Já sabemos que a COVID-19 não olha a fronteiras nem a idades — contrariando aquilo que se pensava no início. Além destes fatores, o histórico de patologias é também relevante para o risco de contaminação, como acontece com a diabetes, doença envolvida em mais de 9% das mortes com COVID-19 em Portugal, de acordo com a Associação Protetora dos Diabéticos Portugueses (APDP).

Todos os anos são descobertos entre 60 a 70 mil novos casos de diabetes, num total de 3 milhões de portugueses com diabetes ou pré-diabetes, o que representa 40% da população portuguesa.

E em tempos de pandemia, este é um diagnóstico suficiente para dar o cunho de doente de risco.

Procurámos saber junto de uma nutricionista, também ela diabética desde os 17 anos (no seu caso diabetes de tipo 1), de que forma este grupo de risco deve agir em circunstancias especiais. Vera Ruivo Dias

Contudo, lembra Vera Ruivo Dias, importa primeiro esclarecer o porquê de a diabetes ser um fator de risco. Esta é uma doença crónica caracterizada pela ausência, insuficiência ou pouca eficácia de produção de insulina, hormona que responsável por manter os níveis de açúcar no sangue em valores saudáveis. Isto significa que se um diabético acumular outra patologia, o organismo fica desequilibrado e altera as funções normais.

"Quando o nosso corpo sofre uma infeção, prioriza a necessidade de combate à infeção, estando sujeito a um stress significativo. Uma pessoa com diabetes e com uma infeção tem grande probabilidade de descompensar os níveis de açúcar no sangue, contribuindo também para um maior risco de sofrer complicações relacionadas, quer com a infeção, quer com a diabetes", explica Vera, autora do blogue "Deveras Nutritivo" e co-autora do livro "Diabetes, o que posso comer?"

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"A pessoa com diabetes deve comer menos quantidade de hidratos de carbono do que as que consome habitualmente"

Mesmo em tempo de pandemia, a alimentação de um diabético não muda as regras pelas quais se deve reger: ser saudável, equilibrada e adequada a cada caso. Contudo, há alguns ajustes que podem ser importantes, uma vez que a diabetes mantém-se, mas as condições à volta não.

Estamos menos ativos, mais tentados a abrir o frigorífico e também a cozinhar alimentos fora do que é habitual. No caso dos diabéticos, é importante fazer várias refeições ao dia, tal como já é recomendado, mas privilegiar certos tipos de alimentos de modo a promover o controlo dos níveis de açúcar no sangue.

"Relativamente aos alimentos ricos em hidratos de carbono, devem privilegiar os alimentos integrais com maior quantidade de fibra e menor quantidade de hidratos de carbono", diz a nutricionista,como é o caso do pão integral ou com sementes, o arroz integral, a massa integral e as leguminosas (favas, ervilhas, lentilhas, grão-de-bico).

No entanto, estes hidratos de carbono devem ser comidos de forma controlada: "Para promover a gestão da doença, neste período em que estamos fisicamente mais sedentários, a pessoa com diabetes deve comer menos quantidade de hidratos de carbono do que as que consome habitualmente". Costuma comer três batatas no prato principal? Então por agora deve reduzir para duas.

Outro fator importante é a água, particularmente se os níveis de açúcar estiverem mais elevados. Devem ser consumidos pelo menos 1,5 litros de água por dia, ou alternativas como infusões de ervas e águas aromatizadas — sempre sem açúcar.

A alimentação é então uma das formas de proteção da COVID-19 para um diabético. Mas será que se anteriormente os hábitos alimentares não eram os melhores, ainda vão a tempo de ser recuperados para fortalecer o sistema imunitário? A resposta é sim: "O consumo de alimentos de elevado valor nutricional, nomeadamente em vitaminas e sais minerais, como frutas, legumes, carne, pescado e leguminosas, permitirão que o sistema de defesa do organismo esteja forte para o combate a algum risco para a sua saúde".

Deve por isso esquecer tudo o que lhe disseram sobre "alimentos milagrosos" para combater o vírus, porque não são verdade, alerta a nutricionista Vera Ruivo Dias.

Qual a importância do exercício físico?

Um diabético pode já não poder fazer as habituais caminhadas, mas é importante que mesmo em casa se mantenha ativo. O problema é como. Eis a solução: "Algumas hipóteses são a prática de dança, a realização de exercícios de ginástica repetitivos, ioga, saltar à corda, levantamento de pesos, zumba, entre outras. Poderão improvisar os materiais e exercícios realizados ou, para aqueles com acesso à internet, existem disponíveis de vídeos e aulas orientadoras para as pessoas fazerem no período que estão em isolamento social", refere a nutricionista.

Se não consegue imaginar que materiais usar, damos alguns exemplos. O Urban Sports Club aconselhou seis objetivos que quase de certeza tem em casa e pode usar para fazer exercício. Talvez nunca lhe tenham passado pela cabeça porque, verdade seja dita, também nunca antes se viu numa situação de isolamento.

Anote: uma cadeira ou banco (estável para evitar lesões), na qual pode fazer exercícios mais intensos, simulando, por exemplo, os saltos para as boxes dos ginásios, ou exercícios mais aeróbicos em que sobe e desce alternando as pernas; usar um livro pesado, garrafas de água ou os pacotes de leite como disco de musculação; uma vassoura para alcançar uma postura correta nos agachamentos; e pegar numa toalha debaixo dos pés, colocar-se em prancha e fazer força com as pernas em direcção às mãos, empurrando os glúteos para cima e para baixo novamente.

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Medicação

Junta-se o exercício à alimentação e tem aqui um combinado perfeito para controlar a diabetes. Mas em alguns casos não chega e é por aí que entra a medicação. "Durante a quarentena pode ser preciso realizar o ajuste de medicação da diabetes pelo facto de as rotinas diárias estarem modificadas", esclarece Vera, que explica ainda como fazer.

"Para que a medicação seja corretamente ajustada a esta realidade as pessoas com diabetes devem contar os seus profissionais de saúde da área da diabetes ou contactar a Linha telefónica 300 003 800 e 302 051 685. Com estes números é possível esclarecer qualquer dúvida falando com médicos da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo, o Núcleo de Diabetes Mellitus da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna e a Sociedade Portuguesa de Diabetologia".

Além destes contactos, há ainda uma linha de apoio da Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP), disponível desde 1 de abril, que "destina-se a todas as pessoas com diabetes que procuram, principalmente, assistência em situações de descompensação da doença e esclarecimento sobre os procedimentos a adotar em caso de infeção pelo novo coronavírus", refere em comunicado José Manuel Boavida, presidente da APDP.

Uma das questões pode estar relacionada com valores elevados da diabetes, uma situação que pode resultar da alteração da rotina, como o aumento do sedentarismo e do stress diário, que influência os níveis de glicose no sangue.

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Mais de 600 pessoas já recorram à linha da APDP — 21 381 61 61, disponível entre as 8h e as 20 horas — e além de questões específicas da doença, são esclarecidos assuntos relacionados com o enquadramento legal, o dever de proteção dos grupos de risco e as informações veiculadas pela comunicação social e pelas autoridades de saúde, que têm surgido no contexto da COVID-19.

No caso de o vírus se confirmar, a informação é a chave para que a recuperação seja feita da melhor forma. Por isso, como complemento à linha de apoio, foi criado um manual pela APDP para as pessoas com diabetes e os seus cuidadores saberem como proceder.

Qual a medição oral ou insulina indicada nesta fase? Que cuidados ter com os resíduos? Estas são apenas algumas das questões respondidas no manual.