Este domingo, 11 de abril, um estudo desenvolvido por investigadores portugueses e divulgado pela agência Lusa concluía que o jejum intermitente, com hidratação adequada, é eficaz para perder massa gorda e aumentar rendimento físico. À partida, estas duas premissas dão-nos a todos vontade de começar a fazer este regime milagroso que promete resultados que grande parte das pessoas quer atingir.
Apesar de ser uma prática milenar e utilizada em várias regiões (nomeadamente no continente asiático), na Europa começou a popularizar-se há menos tempo mas, nos últimos anos, tem vindo a ser cada vez mais falado e praticado.
Contudo, quando se fala em nutrição e em saúde, há que ter em conta que todos somos diferentes e não beneficiamos da mesma forma de um determinado método. A maioria de nós sabe quais são os pilares base para sermos saudáveis: dormir cerca de oito horas por dia, ter uma boa estratégia de alimentação, praticar exercício físico e mantermo-nos sempre hidratados.
Mas a verdade é que quando se fala em estratégia de alimentação surgem várias dúvidas e muitas delas estão associadas àquilo que é o jejum intermitente. Se tem benefícios? Tem, mas depende muito do corpo e das necessidades de quem adota este estilo de vida que não significa não comer, mas sim optar por fazer um espaçamento maior entre refeições.
Para esclarecer tudo sobre esta prática, a MAGG falou com duas nutricionistas. Lillian Barros e Iara Rodrigues começam por explicar que, ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, jejum intermitente não é uma dieta. "É uma forma de estar e uma forma de alimentação", começa por referir Iara Rodrigues. "O grande problema é chamar-se 'jejum intermitente' pois quando uma pessoa ouve este nome pensa imediatamente que vai passar um dia sem comer, ou que vai ser a dieta do 'não comer'. Nada disso, jejum intermitente é aumentar o período sem ingestão alimentar existente entre a última refeição do dia e a primeira do dia seguinte", continua Lillian Barros. Segundo a nutricionista, os benefícios são vários, mas apenas para quem se identifica com o conceito. "Nem todos se sentem confortáveis com este tipo de organização alimentar", refere.
Fazer jejum intermitente tem mais benefícios do que comer de três em três horas?
Ao longo de toda a vida ouvimos que devemos comer sempre de três em três horas e quanto mais refeições fizermos, melhor. Vamos reduzir o apetite e consequentemente comer menos nas refeições principais. Se este método está errado? Não está, uma vez mais depende de pessoa para pessoa. "Nada põe em causa o cumprimento de uma ou de outra, são apenas realidades diferentes", esclarece Iara Rodrigues à MAGG.
Devo começar a praticar jejum intermitente sem consultar um especialista?
A resposta é não. "O jejum intermitente deve ser sempre acompanhado", começa por afirmar Lillian, referindo que só assim se poderá perceber qual o método que melhor se adequa a cada pessoa. "O profissional de saúde vai ajudar a perceber se a pessoa é candidata, ou não, a este tipo de implementação alimentar, porque isto não é uma dieta: é um padrão", frisa Iara Rodrigues salientando que esta regra deve ser levada à risca principalmente por pessoas com outras patologias.
"Há pessoas com patologias, por exemplo diabéticos, às quais não recomendo, de todo, que comecem por um jejum intermitente. Primeiro temos de tentar equilibrar todo o padrão glicémico dessa pessoa. Além disso, existem remédios que se tem de tomar ao pequeno-almoço e em função das várias refeições. Se essas pessoas fizerem jejum, isso pode implicar terem de tomar a medicação sem nada no estômago — o que não é aconselhado."
Segundo Lillian Barros, importa ainda esclarecer que o jejum não vale só por si. "Não me interessa quantas horas eu passo sem comer, o que interessa é aquilo que como na minha janela de alimentação. Até posso passar 14, 16 ou 18 horas de jejum, mas o meu jejum só corre bem se eu tiver uma correta alimentação na ausência de jejum." Espaçar refeições sem acompanhamento pode ser, de acordo com a especialista, contraproducente e pode até fazer ganhar peso.
O jejum intermitente tem benefícios para todos?
Lillian explica que não. "Cada pessoa tem de arranjar a sua estratégia. Algumas encontram maior estabilidade a nível de consumo alimentar utilizando esta. Ao entrarmos em cetose [estado metabólico no qual uma parte do fornecimento de energia do corpo vem de corpos cetónicos no sangue] não temos picos de açúcar com entrada de hidratos de carbono." Segundo a nutricionista, é esta ausência de picos de insulina que reduz o apetite por doces.
"Por vezes, algumas pessoas conseguem estabilizar este apetite com o jejum intermitente. No entanto isto é contraproducente para pessoas, por exemplo, com compulsão alimentar ou qualquer outra doença do comportamento alimentar. Nós temos de avaliar muito bem antes de utilizarmos esta estratégia em consulta."
Também Iara Rodrigues, nutricionista de Cristina Ferreira, dá o exemplo da cara da TVI para explicar que esta estratégia é muitas vezes descoberta por "tentativa e erro" e não serve para todos. "Há muitas pessoas em que o jejum intermitente não faz nada de benéfico, bem pelo contrário. Pode fazer com que, às vezes, até se tornem mais compulsivas e vão perdendo massa muscular. Como para outras, como é o exemplo da Cristina, lhes faz muita diferença. É como tudo [na nutrição], não é uma coisa exata."
Além disso, há fases na vida em que jejum não é aconselhado, como, por exemplo, na gravidez. Iara Rodrigues alerta que tanto nesta fase como no período de amamentação existem necessidades muito específicas tanto para a mãe como para a saúde o bebé.
O que é que acontece ao meu corpo quando faço jejum intermitente?
Quando pensamos em fazer jejum o que nos vem logo à cabeça é a ideia de que o nosso corpo pode entrar em falência, mas, segundo Iara Rodrigues, o nosso corpo está até mais apto para este tipo de alimentação do que para aquela à qual fomos habituados. "Se nós pensarmos um bocadinho no que é a sobrevivência humana, sabemos que não tínhamos propriamente frigoríficos e despensas à disposição. Tínhamos alimento à medida do que caçávamos. O nosso corpo está adaptado a esta questão do jejum que se chama de intermitente porque não é um jejum de muitas horas."
Lillian explica também que, ao deixarmos de fornecer ao nosso organismo energia, proveniente da entrada de calorias (nomeadamente do hidrato de carbono com o pequeno-almoço), o nosso organismo arranja formas adaptativas de se "autofinanciar" a nível energético. "Ele tem de sobreviver e o que acontece é que há um processo de cetose, uma espécie de autofinanciamento." Ou seja, em vez de ir buscar energia aos alimentos, vai buscar as energias que temos como reserva, explica.
Apesar de existirem vários protocolos de jejum (que vão desde as 12h, até ao método em que se alterna 24h de jejum com 24h de janela de alimentação), Lillian afirma que nunca devemos levar o nosso corpo ao limite e por isso é que se torna essencial consultar sempre um especialista para termos a certeza de que não estamos a prejudicar a nossa saúde. "As pessoas têm de perceber se se sentem bem e qual é também o estado de energia quando fazem este jejum intermitente. A partir daí não há regras, há, acima de tudo, adaptações", remata.
Qual deve ser a primeira refeição do dia?
É provável que já tenhamos todos ouvido que o pequeno-almoço deve ser a refeição principal, já que é este que nos vai dar energia para o resto do dia. Mas a verdade é que, mais um vez, não somos todos iguais e há quem nem consiga comer a esta hora do dia. "Há pessoas que nunca na vida tomaram o pequeno-almoço e vivem bem assim. Não conseguem fazer, de todo, esta refeição porque ficam enjoadas, agoniadas ou vomitam. O importante é ouvirmos o nosso corpo e respeitarmos quando é que temos fome ou quando é que temos vontade de comer", explica Iara Rodrigues.
Ainda assim, fazer jejum intermitente também não significa que tenhamos de saltar esta refeição. Mais uma vez, tudo é adaptado à pessoa em causa.
Lillian Barros explica que, consoante o protocolo, a primeira refeição do dia poderá ser o pequeno-almoço — "tardio ou não, dependendo das horas a que deixaram de comer na noite anterior" — ou uma refeição principal como o almoço. Neste caso, o essencial é assegurar que comemos o indicado.
"O importante é terem a certeza de que começam com uma refeição equilibrada: nada de passarem 12, 14, 16 ou 18 horas em jejum e, de repente, entrarem numa sobrecarga glucídica (ou seja, de açúcar). Vão descontrolar o vosso equilíbrio e vão notar muito mais fome ao longo do dia. É comum, ao quebrar o jejum com refeições ricas em hidratos, sentirem muito mais fome logo a seguir a comer do que durante todo o processo de jejum em que estiveram. Basicamente começam a ter fome quando começam a comer. Porquê? Porque escolheram os alimentos errados", esclarece a nutricionista.
Qual a importância do que como nos períodos em que não estou em jejum?
A resposta é "muita". Iara Rodrigues salienta que fazer 16 horas de jejum significa que vamos ter oito horas de refeição, mas isso não quer dizer que nessas oito horas possamos comer de tudo.
"Temos de comer o adequado para nos mantermos saudável e com os padrões bioquímicos controlados. Não é por fazer 16 horas de jejum que vou emagrecer. Depende do que é o consumo e a distribuição dos alimentos naquele período em que a pessoa come. Se comer durante essas oito horas fast food, por mais que essa pessoa tenha feito jejum, o total enérgico e calórico desse espaço de refeições é muito superior ao gasto."
Posso praticar exercício físico em jejum?
"Talvez no início do desafio não seja aconselhado pois o organismo ainda não se reequilibrou em cetose. Depois de estabilizarmos, sim, é perfeitamente possível fazer exercício em jejum de forma rentável", explica Lillian.
Mais uma vez, depende de pessoa para pessoa, defende Iara Rodrigues. Da mesma forma que há quem não se sinta bem a treinar em jejum, há quem encontre benefícios nisso. "Quando a pessoa come antes do treino há um processo digestivo que faz com que todo o sangue vá para o estômago e não tanto para os músculos, fazendo com que, às vezes, até haja alguma indisposição ou até vontade de vomitar", explica a nutricionista.
Ainda assim, há sempre estratégias para adaptar o jejum ao horário de exercício. "Para não treinarem em jejum podem, por exemplo, optar por ajustar a hora do dia em que treinam e passar o exercício para o final do dia; ou fazerem jejum com antecipação do jantar sem ter de mexer no horário da manhã", aconselha Lillian.
É verdade que o jejum pode atrasar o envelhecimento?
Quando se fala em envelhecimento surge logo a ideia de que poderemos atrasar as rugas ou até mesmo a flacidez do corpo. Segundo Lillian, vários estudos comprovam que o facto de não estarmos sempre a alimentar o nosso corpo faz com que haja uma maior necessidade de renovação celular e, consequentemente, um "menor envelhecimento a nível de corpo interno".
Iara Rodrigues salienta que neste aspeto há que ter em conta que é preciso completar o jejum com uma hidratação adequada. Se tal não acontecer, poderá haver uma desidratação que provoca inevitavelmente rugas e até flacidez.
Que tipo de bebidas posso continuar a ingerir durante o jejum?
Neste aspeto, as nutricionistas fazem questão de frisar que principalmente a água deve ser uma bebida que ingerimos ao longo de todo o dia e não só durante o período de refeição. A hidratação torna-se assim fulcral para quem pratica jejum intermete, mas há vários tipos de líquidos que podemos consumir.
Chás, infusões, café ou até bebidas com gás são algumas sugestões. Segundo as especialistas, o que importa ter em consideração é não ingerir nada que tenha açúcar adicionado, incluindo os sumos de fruta (ricos em frutose).