Numa esplanada portuguesa fica bem, pão quentinho sobre a mesa. E se ao almoço humildemente chega mais alguém, pede-se mais para toda a gente. Amália Rodrigues não se importaria, com certeza, que lhe tenhamos dado cabo da letra de "Uma Casa Portuguesa". Até porque suspeitamos que, se ainda estivesse entre nós, gostaria de se sentar na esplanada do Pica-Pau e provar os petiscos desta carta bem à moda de cá, e que tanto agrada a quem vem de fora.
Situado no Príncipe Real, numa das zonas mais movimentadas de Lisboa, o Pica-Pau traz para a mesa, desde o verão de 2022, comida portuguesa. Sem fru-frus nem reduções, apenas bons pratos à portuguesa, comida de tacho com fartura e até pratos do dia.
Luís Gaspar nunca nos desilude, como já tínhamos comprovado durante a nossa visita ao Brilhante. O chef é o responsável pela carta do espaço (que, tal como o Brilhante, também pertence ao grupo Plateform), e na cozinha do Pica-Pau quem mete as mãos à obra é o igualmente talentoso beirão Samuel Duarte.
No Pica-Pau, a loiça é rústica, os cortes não são feitos ao milímetro e não há frescuras, como se diz em português do Brasil (que a nossa Amália tanto amava). Há honestidade, respeito pela cozinha portuguesa e muito conforto. Além da carta fixa, que tem petiscos, saladinhas, pratos principais e sobremesas (reina a carne e o peixe mas também há opções vegetarianas, uma delas maravilhosa, como comprovámos), a cada dia da semana há um prato em destaque. Por agora, que o calor ainda está por cá (e convida mesmo a um almoço ou a um jantar a dois nesta esplanada quase secreta), as opções são:
- segunda-feira: filetes de pescada com arroz de tomate (14€)
- terça-feira: choco frito (14€)
- quarta-feira: ensopado de borrego (14€)
- quinta-feira: raia alhada com batata cozida (14€)
- sexta-feira: arroz de cabidela (14€)
- sábado: bacalhau à minhota (18€)
- domingo: cabrito assado com arroz de forno (20€)
Veja as fotos do espaço
Visitámos o Pica-Pau numa sexta-feira de muito calor. O prato do dia era arroz de cabidela (14€) mas, com as temperaturas pouco convidativas a este tipo de cozinhado, preferimos algo mais leve. Começámos logo com um bom motivo para regressar ao Pica-Pau. O pão de Mafra, quentinho e estaladiço, a combinação certa de crosta e miolo, a cair que nem ginjas dentro do molho à Pica-Pau, que vem para a mesa, juntamente com manteiga rainha do Pico (3,50€).
Este couvert dos deuses lusos merecia uma estrela Michelin pela simplicidade gulosa. Mas fizemo-nos à estrada para mais provas. Difíceis, claro, como a fresca saladinha de tomate coração de boi com requeijão de Nisa (6€) e os suculentos e estaladiços rissóis de leitão (6€).
O que comemos no Pica-Pau
Os peixinhos da horta (8€), dos melhores que já provámos, estavam crocantes mas leves, sequinhos apesar da fritura. Provámos o bacalhau à Brás e não nos arrependemos, porque a textura suave, ainda com a maciez do ovo a envolver as lascas e a batata, só nos provou que as criações de Luís Gaspar, além de respeitarem a tradição portuguesa, são exímias na execução.
Antes das sobremesas, o prato mais surpreendente deste almoço. O arroz de espargos com tomate e queijo São Jorge DOP (14€). Os amantes de carne podem descansar que este arroz não desilude. O grão? No ponto. O caldo? Aromático e saboroso. Os espargos? Macios, mas ainda com aquele estalar, próprio de um vegetal que não foi demasiado cozinhado. O queijo? derretido e a deixar toda a sua sensualidade salgada no arroz. Comíamos todos os dias da semana e ao fim de semana também.
Terminámos em beleza com duas sobremesas que ganharam lugar imediato no nosso coração (e na lista daquelas que queremos repetir em breve). As farófias com leite creme (5€) surgiram mais consistentes do que as habituais, mas ainda assim leves, uma textura acertada para servir de veículo ao leite creme.
E, por fim, um momento que nos emocionou. Os pastéis de Tentúgal com laranja (5€), uma recriação deste doce conventual da região centro que tantas boas recordações nos traz. A incrível leveza da massa, invólucro perfeito para o doce de ovos, é complementada pela acidez ligeira da laranja. Não queremos parecer exagerados mas, caramba, que obra prima.
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Fotos: Nuno Correia
*A MAGG visitou o Pica-Pau a convite do restaurante