Em tempos de quarentena, os olhos do Brasil estão postos no grupo de pessoas mais confinado deste país. Não são os infetados com o novo coronavírus, são os concorrentes do "Big Brother" Brasil. As votações do último programa são prova disso: mil milhões de votos estabeleceram um recorde mundial neste formato de reality show. Mas porquê isto? E porquê agora? Porque a disputa entre os concorrentes Filipe Prior e Manu Gavassi não era apenas uma competição entre dois nomeados para sair da casa, simbolizava também uma guerra política entre a esquerda e a direita, num momento em que o País também ele se divide entre apoiantes de Jair Bolsonaro e os que se envergonham do presidente brasileiro.
Manu Gavassi e Filipe Prior representavam a polarização ideológica de um país dividido. A disputa gerou tanta polémica, que o próprio filho do presidente brasileiro, filiado do Partido Social Liberal, Eduardo Bolsonaro, veio dar o seu apoio a um dos lados do duelo. Mas não foi o único. O jogador de futebol Neymar também escolheu um lado e Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT), celebrou o vencedor.
Mas onde é que isto começou? O jornal "Folha de São Paulo" fala de uma edição diferente de todas as outras, com um programa que se "impregnou em política". Em causa está o próprio perfil dos concorrentes — e não uma mera discussão em torno de figuras do panorama político do Brasil.
Nesta vigésima edição, incluíram-se no jogo "visões de mundo" que entravam em conflito, em que "o machismo deu as caras logo no início do jogo e foi posto para correr", com mulheres — as chamadas "fadas sensatas" — a unirem-se contra "supostos machos alfas".
Desde o início do reality show que já houve várias polémicas de assédio sexual, o que pode ter ajudado a distinguir desde logo a corrente mais forte: o machismo foi condenado, tanto que os nove primeiros eliminados foram homens.
Deste grupo de alegados machistas, só restou Felipe Prior. Sobreviveu porque no meio dos concorrentes nunca, de facto, ultrapassou alguns limites", diz a "TV Famosos", que acrescenta que "fez comentários grosseiros", "elevou a voz além do civilizado", mas "nunca assediou nem colocou nenhuma mulher contra a parede do reality show".
No entanto, fez parte do trio que foi ao décimo paredão da eliminação, nesta terça-feira, 31 de março, juntamente com a influenciadora digital Mari Gonzalez e com a cantora e atriz Manu Gavassi. No final, o público ficou do lado feminino. Mas foi renhido. O homem saiu com 56,73% dos votos. Manu Gavassi teve 42,51% dos votos e Mari apenas 0,76%.
A distribuição dos votos pelos dois concorrentes é o reflexo da tal polarização ideológica brasileira. No fundo, é a direita contra a esquerda. Conforme a visão, ele é o tipo machista ou a personificação do anti-politicamente correto; ela é a artista independente e feminista ou a "militante de esquerda" (apesar de também já ter sido acusada de racismo por afirmar que casais da mesma cor de pele são "esteticamente mais agradáveis") .
"Militante de esquerda" foi a expressão utilizada por Eduardo Bolsonaro, que veio dar apoio público a Felipe Prior, no Twitter, considerando que este concorrente era apoiado por todos os cidadãos que odeiam "mimimi", expressão que faz alusão a pessoas que estão sempre a reclamar. Neste caso, as feministas.
Também o Movimento Brasil Livre e o coordenador Renato Battista, presidente do partido de extrema direita em São Paulo Patriota, apoiaram Felipe Prior. Nesta disputa, ela "representa o politicamente correto".
Com o universo do futebol parado, também Neymar, Gabigol e Vinicius Jr. se uniram contra Manu, dando o seu apoio a favor do concorrente — inventando aquela que ficou conhecida como a "Dança do Prior".
Os comentários nas redes sociais destas figuras do desporto, a que se junta o surfista Gabriel Medina, têm sido em torno do reality show brasileiro. Criaram também a corrente #foramanu depois de esta partilhar no Twitter um comentário sobre como não gosta de futebol.
Do lado da cantora, e contra Prior, estiveram não só as atrizes Bruna Marquezine (ex de Neymar), Agatha Moreira e Larissa Manoela, como também a Mídia Ninja, uma rede de jornalismo alegadamente alinhada à esquerda, e marcadamente anti-Bolsonaro, assim como a advogada Gabriela Prioli, comentadora em "O Grande Debate", na CNN Brasil — envolta, entretanto, noutra polémica depois de ter abandonado a emissão do programa.
Esta quarta-feira, 1 de março, também Fernando Haddad, do PT, reagiu à saída de Prior. Não só ficou contente, como aproveitou a polémica para criticar o atual presidente brasileiro.
Com a saída de Prior, as atenções viram-se para Babu, aquele que era o sensato aliado do ex-concorrente, com dezenas de memes a tornarem-se virais nas redes sociais.
O Big Brother Brasil 20 está a ser exibido desde 21 de janeiro. A final está marcada para 23 de abril, tornando-se esta edição na mais longa da história do reality show.