O período de confinamento foi dominado por sentimentos de medo, ansiedade e incerteza, e mesmo quando tivemos liberdade para voltar às esplanadas, ou à praia, o vírus continuava a pairar na cabeça — talvez bem mais do que no ar — e a agudizar receios. No entanto, ansiosos, lá fomos nós enfrentando os medos com toda a cautela, mas nem todos reagimos da mesma forma. As fobias, que são mais do que um grito perante uma aranha minúscula, estão a ganhar força nos dias que correm e não dizem respeito a um simples medo.
"O medo é um sentimento funcional, uma emoção básica. Precisamos de ter medo para saber fugir dos perigos e saber proteger-nos, é perfeitamente normal. Quando o medo é exacerbado e está impregnado de um perigo que não existe, pode ser espoletada uma fobia", explica à MAGG a hipnoterapeuta Rosa Basto, que conhece as ferramentas necessárias para que "Comece a Viver Agora", tal como o nome do seu mais recente livro (PVP 15,50€), e não se deixe assolar pela pandemia de COVID-19, sem que sintomas mais graves próprios do vírus o façam.
Apesar de serem coisas diferentes, a ansiedade, o medo e a fobia estão em tudo ligados, uma vez que é a ansiedade que faz espoletar várias perturbações, nomeadamente as fobias, que já não são coisa nova. "Muitas das vezes estamos a passar por uma fase mais traumatizante, preocupante, ou até de maior stress, e deslocamos essa emoção para um objeto ou situação, para um animal, um elevador ou outro qualquer objeto que passa a ser um estímulo fóbico", refere a especialista.
A ansiedade é normal e funcional, mas passa a ser patológica e disfuncional quando o medo é de tal maneira intenso que faz com que haja medo de tudo e de todos, acrescenta a hipnoterapeuta, que já trabalhou casos de ansiedade de figuras conhecidas como a apresentadora Fátima Lopes, Claúdio Ramos, Nuno Eiró, e Liliana Campos.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) há cerca de 400 milhões de pessoas com algum tipo de fobia e estas — que se dividem entre fobia específica (medo intenso e persistente de um objeto ou situação), fobia social (medo de situações em que possa ocorrer embaraço e humilhação), e agorafobia (evitar situações em que seria difícil obter ajuda) — podem ir desde a tão conhecida claustrofobia, medo de estar em espaços fechados, à amaxofobia que se traduz no medo de conduzir veículos.
Entre as mais comuns está então a claustrofobia, fobia de andar de elevador ou de avião, fobia a animais específicos, de andar nas autoestradas ou pontes, de palhaços, agulhas e hospitais, "e ultimamente têm aparecido muita gente com fobia a balões", conta Rosa Basto. Contudo, pode surgir um novo padrão.
Quais as fobias mais prováveis de aumentar no pós-confinamento?
Se por um lado é frequente (e até irritante) vermos pessoas com a máscara abaixo do nariz, tapando apenas a boca, por outro, ver alguém a esfregar as mãos hoje em dia é sinal de que acabaram de colocar álcool gel e não creme, como seria mais provável antigamente. Este movimento transmite-nos segurança, proteção, mas aquilo que não vemos é o que pode ir na cabeça daquela pessoa.
Neste período de desconfinamento, a perturbação obsessivo-compulsiva, que pertence aos quadros de ansiedade, pode aumentar o número de casos, ou ganhar outras proporções em quem já sofria dessa condição, principalmente quando relacionada com limpeza.
"Agora com o desconfinamento isso pode agudizar e as pessoas que não tinham podem adquirir, e para além da perturbação obsessivo-compulsiva da limpeza, podem também ter como comorbidade [patologia independente e adicional a uma outra existente] a agorafobia", indica a especialista.
A agorafobia é, no fundo, o medo de ter medo e no contexto de desconfinamento representa uma perturbação mais grave relativa ao medo de enfrentar novamente o espaço lá fora, incluindo espaços grandes, abertos, e com muita gente. "A hipocondria também é uma perturbação que tem tendência a aumentar porque, efetivamente, as pessoas têm medo de ganhar doenças e ficam ansiosas por considerarem que podem estar contaminadas e doentes", nota a hipnoterapeuta Rosa Basto.
Contudo, a "tendência" não fica por aqui. "Existe um medo que é muito confundido com a agorafobia, que é a síndrome da cabana, que se manifesta em pessoas que ficam isoladas, confinadas durante algum tempo", revela a especialista. Destaca, no entanto, que esta síndrome não é considerada uma perturbação, mas sim um estado legitimo e compreendido, uma vez que quando a pessoa tem de enfrentar de novo a sociedade, tem algum constrangimento.
Prevenir o desenvolvimento de uma fobia não é tarefa fácil, mas é possível através de exercícios mentais para que a pessoa se possa sentir bem e em equilíbrio. No livro, Rosa Basto revela vários exercícios para identificar sintomas, a origem da ansiedade e a libertá-la, e às vezes podem ser coisas tão simples do dia a dia como ter um hobbie.
"Fazer meditação e ioga também são estratégias com um impacto muito positivo, e ter um terapeuta que acompanha a gestão emocional na prevenção, tudo isto são estratégias muito inteligentes na prevenção. Quando a pessoa já está num quadro de ansiedade bastante avançado, nesse caso precisa realmente da ajuda de um profissional competente para o efeito", destaca a especialista.
Uma vez que as fobias só acontecem perante quadros agravados de ansiedade, procurar estar em equilíbrio emocional e físico é meio caminho andado para a prevenção de problemas do foro emocional e psicológico, como as fobias. O livro de Rosa Basto chama-se "Comece a Viver Agora" precisamente porque se a pessoa "viver um dia de cada vez, um momento de cada vez e a viver o presente, as fobias não aparecem", diz.
A informação é outra das chaves para evitar que se desenvolvam perturbações nos tempos que correm. Sabemos o que fazer para sair à rua protegidos — usar máscara, não tocar na cara, manter o distanciamento social e a higiene das mãos —, por isso, ao estarmos conscientes das regras e da forma como agimos, tudo estará mais controlado.
Sintomas
Entre os sintomas mais frequentes de uma fobia, medo exagerado em relação a um objeto ou situação, estão palpitações, suores, taquicardia, medo de morrer e muitas vezes também ataques de pânico. Contudo, cada caso é um caso e não deve ver estes sintomas como uma lista que encontrou no motor de busca e eis que tem o diagnóstico, mas sim como um alerta. Consultar um especialista é fundamental, até porque só assim vai perceber a causa.
"A origem de uma fobia é um deslocamento emocional. Algures no tempo a pessoa passou por alguma situação que lhe causou muito medo ou, até quem sabe, trauma. O que pode acontecer no contexto de pandemia é que esse deslocamento, que foi feito outrora no tempo, volte ao de cima", explica a hipnoterapeuta.
O tempo é relativo, porque parece que foi ontem que nos disseram que tínhamos de ficar em casa, mas pode ter sido nesse período que as fobias do pós-confinamento tiveram a sua causa. Entre elas está o facto de acompanhar as notícias de forma intensiva, ter medo do futuro, e ainda receio de ficar sem meios para subsistência.
Ferramentas para lidar com uma fobia
A certa altura, num podcast, ouvimos que para enfrentar um medo ou um ataque de pânico, cantar a música dos parabéns — sim, parece estranho — com o objetivo de ironizar o medo e ajudar a controlar esse estado de ansiedade exacerbado. No entanto, Rosa Basto não considera que seja a melhor ferramenta.
"Acho sempre que fugir do medo aumenta-o, pois quando fugimos de algo fica subentendido que estamos a fazê-lo por se tratar de algo perigoso. Então, brincar com o próprio medo e enfrentá-lo é sempre a forma de o minimizar, pois só brincamos quando estamos confortáveis, não é? E o nosso cérebro responde 'positivamente' a isso", argumenta, por acreditar que é mais importante estarmos em equilíbrio emocional, confiantes e seguros de nós.
Defende por isso que o melhor exercício e o mais simples é aprender a fazer uma boa respiração, técnica fundamental para estar em equilíbrio e enfrentar qualquer desafio.
Existe tratamento para as fobias?
Existe e é até o quadro de ansiedade mais simples de tratar, de acordo com a especialista. A fobia específica (medo de um objeto ou situação, como andar de elevador) é até a mais fácil, mas a agorafobia, um dos ramos das fobias que pode aumentar com o desconfinamento, não fica de fora e também pode ser tratada.
Uma das formas, defendida pela e no livro de Rosa Basto, é através do Protocolo Diamante. Este é um método desenvolvido pela hipnoterapeuta e consiste numa terapia complementar que aplica várias técnicas, tais como a hipnose clínica, programação neurolinguística, e na sua aplicação de modo personalizado em cada indivíduo. "Tem o propósito de ir à origem do problema, libertando toda a carga emocional lá contida. Fazendo isso, a pessoa fica mais liberta, mais solta e mais preparada para ter uma vida ajustada para aquilo que ela quer para si mesma", explica Rosa Basto.