Ljubomir Stanisic acabou o programa com a frase: "Tenho a certeza que o Zé não vai aproveitar esta oportunidade".
Talvez ainda seja cedo para responder a esta pergunta com todas as certezas, mas a verdade é que quando reabriu ao público, 15 dias depois da gravação do programa, já o proprietário do Miquipal tinha feito algumas alterações ao que o chef tinha sugerido.
Um dos primeiros conselhos, ditos em forma de ordem, é que aquele restaurante nunca mais poderia funcionar enquanto marisqueira. José Beites, o proprietário, parecia ter percebido. Disse até, num daqueles momentos em frente à câmara: "Uma coisa é certa: como marisqueira está fora de questão". Mas eis senão quando, durante a vista da MAGG, a terceira página do menu tinha o título "Mariscos", com opções de sapateira, lavagante, mexilhões, amêijoas e até o misto de marisco, o mesmo que José decidiu incluir nos vouchers promocionais que levaram à quase falência do espaço.
Mesmo com este historial, José acredita que é pelo marisco que pode voltar a ter casa cheia e foi por isso que decidiu não o retirar da ementa. "O chef virou-se para mim e disse-me que para comer marisco as pessoas iam ao Ramiro, em Lisboa, e eu pensei para mim:' Tem razão que do Ramiro vê-se perfeitamente o mar". A ironia com que falou com a MAGG não esconde a mágoa de uma semana que preferia esquecer. Aliás, se fosse hoje, garante que nunca se teria inscrito no "Pesadelo na Cozinha".
Conceito de Ljubomir não funcionou
Apesar de ficar na Parede, o restaurante não fica na linha da praia. Aliás, fica no meio de uma zona residencial e tem o Colégio dos Maristas e duas escolas de ténis relativamente perto. Ljubomir Stanisic fez as contas e até as escreveu num papel para que José tivesse noção dos potenciais clientes à sua volta. "A escola tem 65 professores e 800 alunos. Há duas mil pessoas inscritas na escola de ténis. e tu queres vender lavagante a quem faz desporto? E lagosta aos professores, que ganham um ordenado miserável?"
As propostas do chef passam por refeições mais leves, com sugestões que vão do ceviche à salada de quinoa e criou uma receita de hambúrgueres a que deu o nome de "hambúrguer do Mestre Zé".
Montou até uma mesa comunitária a pensar nos miúdos que iriam lá almoçar. "Até agora não apareceu nenhum", comenta José, aproveitando para dizer que tínhamos sido os primeiros clientes a pedir salada de quinoa. "Como ninguém tinha pedido não a tinha feita e por isso é que disse que não tinha", explicou. Também ainda não houve ninguém a pedir os smoothies que o chef garantiu serem "o futuro".
Para o proprietário, estas são receitas que podem funcionar bem num bar de praia, mas não no Miquipal, que fica longe da marginal e é um restaurante onde as pessoas estão habituadas a ir comer pratos mais completos, como os grelhados, mariscos, cataplanas e arrozes.
Trocou a garoupa por corvina a conselho do chef e assim vai manter. "É que a garoupa vem de tão longe que até podia mudar o nome do restaurante para O Viajante", disse Ljubomir. Mas ao contrário do aconselhado pelo chef, José não só vai ter a corvina a bulhão pato, como vai passar a servi-la grelhada. "E vou voltar aos robalos, aos linguados, às douradas. Era isso que as pessoas estavam habituadas a vir cá comer e já tive clientes a queixar-se do facto de já não estarem disponíveis.".
O grupo de funcionários que ajudam José no Miquipal também já não é o mesmo. João Pedro, o mais calado de todo o programa, despediu-se durante as férias e João Sousa, o mais interventivo e a quem Ljubomir não poupou elogios, já anunciou que também está de saída. Na cozinha mantém-se Laura e no serviço à mesa está Carina que se estreava no Miquipal no dia da visita da MAGG.
A cozinha, essa, está mais organizada. "Já tenho onde pousar uma travessa, onde organizar os talheres", explica José à MAGG, enquanto põe etiquetas nos tupperwares que vão para o frigorífico. Aponta para o que está a fazer e garante, "em limpeza e organização ninguém tem por onde pegar. Nem o chef".