacina a mulheres a amamentar parece-me excessiva de um ponto de vista clínico."
O obstetra acredita que, em breve, a vacina possa ser administrada a mães a amamentar tranquilamente, e que esta recomendação pode estar pendente de algum parecer das autoridades de saúde. "A vacina da COVID-19 tem características similares à da hepatite B, por exemplo, que é administrada a esta população sem problemas. Independentemente da medida me parecer excessiva para quem amamenta, neste momento não posso recomendar, tenho de me reger pela bula. Mas se a Organização Mundial de Saúde encontrar um princípio que justifique a que seja administrada a esta população, aí será diferente."
E foi justamente a OMS, bem como o CDC, que já fez saber que "as mulheres a amamentar que pertençam a grupos de risco podem ser vacinadas", salienta a pediatra Joana Martins à MAGG. "Não há estudos que comprovem se a vacina tem efeitos ou não nesta população muito especifica [mulheres a amamentar], mas, caso sejam pessoas de risco, podem ser vacinadas interpretando o perfil natural da vacina, avançam estas autoridades", esclarece a especialista.
A médica pediatra explica ainda que a vacina contra a COVID-19 é de "RNA mensageiro, logo de muito baixo risco de integração no nosso ADN". Para Joana Martins, esta é uma vacina relativamente segura, dado que não se trata de uma "vacina viva ou atenuada, mas sim recombinante, com um perfil muito seguro". Assim, as mulheres a amamentar "têm a oportunidade de criar anticorpos contra estas moléculas e transmiti-los no aleitamento materno para os seus bebés", diz a pediatra, reforçando uma vez mais que ainda não existem estudos sobre o tema.
Já em relação às crianças, Joana Martins esclarece que a vacinação não está recomendada antes dos 16 anos, mas informa que existe uma investigação a decorrer. "O laboratório AstraZeneca está a trabalhar num estudo que avalia a possibilidade de as crianças acima dos 5 anos serem vacinadas, mas ainda não há resultados preliminares."
Quanto aos efeitos secundários, Fernando Cirurgião salienta que ainda estamos numa fase "precoce para avaliarmos e tirarmos conclusões". "Os efeitos secundários registados até à data podem não ter representatividade. Por exemplo, tive conhecimento de um caso em que uma das primeiras pessoas a tomar a vacina teve um choque anafilático, mas foi um caso completamente isolado. Ainda é muito cedo para tiramos conclusões adequadas", sublinha o médico obstetra.