São 34 as mulheres que se juntaram para processar a Pornhub, aquela que é maior empresa detentora de conteúdos pornográficos no mundo. Estas mulheres alegam que os vídeos em que surgem foram publicados na plataforma sem o seu consentimento. O caso, processado nos Estados Unidos, tem como objetivo responsabilizar a MindGeek, a empresa mãe que detém a Pornhub, por lucrar pela divulgação de vídeos pornográficos que tenham sido gravados ou publicados sem o consentimento expresso dos intervenientes. O advogado que representa as mais de 30 mulheres diz que o caso pode resultar "em centenas de milhões de dólares" caso vença em tribunal, segundo escreve a Sky News.

Leigh Nicol, uma das mulheres britânicas que vai processar a empresa, diz que o seu envolvimento no processo decorre da publicação, sem consentimento, de um vídeo que a própria gravou, com 18 anos, durante uma relação sexual. O acesso indevido ao vídeo terá acontecido após um ataque informático à usa conta iCloud, o serviço de armazenamento na nuvem da Apple.

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"Não consigo olhar-me ao espelho e sinto-me doente porque aquilo [referindo-se ao vídeo] já não é privado. Sinto vergonha, embaraço e nojo porque uma grande parte da população viu uma coisa que não deveria ter visto. Sinto que ninguém alguma vez aceitará ser meu marido porque estes vídeos estão já associados a mim", diz em declarações ao canal.

Ainda que, após vários contactos, a Pornhub tenha retirado o vídeo da sua plataforma, era comum a gravação em questão ser republicada noutras plataformas. "Isto não é legal. Não divulguei isto em lado nenhum e, de repente, estou a ser uma das pessoas mais vistas na maior plataforma de conteúdos para adultos", lamenta.

Das 34 mulheres que vão processar a empresa, 14 dizem que, na altura em que os vídeos foram gravados e, consequentemente, publicados na Pornhub, estas eram menores de idade. Outras 14 referem ter sido vítimas de pessoas previamente condenadas por crimes como abuso ou tráfico sexual, diz a Sky News.

Outra das mulheres envolvidas no processo garante que foi vítima de tráfico sexual por parte de uma organização americana que, enquanto a manteve em clausura, gravou os encontros sexuais a que estava obrigada. "Não tinha casa e estava muito vulnerável. Se não fizesse dinheiro o suficiente, ele [referindo-se à pessoa que obrigou esta mulher a prostituir-se] violar-me-ia e bater-me-ia", conta, sob anonimato. Os vídeos acabaram, também eles, publicados na plataforma.

"Não pedi para que estes vídeos fossem divulgados no site. Não queria que fosse publicados e não devia acontecer", diz.

O caso está agora entregue aos tribunais e a acusação vai ser liderada pelo advogado Michael Bowe, o mesmo que representou Donald Trump, na altura presidente dos EUA, durante a investigação sobre o envolvimento da Rússia nas eleições de 2016.

A peça do "The New York Times" que obrigou a Pornhub a reagir

Em declarações oficiais, a Pornhub diz ter "zero tolerância pela publicação de conteúdo ilegal" e que, por isso, "investiga quaisquer queixas ou alegações que sejam feitas sobre os conteúdos" que estão hospedados na sua plataforma. O caso, no entanto, não é novo.

Em dezembro de 2020, a plataforma apagou 75% dos seus vídeos após uma longa reportagem do "The New York Times" ter revelado que muitos desses vídeos decorriam de situações de violência e abusos sexuais, geralmente com menores, e em contexto não consensual.

Uma das testemunhas ouvidas para a redação do texto foi Serena K. Fleites que, com 14 anos, viu a sua vida mudar por completo quando o rapaz por quem se apaixonou lhe traiu a confiança uma e outra vez.

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Durante a relação, o rapaz pediu-lhe por diversas vezes que ela lhe enviasse um vídeo em que estivesse nua. Serena acedeu, até que o rapaz lhe pediu outro vídeo. E outro. E mais outro. Ao jornal americano, a mulher recorda que, na altura, se sentiu nervosa, mas, ao mesmo tempo, apreciada e lisonjeada. Até começar reparar em olhares estranhos vindos dos seus colegas da escola.

O rapaz por quem se tinha apaixonado tinha divulgado os vídeos com outros colegas, rapazes, e alguns deles acabaram por ser publicados no Pornhub. "De repente, as pessoas começaram a enviar-me mensagens a dizer que se não lhes enviasse um vídeo [semelhante àqueles que tinha enviado anteriormente enquanto esteve numa relação], eles enviariam aqueles que tinham à minha mãe", recorda.

O rapaz foi suspenso, mas Serena Fleites começou a faltar às aulas por não conseguir lidar com a vergonha. Afinal, os vídeos estavam inteiramente disponíveis no Pornhub — o que permitiu que, mesmo depois de a rapariga ter mudado de escola, os vídeos continuassem a circular e a chegar a novos colegas.

Na altura, a Pornhub reagiu à publicação da peça do "The New York Times" decidindo, pela primeira vez na história da plataforma, proibir a publicação de vídeos de utilizadores não confirmados nem identificados.

Além disso, a empresa anunciou ainda que a opção de descarregar um vídeo diretamente do site seria desativada, o que anteriormente terá permitido que os vídeos, mesmo que removidos uma vez, pudessem continuar a circular na internet e até noutras plataformas detidas pelo mesmo grupo.