"Do oceano para a mesa". É este o conceito do novo espaço de restauração que agora ocupa o n.º35 da Rua de Belém, com vizinhos como o Mosteiro dos Jerónimos e a casa dos pastéis mais famosos do País. Abriu em setembro de 2023 e só serve produtos que venham do mar.

"Queremos que o Guelra apareça na cabeça de qualquer um que queira comer peixe", esclareceu o chef, Manuel Barreto, à MAGG. "Não somos muito baratos, mas não usamos produtos que os restaurantes aqui à volta usam. Nesta rua, toda a gente serve bacalhau. Se trabalharmos um produto muito português, tem de ser um prato diferente", defende.

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Foi com isto em mente que criou o bacalhau ao cubo, três partes diferentes do peixe (língua, brandade e sames) com três técnicas diferentes. "É desidratado, frito, leva pó e rebentos de coentros", descreveu, sobre esta criação que é uma das mais procuradas e que custa 7€.

"Gosto sempre de começar com este prato, porque, conceitualmente, é muito ilustrativo daquilo que fazemos aqui", defende o chef, sobre aquilo que nos soube a véspera de Natal. No entanto, a tostada de camarão (7€) detém o título do prato mais pedido, "porque é algo que as pessoas conhecem mais facilmente".

"Tem uma base mexicana, espanhola e asiática", explica o chef sobre esta proposta repleta de sabor, que junta um camarão braseado quase cru a tortilhas crocantes e aos molhos romesco com frutos secos e gel de ponzu. "Ilustra a nossa cozinha", segundo Manuel Barreto.

guelra
guelra O chef Manuel Barreto. créditos: Rita Almeida/MAGG

A maguro sando ("uma katsu sando tradicional, mas com atum") leva a medalha de prata no duelo de popularidade, mas, para nós, é ouro. Esta sanduíche com atum rabilho dos Açores frito e panado em panko, pickle de chalota, sriracha e cole slaw é (mesmo) de lamber os dedos (18€).

"As crianças comem muito" esta opção, de acordo com o chef, que sente que os mais novos "serem limitados no seu paladar é uma questão de educação". Por isso, se é um pesadelo constante conseguir fazer com que os miúdos comam peixe, experimente levá-los ao Guelra e pedir uma maguro sando.

"Claramente somos diferentes dos que nos rodeiam. As pessoas voltam"

Este restaurante no coração da capital tem cerca de 80 lugares e "três ambientes diferentes para clientes diferentes", assim como justifica um dos donos, Pedro Frade. Na esplanada ("a esplanada da área", para o chef) são 36, no piso de cima 32 e os restantes ao balcão, com o qual esbarramos assim que entramos.

As atmosferas são bastante diferentes, o que também explica a organização da ementa, que "tem de abranger vários momentos de consumo" e que está dividida em entradas, principais e para partilhar, para "pessoas que queiram experimentar várias coisas, com muito sangue na guelra".

"Claramente somos diferentes dos que nos rodeiam. As pessoas voltam, e quando voltam é porque gostam muito", diz, com orgulho, o chef do projeto. No Guelra, sobressaem os tons azul e branco, bem como os graffiti no teto, feitos à mão por alguém muito talentoso.

"Os principais vão mudando. Costumamos ter muitos pratos fora da carta, porque não se consegue garantir a sazonalidade e a quantidade. Estamos dependentes dos barcos", explica o chef Manuel Barreto sobre as mudanças na carta, que ocorrerão "sempre que fizer sentido".

O tártaro de atum rabilho, com pérolas de wasabi, maionese de alho, alho negro, maçã e aipo, custa 18€ e foi um dos nossos favoritos. Provámos a fresca cavala alimada, com pêra rocha, vinagrete de coentros, funcho e picadinho à algarvia (12€) — e sabia a verão.

Do ensopado do mar à cremosa moqueca

Como prato principal, chegou-nos "aquilo que seria um ensopado de borrego", mas na versão marítima. "Estávamos à procura de um prato mais reconfortante. O ensopado é um molho com muitos enchidos, que aguenta sabores mais fortes", explica Manuel Barreto.

Este ensopado do mar leva lula e tentáculos em tempura, óleo de chouriço, croutons, teriyaki e polento com caldo verde de marisco. Mas as reinterpretações de clássicos não ficariam por aqui. "A moqueca foi um desafio. Optámos por uma abordagem um bocado diferente, mantendo sabores e caraterísticas", apresentou o chef.

O cozinheiro optou por utilizar panko em vez de farofa neste prato cremoso com uma placa de arroz frito, gamba da costa, gel de coco, salada de folhas e flores. "É para misturar o arroz no molho", alertou. O setor das sobremesas é "o mais desafiante" para Manuel Barreto. "Porque sou cozinheiro e não pasteleiro de formação", recorda.

Para sobremesa, deu-nos a provar "a que mais sai", a tarte de queijo de estilo basco, com amendoim e creme de amendoim (6€). "Já me acompanha há algum tempo", afirmou. Também comemos uma com gelado de ameixa, ameixa grelhada, couli de ameixa e crumble de chocolate branco (que custa 8€ e que não se chama "ameixa ao cubo", mas podia).

Para acompanhar da melhor forma, o Guelra sugere, entre outras alternativas, vinhos de produção própria ou cocktails como o gin basil smash, com gin, clara de ovo, maracujá, limão e manjericão (10€), e mocktails, como o A Paixão, com maracujá, manjericão e soda (11€).

"Não queríamos ser mais uns a fazer peixe grelhado e batata cozida"

"Gostamos muito de peixe e Portugal tem muita matéria prima nesse sentido", sublinha Pedro Frade. Um dos objetivos é "aproveitar a 100% os ingredientes para reduzir o desperdício". Para o atingirem, criaram propostas como a tábua de enchidos do mar, que está atualmente "em processo de construção".

"Sendo um restaurante só de peixe, queríamos arrojar, fazer algo diferente em Lisboa. Não queríamos ser mais uns a fazer peixe grelhado e batata cozida. Não queríamos ser uma marisqueira. Queríamos trabalhar o peixe de uma forma diferente", exclama o chef do Guelra, restaurante que se afasta da aquacultura.

"Globalmente, temos sido muito bem aceites. Todos os meses estamos a bater recordes de faturação e afluência", garantem os responsáveis, que revelam que "no verão, ao almoço, o público é quase 100% estrangeiro". Ultimamente, os jantares têm sido dominados por portugueses e aos "almoços é uma mistura".

"O desafio é sempre como chegar aos portugueses e fazer com que gostem de nós", reconhecem. "Seguimos um conceito muito descontraído. Não há pretensão de sermos uma coisa muito formal, mas damos conforto", descreve Manuel Barreto, que está no projeto desde o início e que, por várias vezes, aconselha a comer com as mãos.

Em breve, terão um maturador para expor os peixes, que poderão ser pedidos inteiros. "Queremos dividi-los em momentos, com guarnições diferentes, para dar azo à criatividade e mostrarmos a nossa visão sobre aquele peixe em específico", adianta Manuel Barreto.

"Acho que olhamos de forma errada para o peixe, como um animal. Grelhamos o peixe inteiro e a cabeça vai fora. Temos de mudar. Há segmentos que podem ser aproveitados de forma diferente", crê o chef, que já planeia "costeletas, chicken wings e enchidos com atum e lula".

Guelra

Localização: R. de Belém 35, 1300-315 Lisboa
Horário: de terça-feira a sábado das 12h à 00h; domingo das 12h às 17h; encerra à segunda-feira
Contactos: (+351) 939 002 081 / site / Instagram