O processo de perda de peso, em casos em que já existe um excesso, é fundamental, acima de tudo, por uma questão de saúde individual. É um facto que o progresso físico, tanto a nível estético, como de bem-estar, pode funcionar como um fator de motivação, mas por norma a perda de peso é algo que leva o seu tempo para que o resultado seja duradouro.

Mas afinal quais são as melhores formas para conseguir uma perda de peso de sucesso? E quais são os erros que podem dificultar ou atrasar o processo?

Falámos com dois profissionais, um da área da nutrição, Ana Isabel Monteiro, e outro da área do desporto, Pedro Almeida, para nos explicarem as melhores formas de levar este processo a bom porto, para que se torne uma mudança sustentável e vitalícia na vida de quem se quer sentir melhor, tanto física como psicologicamente.

Algo comum ao discurso de ambos é que todo o processo deve ser encarado com paciência e disciplina, pois os resultados podem tardar a chegar, mas os benefícios na saúde ficam para a vida, bem como os ensinamentos proporcionados por entrar num estilo de vida com escolhas mais saudáveis.

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Erros mais comuns durante um processo de perda de peso

Para entendermos os passos corretos a tomar, temos também de ter em consideração aqueles que dificultam o processo, seja a curto, médio ou longo prazo. Assim, no que diz respeito aos erros mais frequentemente efetuados durante um processo de perda de peso, a nutricionista Ana Isabel Monteiro realça três pontos:

Ana Isabel Monteiro, Nutricionista
Ana Isabel Monteiro é licenciada em Ciências da Nutrição pela FCNAUP desde 2014, e membro efetivo da Ordem dos Nutricionistas desde 2016. Lançou o livro “Vegetariano nas quatro estações” em março de 2022, e atualmente trabalha na área da nutrição comunitária e educação alimentar na Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão mantendo, paralelamente, a página Laranja-lima. Atende também clientes online, sendo que o seu nicho é o vegetarianismo e a perda de peso. créditos: divulgação

1. Querer tudo ou nada (foco na perfeição, que não existe)

"Imaginemos que há um plano alimentar prescrito. Querer cumprir tudo a 100% pode ser prejudicial, no sentido em que o facto de não haver aquela flexibilidade e equilíbrio pode levar ao efeito negativo, e quando há a oportunidade de comer algo que não está prescrito, haver algum exagero. É importante haver um equilíbrio e espaço para alimentos que não são tão nutritivos, mas que fazem bem à alma", realça a especialista.

2. Haver um corte radical de grupos alimentares

Neste ponto, Ana Isabel Monteiro refere em particular os hidratos de carbono, que em certas situações são o primeiro alvo a abater para conseguir eficácia em perder peso. "Pode ser um erro a menos que estejamos a falar de uma situação muito pontual, como o caso de uma pessoa que já passou por muitos planos e tem muita dificuldade. Cortar os hidratos uma ou duas semanas pode dar um boost ao plano, para a pessoa se sentir motivada, no entanto, não é uma estratégia que eu adore, porque realmente eles são a nossa maior fonte de energia".

A nutricionista sublinha que é necessário fazer escolhas mais acertadas, que vão de encontro aos objetivos pretendidos. "Preferir os hidratos menos refinados, como a massa ou o arroz integral", mas não exclui a importância deste grupo alimentar na rotina. "Os hidratos de carbono são fundamentais do ponto de vista energético, e também por serem uma ótima fonte de fibra, e das vitaminas do complexo B".

3. "Numa primeira fase, é importante aprender as quantidades"

Com isto, Ana Isabel Monteiro não defende a contagem de calorias. "O nutricionista é que tem de se preocupar com os cálculos, a pessoa tem de se preocupar com os alimentos, portanto no máximo, defendo pesar alimentos, mas acho que é mais útil, por exemplo, dar medidas caseiras, como colheres ou chávenas, porque a pessoa já vai estar num processo que pode ser algo stressante".

Ainda no campo das falhas frequentemente realizadas por pessoas que entram numa jornada de perda de peso, Pedro Almeida, personal trainer licenciado em Ciências do Desporto, mestre em Gestão e criador da marca TreinoEmCasa , deixa também a sua opinião quanto aos erros que envolvem a atividade física durante o processo.

Pedro Almeida, Personal Trainer
.Pedro Almeida é licenciado em Ciências do Desporto, e Mestre em Gestão. Criou a marca TreinoEmCasa ®, onde faz a gestão dos conteúdos online de treinos diários adequados para praticantes iniciantes, intermédios ou avançados, que façam ginásio, que pratiquem uma atividade de alto rendimento ou que queiram só complementar o seu processo de treino. Atualmente, é Life Coach, Personal Trainer, Autor e Developer. créditos: divulgação

1. Não ter rotina

Pedro Almeida refere que, do ponto de vista da perda de peso, "as pessoas normalmente pensam em começar a treinar, e fazem-no com algum exagero inicial, por toda a motivação e vontade que têm, mas depois não têm a rotina suficiente", que consiste em estabelecer horários e dias de treino semanal, e cumprir isso "durante muito tempo".

2. Exagero leva a desistências

"Cair nos exageros por vezes leva a pessoa a desistir", afirma o especialista em exercício físico, que diz que não vale de nada querer cumprir o treino exageradamente durante um curto espaço de tempo (por exemplo, duas semanas seguidas), sendo que depois a pessoa queira desistir por não ver resultados imediatos, apesar de todo o esforço aplicado, o que nos leva ainda ao ponto seguinte.

3. Desistir a meio do processo por não ver resultados

"Tirar o pé do acelerador demasiado cedo pode ser um erro, porque se nunca chegar ao fim do processo nunca vou saber se ele tem sucesso ou não, uma vez que desisti a meio", explica Pedro Almeida.

"O objetivo principal deve ser sempre focado na saúde" 

No que diz respeito à questão nutritiva de um processo de perda de peso, Ana Isabel Monteiro esclarece vários aspetos. Um dos pontos que salienta diz respeito às compulsões alimentares. De acordo com a especialista, "muitas vezes generaliza-se o que é uma compulsão alimentar", e revela os critérios descritivos para o que se pode considerar uma compulsão.

  • comer até se sentir desconfortavelmente cheio;
  • comer uma grande quantidade de comida sem se sentir fisicamente com fome;
  • comer mais rápido do que o normal;
  • comer sozinho por vergonha;
  • haver um sentimento de nojo, culpa ou de pressão associado a um episódio de compulsão."

A nutricionista consolida ainda que estes aspetos "têm de decorrer pelo menos uma vez por semana, por um mínimo de três meses", e "só se cumprir todos estes critérios é que podemos chamar de compulsão". "O que muitas vezes acontece é um exagero na nossa ingestão que pode estar associado a stress, a um dia mais difícil, ou pelo contrário, algo muito alegre que nos leve a celebrar e a exagerar na alimentação, mas isso só por si não é uma compulsão", explica Ana Isabel Monteiro.

Porém, a nutricionista não nega que a restrição alimentar pode, de facto, conduzir a episódios de maior exagero. "Quando não há liberdade para sair de um plano, se a pessoa sair, podem existir momentos de maior exagero". A nutricionista sublinha que vem daqui a relevância de ter alguém a monitorizar o processo, "de ter alguém a acompanhar, de ajudar a aprender a comer".

No que diz respeito ao fator idade, a especialista afirma que o processo de perda de peso pode ser mais dificultado, mas que tudo isso depende de alguns fatores. "Não podemos culpar apenas o metabolismo mais lento. Tem mais a ver com todas as outras vertentes, se calhar com a idade já não nos mexemos tanto, temos um estilo de vida mais sedentário".

Para além disso, salienta que perdas e reganhos constantes de peso são um inimigo ao alcance de objetivos duradouros. "Há um processo de perda de peso, a pessoa desiste ou chega ao peso que queria, passa a fazer tudo como antigamente e volta a ganhar o que perdeu, esta perda e reganho constantes, vão dificultando cada vez mais o processo".

A importância do défice calórico e da qualidade do sono

Um ponto essencial que tem de estar presente na rotina de quem deseja perder peso é o défice calórico, que consiste em "gastar mais energia do que aquela que consumimos". "Isto pode ser feito de duas formas: podemos, ou aumentar o exercício, ou então realmente comer menos. Se for um processo mais gradual, ou seja, ao longo de semanas, meses e até anos, é muito mais possível que seja um processo para ficar, ou seja, que o peso perdido se mantenha perdido", explica Ana Isabel Monteiro.

Para além disso, "se for um processo gradual vamos conseguir manter mais a massa muscular, a massa magra, ao passo que se for um processo muito rápido, vamos perder gordura, água, e massa magra, e isso nós não queremos. Isto é um fator que eu falo com os meus clientes, estamos aqui para a long run e não para o objetivo rápido".

A nutricionista esclarece que existe uma necessidade de ajustar as mentalidades a objetivos reais. "Normalmente os clientes querem coisas fáceis, rápidas, só que depois não se torna sustentável".

A especialista realça ainda a importância do ambiente em que a pessoa num processo de perda de peso se encontra. "Se a pessoa estiver inserida num ambiente obesogénico, ou seja, em que existe muita oferta de alimentos com alta palatabilidade (alimentos compostos por maiores percentagens de ingredientes como açúcar, gordura, sal e farinha), (...) ou que receba comentários desagradáveis por parte de familiares ou conhecidos, isto é algo que não favorece, portanto todo o ambiente deve estar favorável para se conseguir uma perda de peso de sucesso".

Quanto à mentalidade, e ao pensamento que deve ser o guia durante esta jornada, Ana Isabel Monteiro defende que o principal objetivo deve ser sempre a saúde. "A pessoa tem de se focar sobretudo na sua saúde, e não propriamente no peso na balança, que às vezes, nem sequer diz nada, é apenas um número, não nos diz a nossa composição corporal nem como está a nossa saúde, portanto, o objetivo principal deve ser sempre focado na saúde, e se por consequência a pessoa perder peso e se sentir melhor com isso, ótimo, mas o aspeto físico, a estética, não deve ser o nosso principal combustível", explica.

Relativamente a outros fatores que possam influenciar o processo, a nutricionista destaca a qualidade do sono. "A literatura diz-nos que dormir menos de cinco horas e meia é o limite. Quando a pessoa está mais cansada é muito mais provável haver maior apetite por hidratos de carbono, sobretudo os açucarados", o que por consequência destabiliza os progressos que já possam existir.

Para além disso, o stresse também pode ser prejudicial. "O aumento do cortisol (a hormona associada ao stress) pode levar a que haja mais vontade de comer e a procurar conforto". Esta é uma característica fisiológica, uma vez que as hormonas "levam a querer mais hidratos de carbono, então por vezes as pessoas estão a 'lutar' com o próprio corpo, em vez de aceitarem o processo", revela Ana Isabel Monteiro.

Por último, a especialista realça o papel fundamental da alimentação num processo de perda de peso, uma vez que em casos de incapacidade física por algum motivo, ou até mesmo só por falta de tempo, também é possível perder peso com sucesso, sem recorrer à atividade física. "Só com alimentação é possível, sim, agora não vamos é conseguir ganhar massa muscular". Por isso, nos casos em que é possível, aconselha uma harmonia entre nutrição e exercício físico. "Entre alimentação e exercício físico, se tivermos de escolher um dos dois, a alimentação é o que vai ter mais impacto, mas claro que juntar as duas coisas será sempre o ideal".

"Disciplina, rotina, um bom plano de treino e não falhar"

Quanto à vertente da prática de atividade física, e ainda relativamente ao último ponto mencionado pela nutricionista, Pedro Almeida, criador da plataforma TreinoEmCasa, salienta. "Num processo de perda de peso, apenas com a questão alimentar, a pessoa perde massa gorda e magra na mesma percentagem", afirma o personal trainer, informações que vão de encontro ao transmitido por Ana Isabel Monteiro.

"Treinando, é possível manter os níveis de massa magra ou até crescer esses níveis, continuando a perder a dita massa gorda. Em suma, com o treino é possível relacionar muito melhor a perda de massa gorda e a manutenção ou aumento de massa magra", explica Pedro Almeida.

Nos casos de pessoas em que o exercício físico nunca esteve muito presente nas suas vidas, o personal trainer destaca a importância de manter disciplina. "Acima de tudo, é necessário assumir o treino como uma prioridade, e a partir do momento em que isto acontece é fácil cumprir. Se não assumir como prioridade, acaba por ser fácil arranjar desculpas".

"A pessoa deve pensar: 'isto definitivamente é importante para mim, é com isto que eu vou conseguir ser mais saudável', e ter uma prática regular de atividade física, mas para isso tem de cumprir e não falhar, isso é o princípio número um. Depois, é importante ter um bom plano de treino, para conseguir ter resultados, e daí, motivação", garante o especialista. No fundo, o lema é: "Disciplina, rotina, um bom plano de treino e não falhar".

Quanto ao estigma que muitas vezes se cria de que apenas o treino em ginásio é eficaz para a perda de peso, Pedro Almeida, que trabalha desde 2010 com a sua plataforma, revela-se muito seguro, tendo já tido várias provas de que quando as pessoas experimentam treinar em casa, e são consistentes com a prática, acabam por ter resultados. "É uma ideia pré-concebida, até ao momento em que as pessoas experimentam. Apesar das muitas coisas más que trouxe, a covid-19 deu às pessoas a liberdade mental para experimentarem este tipo de coisas". O personal trainer confessa que antes da pandemia já tinha sucesso na sua área, mas que com o confinamento houve mais pessoas a abrirem-se à ideia do treino em casa.

"É possível ter resultados muito bons com o treino em casa, apenas temos de ter as ferramentas indicadas para o nosso objetivo", afirma. Contudo, compreende que não seja do agrado de toda a gente. "Confesso que não é para todas as pessoas, há quem precise do exterior, do contacto humano, e o importante é perceber o que funciona".

Pedro Almeida conclui, realçando a importância de manter metas a atingir durante todo o processo, de forma a que as pessoas não tenham a tendência para desistir se não virem resultados logo à partida. "O que tem de ser claro são os nossos objetivos. Para além do objetivo geral da perda de peso é necessário ter objetivos específicos e mensuráveis, e o bem-estar que se ganha com a prática de exercício é mais do que físico, é também mental".

O especialista em exercício físico sublinha que o processo de perda de peso deve ser longo, "para a vida", e que são necessárias "adaptações longas, ou a médio prazo, de forma a obter sucesso permanente".