Faz este sábado, 14 de outubro, uma semana que o grupo islâmico palestiniano Hamas iniciou um ataque sem precedentes de Gaza para a fronteira com Israel, tendo como principal alvo civis. No espaço de apenas uma semana, assistimos a uma escalada de violência como há muito não se via naquela região do globo. Chocante, assustador, mas não surpreendente, tendo em conta a história deste conflito.

Mas, ao contrário do que aconteceu no início de 2022, quando rebentou a guerra na Ucrânia, neste conflito é mais difícil assumir a postura jogo de futebol. Estou do lado dos vermelhos ou dos azuis? Estes são os bons, estes são os maus. A lógica hollywoodesca do vilão e do bom da fita, que tanto tem ajudado a perpetuar estereótipos aos longos das décadas, nesta nova guerra, a guerra Israel-Hamas, de pouco serve. Ou serve o seu propósito, dependendo da vontade que tenhamos em ter opiniões imediatas, baseadas na emoção e não na racionalidade.

O que temos visto, desde celebridades até aos nossos amigos, é a pressa em ter uma opinião. A corrida ao post com uma bandeira, com uma frase, com uma declaração de intenções, um story partilhado com um qualquer pensamento, imagens dramáticas com músicas delicodoces, apelando a sentimentos fugidios, à fragilidade, às emoções.

Quando devíamos estar a fazer exatamente o contrário.

A não ser que sejam israelitas, palestinianos, judeus, muçulmanos, ou tenham algum tipo de relação direta com este conflito, seja por motivos pessoais ou profissionais, podem dar-se ao luxo de não reagir de forma emocional a esta guerra, a este conflito de décadas, a este tenebroso imbróglio de interesses sem fim à vista. Podem dar-se ao luxo de, no conforto dos vossos lares, no tempo que vos proporcionam os vossos países em paz, ficar em silêncio. Lerem, informarem-se, perceberem do que realmente se trata esta guerra.

E não há uma resposta única. Nem sequer há dois lados do conflito. Há muitas perspectivas, muitas narrativas, muitas delas que conflituam com outras. Para lá daquilo que deve ser a condenação inequívoca do uso da violência contra alvos civis, toda a história do conflito israelo-árabe, do qual o Hamas é apenas um subproduto, é nebulosa e complexa. Demasiado difícil de entender para que se tome uma posição do género "isto é bom, isto é mau".

A História ensina-nos que, quando os conflitos se estão a desencadear, não existe distanciamento para percebermos as suas implicações, os seus motivos, as razões pelas quais acontecem. E, mesmo a História, necessariamente parcial, é sempre uma perspectiva sobre algo.

Os tempos em que vivemos permitem-nos ter acesso a uma quantidade avassaladora de informação. Poderíamos passar 24 horas acordados, entre redes sociais, aplicações de troca de mensagens, sites de notícias, a tentar ler e ver tudo, que mesmo assim não conseguiríamos apreender todos os conteúdos. Muito menos contextualizá-los ou entendê-los. Paradoxalmente, são tempos que nos impelem a falar, a tomar posição, a partilhar o que nos vai na alma, mesmo que não saibamos muito bem do que estamos a falar ou não percebamos o que está em causa.

E, atenção, não há mal nenhum em não perceber. Mas não perceber, não entender, não fazer o esforço para aprender e, ainda assim, expressar opiniões mal informadas é que não está certo. Todos já o fizemos, o próprio jornalismo, porque falho na necessidade de imediatismo, fá-lo. Mas aí reside o perigo. Em cada pessoa há um influencer, cada um de nós tem a capacidade de influenciar a família, os amigos, os vizinhos, quando partilha algum vídeo, uma fotografia, um post. Sem, muitas vezes, questionar se aquilo é mesmo assim, se está ali verdade, ou se é propaganda, falsidade, mentiras.

Os extremismos, o ódio, começam assim, desde tempos imemoriais. Com um mal-entendido, com uma mentira, com equívocos. Há quem viva disso, quem se alimente da ignorância dos outros, para se edificar. Carreiras políticas, impérios inteiros, expansões megalómanas, invasões, ataques terroristas, quase todos acontecem à custa de uma mentira, de um engano. De convencer as massas de que um propósito sem legitimidade é legítimo.

Em 2023, nós somos as massas. Mas nós, as massas, nós, o povo, já não somos ignorantes. A nossa capacidade de pensar criticamente, de analisar, é maior do que nunca. Saibamos usar essas ferramentas à nossa disposição a favor da paz, exigindo responsabilidade a líderes, pedindo-lhes contas pelos seus erros, e não contra os que nada têm.