No princípio, era o blogue. A Pipoca Mais Doce (nascido em 2003) depressa passou a ser sinónimo de Ana Garcia Martins. Dezassete anos se passaram, e com elesas redes sociais, mais bloggers, vloggers, instagrammers, Tiktokers, e até palavras novas como "influencer", para servir de chapéu a todos os criadores de conteúdos digitais.
Em abril deste ano, Ana Garcia Martins fez o percurso inverso, do digital para a televisão linear, como comentadora no "BB2020". O que começou por ser mais uma experiência revelou-se um fenómeno, agregando paixões, amores, ódios, tanto do público como de ex-concorrentes, com quem protagonizou acesos frente a frente, seja nos "Extra", seja no "Você na TV!".
E tanto assim foi que a TVI propôs à influenciadora de 39 anos ser apresentadora do pós-gala do "Big Brother - A Revolução". A estreia acontece este domingo, 20 de setembro. Mas deixemos que seja a própria a explicar como tudo aconteceu.
Para já, achei muito simpático haver esse reconhecimento. Foi sinal de que o “BB2020” tinha corrido bem, que tinham gostado da minha prestação enquanto comentadora e que me queriam dar uma oportunidade diferente e com mais responsabilidade. Depois, foi pensar ‘ok, tenho muito mais responsabilidade, já não sou a mera comentadora que vai para lá dizer todas as parvoíces que lhe passam pela cabeça sem grande filtro’. Depois veio o medo, vieram os tremores. Eu não sou apresentadora, nunca estive nesse papel. Acho que isso tem necessariamente outro peso e outro tipo de preparação que eu acho que não tive.
Em termos logísticos, como é que vai funcionar?
Vai ser da meia-noite às 00h45. Vai acontecer no mesmo estúdio, na Venda do Pinheiro. Faz-se ali um cenário diferente. A ideia é receber o concorrente expulso nesse dia e estar ali à conversa com ele, confrontá-lo com algumas imagens de coisas que ele viveu, fazermos ligações à casa. Há a possibilidade de termos mais um ou outro convidado. Mas a ideia é que seja uma coisa muito leve.
À semelhança dos frente a frente que aconteceram no “Você na TV!” e nos “Extra”?
Se calhar, não tão agressivos. Sobretudo nestes primeiros que vão sair, ainda não há material suficiente.
Há agora também a questão da expectativa. No “BB2020”, os concorrentes ficavam mais surpreendidos com a sua presença. Agora, já estão cientes do seu impacto, já estão mais ‘fofinhos’, a depreender dos comentários que já foram feitos sobre si dentro da casa.
Mas eles não sabem que eu vou estar à espera deles. Eu sou a primeira pessoa que vai falar com eles. Acho que tentei, como comentadora, pôr-me no papel da maioria das pessoas que estão cá fora, que assistem ao programa, têm coisas para dizer e não podem. Manifestam-se nas redes sociais mas gostavam de ter uma voz mais ativa, com mais posição. Acho que acabei por abraçar esse papel. Acho que as pessoas esperam que isso continue e que eu seja a voz delas.
Mas também o outro programa foi muito vincado, definiram-se muito rapidamente os grupos, era quase um confronto entre os bons e os maus. Neste, para já, ainda não temos isso, ainda é muito cedo. Claro que há pessoas mais gostadas e outras não tanto, já se estão a formar as primeiras simpatias e os primeiros odiozinhos de estimação, mas a verdade é que isto muda tudo muito. Lembro-me que, na primeira edição, os que eu gostava mais acabaram por se revelar aqueles com quem eu não me identificava nada e aqueles que eu achava que não duravam uma semana no programa, foram todos finalistas. Lembro-me de ver o Daniel Guerreiro, a Noélia, a Ana Catharina e pensar ‘esqueçam, não aguentam duas semanas, não é nada o perfil que estamos habituados a ver’.
Mas se calhar foi por isso que eles aguentaram tanto tempo. As pessoas estão muito cansadas de ver o típico concorrente de reality show, com características muito parecidas e acho que houve muita identificação precisamente por isso. Eram pessoas muito normais, com quem todos nos cruzamos no dia a dia. Alguns daqueles personagens podiam ser nossos amigos na vida real. Acho que, quem está a assistir, está com muita expectativa e acho que está a tentar fazer muito esse paralelismo. Quem é o Diogo desta edição? Quem é a Noélia? Quem é a Soraia? Se calhar, não vai acontecer porque eles são todos diferentes mas não tenho qualquer dúvida que nos acabaremos por identificar mais com uns do que com outros.
"Tentei, como comentadora, pôr-me no papel da maioria das pessoas que estão cá fora, que assistem ao programa, têm coisas para dizer e não podem"
Estava à espera que, no “BB2020”, a sua presença fosse impactante como foi, nas redes sociais, sobretudo junto dos mais jovens?
Não, não! Já tinha havido alguns convites antes e eu nunca quis fazer nada porque eu adoro comentar, mas em casa, no conforto do sofá, no meu registo e exatamente como eu quero. Aceitei porque era uma edição emblemática, os 20 anos do “BB”. Era numa fase em que a TVI estava um bocadinho na mó de baixo e achei que era interessante ter esse desafio. Houve mudança de apresentador, prometiam-nos um casting muito diferente, tanto a nível de faixa etária mais alargada, como pessoas com outros interesses e vidas muito diferentes. Houve ali uma reunião de factores que fez com que eu achasse que era interessante abraçar o projeto.
Lembro que, das primeiras vezes em que fui comentar ao “Extra”, estava sempre um bocadinho retraída. Porque vivo nas redes sociais, porque sei que somos crucificados por tudo o que dissermos. Sentia que estava sempre um bocadinho a medo, nunca dizia exatamente o que pensava. Depois fui percebendo, à medida que me ia soltando mais e que o feedback era positivo, que só fazia sentido ser assim. Se eu estava ali era para dizer exatamente o que pensava, no tom em que me apetecia e acho que foi isso que acabou por gerar tanta empatia. Do lado da TVI / Endemol, nunca houve qualquer entrave à minha prestação. Às vezes, fazia críticas ao próprio programa e mesmo à produção, porque havia coisas com as quais eu não concordava e achava que não podia deixar em branco. Essa transparência e essa forma de dizer as coisas, que muita gente via como agressiva mas que acho que é mais sarcástica. Independentemente de simpatizar mais com alguns concorrentes, não os detestava, de todo. Só assinalava as coisas que eles faziam na casa que eu achava menos corretas, da mesma forma que enfatizava quando eram bons e quando faziam coisas que eu achava que mereciam uma nota positiva. Mas, de facto, acho que foi isso que acabou por ter tanta adesão e que fez com que tantas pessoas simpatizassem com a minha prestação como comentadora.
"Nunca tive qualquer espécie de ambição televisiva"
E o look para este domingo?
Ainda não pensei nisso. Geralmente levo dois vestidos e depois decido.
Tem superstições sobre cores, como Teresa Guilherme?
Não, zero. Ainda não tenho tempo de televisão suficiente para ter sequer superstições. É o que me apetece vestir.
Depois do “Big Brother - A Revolução”, gostaria de ter um formato seu na antena da TVI?
Nunca tive qualquer espécie de ambição televisiva. Tirei jornalismo porque queria fazer rádio. Depois acabei por ir para imprensa porque foi a oportunidade que surgiu na altura. Ao contrário de muitos colegas que estavam no curso de jornalismo porque queriam muito ir para televisão, foi um meio que nunca me fascinou, não só por achar que não era muito telegénica mas também por achar que é preciso um filtro que nem sempre tenho.
Na escrita, consegue-se controlar mais o que se vai dizer, na televisão, menos. E em direto, pior ainda. Nunca tive, de facto, esse sonho de trabalhar em televisão. Achei graça a esta experiência do "Big Brother", mas porque estava num papel que me era muito confortável. Era basicamente fazer em televisão o que eu já fazia em casa, e sempre fiz ao longo de anos e anos nas redes sociais. Claro que, em televisão, não posso dizer exatamente tudo como provavelmente diria se não tivesse uma ligação ao programa. Mas não penso no que é que se segue. Se surgirem oportunidades, se eu achar que são interessantes, obviamente que irei considerar. O meu percurso tem sido muito assim. Acho que não sou uma pessoa muito ambiciosa. As coisas vão surgindo, eu faço uma triagem daquilo que acho que faz mais sentido e que é interessante. Foi tudo assim. O blogue apareceu assim, a escrita de livros também, o stand up… as coisas aparecem um bocadinho por acaso, não é nada que eu vá atrás, e eu vou andando, vou entrando por diversas áreas. Mas não consigo dizer ‘tenho o sonho de fazer um programa’.
Quando acabar o “Big Brother” logo se vê. Mas se a minha carreira televisiva acabar pós-Big Brother, já fico felicíssima com aquilo que aconteceu. Foi ótimo para mim. O meu trabalho não passa tanto pela televisão, passa muito mais pelas redes sociais, pelo trabalho como influencer, e isso foi ótimo. Dupliquei o meu número de seguidores, tenho mais trabalho, consequência da exposição maior que tive e é aí que eu me sinto mais confortável. Nas redes sociais, a controlar aquilo que eu faço. O que vier em televisão… vamos ver.
Sobre os concorrentes do “Big Brother - A Revolução”: potencial desilusão e potencial surpresa?
A potencial desilusão acho que vai ser o André Filipe. Aquela VT de apresentação foi maravilhosa, eu chorei a rir. Achei que era uma personagem absolutamente deslumbrante e muito original. E, de repente, ao fim de dois dias, já está metido em intrigas e discussões. Já se percebeu que está ali com uma agenda. Aquela discussão ridícula com o Luís, a acusá-lo de homofobia…
E muito decalcado de coisas que já vimos no “BB2020”.
Sim. Eles já vêm todos com a lição estudada até porque aconteceu há muito pouco tempo. Vai haver muito efeito de mimetização e de quererem reproduzir as coisas que eles perceberam que resultaram cá fora. O “BB2020” foi sem dúvida, de todos os reality shows, aquele que trouxe temas mais interessantes e prementes para cima da mesa. Foi muito interessante porque a discussão alargou-se para fora da casa. Foi o primeiro reality show que trouxe temas como a homofobia, o veganismo, a sororidade, xenofobia, preconceito… Foi muito interessante e acho que a dinâmica também foi muito engraçada. Isto viveu-se de tal forma cá fora que acabou por ter impacto lá dentro. Havia muitas coisas que aconteciam lá dentro que as pessoa cá fora não estavam dispostas a deixar passar em branco. E manifestavam-se rapidamente. Algumas coisas que aconteceram, nomeadamente sanções, teve muito a ver com a forma como as pessoas se manifestaram cá fora. Eles já vão lá para dentro com essa cassete ‘tenho de levar uma causa porque lá fora é muito bem visto’.
Vai tudo pronto a hastear a sua bandeira, seja do que for. Mas uma coisa é isto ser inato outra é ser imposto e trabalhado para resultar cá fora. Acho que o André Filipe está a tentar jogar essa cartada e acho que foi por isso que o Luís levou a mal ter sido acusado de homofobia porque percebeu que aconteceu ao Hélder como é que isso foi visto cá fora. Não percebi bem a discussão mas acho que não houve nada de homofobia. Depois, a surpresa… há pessoas que eu gosto. Gosto muito da Diana, apesar de achar que ela tem ali um grau de loucura saudável. Acho que é uma miúda com a cabeça e o coração nos sítios certos. Acho que ela vai ser um elemento de equilíbrio e de normalidade ali.
Depois, já tenho a minha antipatizinha pela Andreia. Já me pareceu extremamente conflituosa, acho que vai disparar em todas as direções. Tem aquela coisa de mandona. Ela assumiu logo o papel de líder. Tudo o que é para decidir, ela decide logo e depois pergunta ‘o que é que acham?’. Acho que vai ser a Teresa desta edição. Há uns que eu acho muito parecidos uns com os outros, sobretudo os rapazes. Há outro que me irrita, o Rui [Figueiredo]... ele é esperto, é eloquente e verbaliza bem. Mas depois é todo muito ‘eu, eu, eu’. Parece-me ser extremamente egocêntrico.