Em vésperas do Dia Mundial pela Eliminação da Violência contra Mulheres, — que se assinala este domingo, 25 de novembro — a Amnistia Internacional decidiu analisar a forma como a legislação de 31 países olha para a o crime de violação e as conclusões não são reveladoras de um trabalho eficaz. Segundo a organização não governamental, a maioria dos países europeus ainda não reconhece na lei que sexo sem consentimento é violação e continua a haver uma "perigosa cultura de culpabilização da vítima" que tem vindo a ajudar a uma impunidade ligada a este crime na Europa.

Dos 31 países analisados, apenas oito têm como definição de violação a parte ligada ao consentimento, enquanto a grande maioria— na qual se inclui Portugal — só reconhece o crime quando há violência física, ameaça ou coerção.

O relatório da Amnistia dedica alguns parágrafos a Portugal, lembrando que, tal como em Espanha, o governo anunciou recentemente a sua intenção de alterar a legislação de modo a que o sexo sem consentimento seja reconhecido como violação, isto depois da contestação face à forma como os tribunais deliberaram em casos recentes. A organização lembra o episódio no qual o Tribunal da Relação do Porto considerou violação de mulher inconsciente "sedução mútua".

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“Destas decisões emergem evidentes estereótipos de género, a culpabilização da vítima de violação, a depreciação dos danos e da humanidade da vítima", escreveu, na altura, a Amnistia Internacional.

“As leis têm o poder de influenciar atitudes. São muitas as investigações que mostram que muitas pessoas ainda acreditam que não é violação quando a vítima está bêbada, ou veste roupas reveladoras ou não resistiu fisicamente. Sexo sem consentimento é violação, ponto final. Até que os governos alinhem a forma de legislar sobre esse tema, os responsáveis ​​pela violação continuarão a safar-se desses crimes ”, refere Anna Błuś, investigadora da Amnistia Internacional sobre direitos das mulheres na Europa.

Lei retrógrada

Segundo o mais recente inquérito da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA), uma em cada vinte mulheres com mais de 15 anos na União Europeia foi violada. São nove milhões de mulheres.

Apesar das estatísticas, dos 31 países europeus abrangidos pelo relatório da Amnistia, apenas a Irlanda, o Reino Unido, a Bélgica, o Chipre, a Alemanha, a Islândia, o Luxemburgo e a Suécia definem a violação como sexo sem consentimento.
Os outros países mencionados na pesquisa da Amnistia são: Áustria, Bulgária, Croácia, República Checa, Dinamarca, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Itália, Letónia, Lituânia, Malta, Holanda, Noruega, Polónia, Portugal, Roménia, Eslováquia, Eslovénia, Espanha e Suíça e todos eles têm definições legais de violação com base na força, ameaça ou coerção ou na incapacidade da vítima de se defender, colocando o sexo sem consentimento numa outra categoria.

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Na Croácia, por exemplo, uma relação sexual sem consentimento tem uma pena máxima de cinco anos, ao contrário de dez anos por violação, lembra a Amnistia. Em Malta, outro exemplo, as ofensas sexuais enquadram-se no capítulo de “crimes que afetam a boa ordem das famílias”, associando estes atos a crimes de honra ou de moral.

Sinais de mudança

Anna Błuś aproveita para reforçar o papel fundamental das mulheres que, ultimamente, têm vindo a público mostrar a sua indignação.

Lembra os protestos em Espanha, que aconteceram em abril, depois de cinco homens, acusados de violação coletiva de uma mulher, terem sido acusados de um crime menor devido a pormenores da lei que a tornam antiquada.

Nos últimos dias, na Irlanda, milhares de mulheres publicaram fotografias da roupa interior com a hashtag #ThisIsNotConsent, em solidariedade com uma rapariga de 17 anos cuja tanga foi apresentada ao juiz como prova em tribunal, de forma a minar a sua reivindicação.

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Para domingo, está marcado um protesto na Dinamarca para exigir uma mudança na lei, que garanta que sexo sem consentimento é violação.

Em Portugal, milhares de mulheres em todo o país protestaram em setembro contra o acórdão sobre caso de violação do Tribunal do Porto, exigindo uma mudança da lei, mudança essa que acontecerá em breve. O governo quer alterar o Código Penal no que diz respeito ao crime de violação, indo ao encontro do que diz a  Convenção de Istambul, — o tratado do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica — ratificado por Portugal em Fevereiro de 2013. Os países signatários comprometem-se a adotar as medidas necessárias para assegurar a criminalização de atos sexuais sem o consentimento da vítima.

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