Violência Obstétrica. O assunto não é recente, mas tem sido alvo de grande debate nos últimos dias após ter sido publicado um parecer da Ordem dos Médicos (OM) que refere que "o termo violência obstétrica é inapropriado em países onde se prestam cuidados de saúde materno-infantil de excelência, como é o caso de Portugal".
Na nota, publicada a 20 de outubro no site da ordem, é ainda possível ler que "o termo não se adequa à realidade que se vive nestes países; lança alarme, medo e desconfiança sobre as grávidas e as suas famílias e põe em causa os profissionais de saúde que se esforçam por lhes prestar os melhores cuidados possíveis, segundo a melhor e mais atual evidência científica."
Após o parecer da Ordem dos Médicos sobre o "reforço da proteção das mulheres na gravidez e parto através da criminalização da violência obstétrica", vieram a público vários relatos de mulheres que afirmam ter sido vítimas e foi criado um movimento com o objetivo de lhes dar voz.
"A violência obstétrica existe! Tem que ser visível e assumida, para que possa ser combatida", defende o movimento "VO Portugal". Com o objetivo de dar voz às mulheres que passam por isto, foi criada uma página no Instagram onde têm sido partilhados vários testemunhos com a hashtag #EuViVO. O objetivo das organizadoras do movimento é fazer chegar à Ordem dos Médicos todos estes relatos. Para isso, está agendada uma manifestação para este sábado, 6 de novembro, às 15h, que juntará várias pessoas em frente às secções regionais da OM de Lisboa, Porto, Coimbra, Funchal e Caldas da Rainha.
Na página de Instagram do movimento #EuViVO, é possível ler dezenas de relatos de mulheres que passaram por violência obstétrica. "A enfermeira dizia-me para fazer força e deixar de ser preguiçosa (...) Um médico veio ter comigo e disse que me ia ajudar, colocou os cotovelos na zona superior do abdómen e fez uma força incrível, até que eu com dores gritei em desespero para ele me largar, à qual ele muito chateado disse que eu estava a matar o meu filho e que ele me ia deixar ali sozinha", contou uma mãe numa publicação.
"Até chegar aos dez dedos, foram 19h com mais de dez mãos a entrarem cá dentro, sem autorização. Mãos de internos, mãos de obstetras, mãos de enfermeiras (...) Avisou, colocou os forceps, dores horríveis, Pediu-me para fazer força. Há dois anos que tenho incontinência fecal. Fiquei com um prolapso retal e um trauma para a vida", conta outra mulher.
Com o movimento, estas mulheres querem alertar para o facto de a violência obstétrica "estar presente todos os dias, dentro das quatro paredes das instituições de saúde", lê-se na página.
A Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto (APDMGP) define violência obstétrica como aquela que acontece no contexto de assistência à gravidez, parto e pós-parto, sendo que as formas mais correntes deste tipo de violência "incluem abusos físicos ou verbais, práticas invasivas, uso desnecessário de medicação, intervenções médicas não consentidas, humilhação, desumanização e recusa de assistência ou negligência pelas necessidades da mulher".
Dados da mesma associação revelam que cerca de 43,5% das mulheres portuguesas não têm o parto que queriam, independentemente de terem um planos de parto, de demonstrarem a sua vontade ou de gritarem de dor.